Condomínios-vinhedos: o mercado imobiliário se aproxima da vinicultura
Ao morador, é oferecida a possibilidade de participar do processo de produção de vinhos
Quem aprecia vinho sabe: um bom rótulo está a um clique de distância na internet ou a poucos minutos no caminho do supermercado. Visitas a vinícolas, com degustação inclusa, podem ser agendadas pelo turista antes da viagem. No entanto, ter o próprio vinhedo para chamar de seu é algo muito novo e diferente. Na verdade, ainda se trata de uma conveniência inusitada e restrita, mas, para o regozijo de sommeliers profissionais e diletantes, novos empreendimentos prometem trazer o cultivo para perto de seus admiradores por meio de condomínios-vinhedos — com casas e resorts associados a plantações, onde se pode passar alguns dias, alugar por um período ou, se o interessado tiver condições, adquirir a propriedade, conquistando assim um pedaço do paraíso.
Um dos mais interessantes representantes desse movimento é o projeto Vivert, no distrito de Macaia, no sul de Minas Gerais. Ali está sendo criada uma das primeiras vinícolas do país dentro de um condomínio residencial. Em 4 hectares de terroir, serão inicialmente cultivadas as uvas sauvignon blanc, que dá excelentes brancos, e syrah, que o brasileiro aprendeu a apreciar graças aos produtores chilenos e argentinos. Ao longo do tempo, outras variedades serão acrescentadas. O empreendimento, supervisionado pelo especialista Murillo de Albuquerque Regina, conta com vinhas e fábrica, cuja bebida poderá ser consumida por moradores e visitantes. Além disso, quem possui casa no condomínio terá a opção de se tornar coproprietário da vinícola — os terrenos com 3 000 metros quadrados custam a partir de 700 000 reais, com direito a uma cota da vinícola.
Segundo os coordenadores do Vivert, a ideia é promover a convivência entre condôminos, formando assim uma comunidade enóloga. “Muitos brasileiros são associados a vinícolas de outros países, como a Argentina, mas eles se queixam de não se sentirem parte do negócio, já que participam apenas no papel”, diz Antônio Alberto Júnior, sócio do empreendimento, cujo objetivo é proporcionar ao indivíduo a oportunidade de fazer parte de todo o processo, da colheita da uva à elaboração do vinho.
Há no Brasil iniciativas similares. Um dos primeiros a adotar o conceito no país foi o Terroir Vinhedos Exclusivos, lançado em Garibaldi, no Rio Grande do Sul pela Lex Empreendimentos. Neste caso, porém, ele é focado em espumantes, mas a ideia é também oferecer ao condômino a possibilidade de ter seu próprio rótulo. Outro enocondomínio é o Spa do Vinho, localizado na cidade de Bento Gonçalves, também no Rio Grande do Sul. Com dezoito vinhedos próprios, ele oferece cotas que incluem a compra de uma unidade no hotel (apartamento ou suíte), permitindo ao investidor a possibilidade de adquirir também uma parcela do vinhedo.
A paixão pela bebida tem estimulado o surgimento de projetos inusitados, para além do vinho que pode ser chamado de seu. Em Santa Catarina, está sendo erguido o Pericó Residence, um edifício-condomínio no Balneário Camboriú, pródigo em lançamentos diferenciados. O Pericó será, figurativamente falando, uma videira de concreto armado, com adegas individuais para cada apartamento, loja especializada de 1 300 metros quadrados e espaços para degustação.
“Os brasileiros estão cada vez mais interessados em vinhos e já não aceitam qualquer produto”, diz Alberto Júnior, o empresário da Vivert. Claramente, o setor está em expansão. Em 2020, de acordo com dados da consultoria Nielsen, o consumo per capita no Brasil chegou a 2,78 litros, um avanço de 30% em relação ao ano anterior. Outros especialistas projetam que, no futuro próximo, será comum encontrar no Brasil casas de veraneio, hotéis e chalés para locação com mais de uma vinícola associada às residências. De fato, é possível que a produção artesanal seja, tanto para o consumidor assíduo quanto para aqueles que bebem eventualmente, uma forma de aproximar o ser humano urbano da natureza. Nesse caso, um vinhedo particular seria a opção mais romântica (e cara, embora possa vir a ser lucrativa) de se fazer isso. São as vinhas da tranquilidade, e não da ira.
Publicado em VEJA de 1 de setembro de 2021, edição nº 2753