Deputados antecipam discussão da reforma administrativa
Desesperançados com o governo, parlamentares lançam frente no Congresso para traçar as linhas mestras da reforma
Se o governo não atua, o papel do Congresso toma a dianteira. Essa foi a tônica de 2019 e, aparentemente, não será revisada em 2020. Um grupo de parlamentares formou uma frente para discutir a reforma administrativa. A criação só foi adiada por um problema de saúde do deputado Tiago Mitraud (Novo-MG). “Nosso papel como Congresso é se preocupar com as pautas importantes para o país, independentemente do governo. Se o governo não apresenta seu texto, a gente se movimenta”, diz Mitraud. A Frente Parlamentar quer discutir tópicos centrais da reforma do funcionalismo para definir a nova legislação. O que sair de lá deverá ser acoplado ao projeto do governo, que está na gaveta do presidente Jair Bolsonaro. “A ideia da frente é independente e, enquanto o governo enrola por seis meses, vamos nos reunir para discutir o tópico.”
O problema é justamente a falta de um texto base para discutir a reforma. “Claro que uma Proposta de Emenda Constitucional vinda do governo é importante”, diz Mitraud. A ideia é que, mesmo sem ter uma proposta concreta nas mãos, as linhas mestras da reforma sejam definidas por esta Frente. “A reforma é algo mais amplo. São várias propostas e mudanças para se redesenhar o funcionalismo”, diz Mitraud.
Nas últimas semanas, o clima para a apreciação da reforma se deteriorou. Apesar da boa vontade expressa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em colocar o texto em pauta ainda em fevereiro, o governo travou o envio da reforma. As pressões de alas militares, como as dos ministros Jorge Oliveira, da Secretaria-Geral da Presidência, e Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, soprando as dificuldades de se aprovar o texto no ambiente político fizeram Bolsonaro recuar. A verborragia do ministro da Economia, Paulo Guedes, quando comparou funcionários públicos a parasitas também provocou uma insatisfação crescente no Parlamento — e aumentou a pressão de um grupo amplamente organizado sobre os deputados e senadores. A última canelada veio do próprio presidente: durante o Carnaval, o presidente ratificou a convocação para um protesto contra o Legislativo — o que aumentou a tensão entre as casas e colocou a agenda em xeque.
Por isso, o Congresso resolveu agir. “Essas picuinhas só atrapalham. Tira a motivação dos congressistas, atrasa a agenda econômica e a oposição se fortalece”, explica Mitraud, que lamenta a atuação de membros do governo para atrasar a agenda. “Pena que pessoas do governo deem justificativa para isso”, reclama ele. Enquanto o governo mantém-se inerte e belicoso, o Congresso parece ter entendido a importância de se emplacar a agenda de reformas estruturais. Em paralelo às propostas do governo de mudanças tributárias e no organograma do Estado, o Parlamento se debruça sobre as questões — colocando, é claro, suas digitais. Bom para o país.