Corte de salário ou contrato suspenso já atinge 2,4 milhões de brasileiros
Varejista Havan, de Luciano Hang, puxa a fila, com a suspensão dos contratos de 11 mil funcionários, o que equivale à metade de sua força de trabalho
Diante do estado de calamidade pública, decretado devido à disseminação do novo coronavírus (Covid-19) no país, milhões de brasileiros se deparam com uma situação insólita. Embora estejam empregados, não são poucos os que já lidam com a suspensão do contrato de trabalho ou a redução de salários, permitida após a criação da Medida Provisória (MP) 936/2020, cuja função é proteger os empregos dos trabalhadores. Tão logo instituída, a rede de lojas Havan, de Luciano Hang, suspendeu temporariamente o contrato de 11.000 funcionários, o equivalente à metade da força de trabalho da varejista brusquense. Mas, não só ela. Segundo levantamento realizado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), 2,4 milhões de trabalhadores já foram impactados pela medida no país.
Questionado sobre a iniciativa, Hang – um dos principais apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) – disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que a decisão está respaldada pela Justiça. “Estamos fazendo tudo que é possível para manter os empregos. É primordial que as empresas trabalhem nesse sentido. Somente assim, conseguiremos atravessar esse período de dificuldades, mantendo os empregos e a renda dos colaboradores.” Ele aproveitou, inclusive, para desmentir veículos que noticiaram a demissão de aproximadamente 2.000 funcionários de sua empresa. “É mentira. Isso é obra de sites de esquerda”, disparou. Em nota, o Ministério Público do Trabalho (MPT) informou que analisará a atuação da Havan e de demais companhias para o cumprimento das regras permitidas previstas pela MP, mas que a empresa não está sob investigação neste momento.
De fato, a medida é ancorada pelo Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, instituído pelo Governo Federal recentemente como forma de mitigar os efeitos da pandemia na economia do país. Por causa disso, foi criado o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, que somente poderá ser acionado ao haver acordo entre trabalhadores e empregadores para redução proporcional da jornada de trabalho e do salário – podendo ser de até 70% – ou a suspensão temporária do contrato, em que a empresa pode optar por interromper o contrato por até 60 dias. Pela MP, os sindicatos não participam dos acordos, algo que pode ser visto como uma afronta aos princípios trabalhistas. O empregador, entretanto, fica responsável por comunicar o sindicato da categoria na qual atua no prazo de até dez dias corridos, a partir da data da celebração do acordo.
A opção de lay-off, a interrupção no contrato trabalhista, já era prevista na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), mas em moldes diferentes – era necessária a participação do sindicato e o período de suspensão poderia chegar a cinco meses. “A suspensão de contrato pela CLT prevê a necessidade de um acordo coletivo em que o sindicato tem participação crucial. Isso mudou com a MP”, diz André Melo Ribeiro, sócio-coordenador da área trabalhista da Dias Carneiro Advogados. “A MP criou um caráter de urgência em que a paralisação pode ser de até 60 dias corridos ou fracionados em duas partes. O empregador fica responsável por pagar pelo menos 30% do salário, em que não poderá ter nenhuma incidência de Imposto de Renda ou INSS, por exemplo, e o Estado entra com o pagamento do benefício de até 70% do que ele teria direito a receber pelo programa de seguro desemprego”, explica.
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Clique e AssineÉ importante ressaltar que as medidas são obrigatórias apenas para as empresas que declararam um faturamento superior a 4,8 milhões de reais em 2019. Mais importante que isso, ressalta-se que os funcionários que aceitarem a suspensão temporária por dois meses deverão receber, como contrapartida, mais dois meses de emprego garantido ao retornarem às atividades – a MP, entretanto, prevê a conversão desses dois meses de garantia em taxas indenizatórias por parte da empresa que não conseguir manter os contratos ativos após a paralisação. Ou seja, ninguém está 100% assegurado.