A pandemia de Covid-19 acelerou algumas tendências de consumo mundo afora. Não foi diferente com a leitura. Com as livrarias fechadas em função das medidas restritivas para evitar o contágio pelo vírus, o canal digital de vendas explodiu, consagrando não só os sites de e-commerce mais conhecidos (como a Amazon), mas também outros modelos de negócios que ainda estavam num estágio incipiente. Nesse sentido, os audiolivros e os e-books ganharam espaço. “Ainda estamos consolidando os dados de performance desses segmentos em 2020, mas posso dizer que há um crescimento grande, sobretudo no mercado de e-books, que deve apresentar uma alta entre 50% e 100%”, diz Marcos da Veiga Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros, o Snel, e sócio da editora Sextante.
Segundo a última pesquisa feita em parceria entre a consultoria Nielsen, o Snel e a Câmara Brasileira do Livro, o faturamento de conteúdo digital no mercado editorial cresceu 115% entre 2016 e o fim de 2019, quando registrou receita de 103 milhões de reais.
Com o mercado de livrarias em parafuso por conta da pandemia, os meios digitais estão a caminho da popularização. A comodidade para leitura (basta um smartphone para acessar aos conteúdos) e a vastidão de títulos disponíveis é o principal argumento dos defensores da digitalização da leitura. Com receita de 20,1 milhões de reais em 2020, avanço de 42% frente ao ano anterior, e lucro bruto de 11,9 milhões de reais, a Ubook quer conquistar os clientes pelos ouvidos. Idealizada em 2014 pelos sócios Flávio Osso e Eduardo Albano, a empresa cresceu a passos largos nos últimos anos capitalizando recursos com fundos de investimentos e está em vias de realizar uma oferta pública inicial (IPO, na sigla em inglês) na bolsa de valores de São Paulo, a B3.
Com distribuição em 12 países por meio de acordos com operadoras de telefonia, a companhia atua como uma plataforma de streaming e conta com mais de 57 mil títulos de audiolivros, e-books, podcasts, documentários, entre outros. Segundo Albano, há muito potencial para ser explorado no futuro próximo. “O mercado de audiolivro cresceu globalmente 24% nos últimos três anos. A projeção é continuar crescendo nessa faixa até 2025. E esse crescimento premiará as empresas que têm recorrência de receita”, diz Albano, que além de sócio-fundador também é diretor de conteúdo da empresa. Ele acredita que o audiolivro não chega para ser concorrente do livro físico e sim uma alternativa a mais de leitura. Para fazer frente à concorrência, a empresa tem investido em estúdios, conta com equipe dedicada e aposta em conteúdo original. “O maior uso do nosso aplicativo é quando as pessoas estão no trânsito, indo ou voltando do trabalho, e não querem olhar para a tela”, revela.
Uma de suas concorrentes é a Skeelo, que tem parceria com diversas operadores de telecomunicações. Mas o modelo é diferente. Em vez de querer ser uma “Netflix dos livros digitais”, a proposta é fornecer um best-seller específico para cada cliente, de acordo com seu plano com a operadora móvel. “A gente acredita na qualidade e não na quantidade”, diz Rodrigo Meinberg, CEO da Skeelo. “Diferentemente de uma plataforma streaming de música, em que o conteúdo troca a cada 2 minutos, no livro você não consegue fazer isso”. Clientes das operadoras Claro, Tim e Vivo têm direito a acessar a plataforma sem custos — a receita da Skeelo (com projeção de 100 milhões de reais em 2021) vem de acordo com as operadoras móveis. Segundo Meinberg, isso ajuda a democratizar a leitura no país. “Nosso objetivo agora é atender melhor o usuário pré-pago dessas operadoras. Vamos trabalhar com um conceito de resumo de livros”, diz.
Em 2019, as editoras Sextante, Intrínseca e Record se reuniram e lançaram a plataforma Auti Books, em um investimento de 3 milhões de reais. Uma das primeiras ações da plataforma foi colocar a influenciadora Nathalia Arcuri gravando a versão em áudio de seu livro “Me Poupe”. Aqui, o modelo é semelhante ao utilizado pelo Google. Os e-books e audiolivros são comercializados separadamente na plataforma — há um serviço de assinatura disponível, no valor de 19,90 reais, mas que só dá direito a uma leitura por mês.
“A gente tentou criar um canal de venda à la carte. Eu entendo que, dessa forma, posso remunerar o autor de forma mais clara. Os modelos de streaming partem de um pressuposto de remuneração por tempo de visualização ou, no caso do audiolivro, minutos escutados. São modelos que nos parecem um pouco confusos”, diz Veiga Pereira, da Sextante.
Segundo ele, ainda há pouco acervo disponível de audiolivros no país. O catálogo de livros físicos da Sextante ultrapassa 1.000 títulos, mas, em audiolivro, são apenas cerca de 150 opções de títulos. “As grandes editoras estão investindo nessa mídia. Mas, fora elas, ainda há pouca oferta, até porque é um mercado que ainda não tem um volume muito grande de venda e demanda um investimento maior. E investimentos a longo prazo têm sido mais difíceis ultimamente.”