É hora para desespero? Bolsa cai ao menor nível desde agosto de 2019
Bolsa chega a cair abaixo dos 100.000 pontos, menor valor desde agosto de 2019, mas retoma fôlego; economistas sugerem esperar evolução do mercado
“Não há motivo para pânico”. As palavras são da Organização Mundial da Saúde (OMS) acerca da proliferação do novo coronavírus (Covid-19), mas será que caberiam na boca de economistas e analistas de plantão? O impacto da epidemia nas bolsas de valores mundo afora tem sido devastador e deixado investidores perplexos. Não é diferente no Brasil. O Ibovespa, principal indicador de desempenho das ações negociadas na B3, está vivendo a pior ressaca pós-carnaval de sua história recente. Se antes do período festivo, em 21 de fevereiro, a bolsa de valores de São Paulo registrava 113.681 pontos, hoje retornou a marca dos 100.000 pontos. A desvalorização do índice para esse intervalo de tempo é acima de 11%.
Apesar de recuar para o patamar mais baixo desde agosto de 2019, os economistas mantêm certo otimismo em relação a apreciação do Ibovespa nas próximas semanas. O coronavírus saiu da China e tem se espalhado por outros continentes. Na quarta-feira 26, o Brasil confirmou o primeiro caso da doença. No mundo, o coronavírus já soma mais de 80.000 infectados e 3.000 mortos. “A perda do Ibovespa em fevereiro já ultrapassa 10%. É uma queda rápida e negativa. Pode ser que a bolsa chegue, realmente, a perder o patamar dos 100.000 pontos, mas eu não recomendaria a venda das ações neste instante”, diz Glauco Legate, analista-chefe da corretora Necton.
O otimismo vem de fatores internos e externos. No Brasil, a taxa de juros (Selic) está ao menor nível histórico, o que dá fôlego para que empresários voltem a investir e gerar mais emprego. Em relação ao próprio coronavírus, espera-se que a taxa de disseminação da doença se arrefeça nas próximas semanas — a China, epicentro da enfermidade, tem identificado recuo no número de registros do vírus. Além disso, o Ministério da Saúde antecipou a campanha de vacinação para a gripe no Brasil, o que deve facilitar o diagnóstico da síndrome respiratória Covid-19.
Mas o temor da doença não é a única preocupação dos investidores. No cenário doméstico, o clima de pessimismo gira em torno também da morosidade com que tramita as reformas administrativa e tributária no congresso. “Existe uma crise entre os três poderes no Brasil. É o que está fazendo, inclusive, com que o dólar alcance patamares nunca visto antes, levando o Banco Central a fazer leilões progressivamente para conter as incertezas”, diz Mauriciano Cavalcante, diretor de operações de câmbio da Ourominas.
Com a temporada de especulação aberta, companhias aéreas, montadoras de automóveis, fabricantes de smartphones, varejistas e empresas de turismo têm visto o valor de seus papéis se deteriorar nas bolsas. “Em momentos assim, as aéreas perdem espaço, uma vez que a companhia vai ver o número de passageiros ser reduzido naturalmente”, diz Legate. O setor de saúde também terá sua prova de fogo com a propagação do coronavírus. “As ações dessas empresas podem cair em caso de disseminação da doença porque ela deve ter seu custo alavancado, ao mesmo tempo em que não irá aumentar ao mesmo nível sua receita”.
Enquanto a incerteza está virando a cabeça dos investidores,VEJA mostrou que os principais bancos de investimentos do país ainda apostam que o principal indicador da B3 registrará entre 130.000 pontos e 140.000 pontos ao fim do ano. Uma projeção ousada, diria alguns, já que os últimos dias têm sido de perdas excessivas, mas é um caminho natural, segundo outros. “O Ibovespa deve voltar gradativamente ao patamar dos 110.000 pontos nas próximas semanas e se estabilizar posteriormente entre 115.000 e 120.000 pontos”, diz Cavalcante. “Mas não apostaria em uma escalada muito acima disso, porque estamos em ano de eleições municipais e o país ainda tem reformas a aprovar”. Uma “normalização” do patamar é prevista para o início da próxima semana.