Desde o primeiro dia do governo Jair Bolsonaro, a maior parte de seu esforço político está voltado para a aprovação da reforma da Previdência. Mudar regras para a concessão de aposentadorias de trabalhadores da iniciativa privada, servidores públicos e militares está em pauta, apesar de o texto com as mudanças ainda não ser conhecido.
Entre declarações de ministros, polêmicas e uma minuta de reforma vazada na imprensa, já é claro que o governo tem certo alguns pontos como fixação de uma idade mínima para pedir benefícios – acabando assim com a aposentadoria por tempo de contribuição –, a criação de um novo regime com base na capitalização e a tentativa de unificar a regra entre o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o serviço público.
O principal argumento do Planalto é o rombo que as aposentadorias causam nas contas públicas. No ano passado, o déficit da Previdência subiu 8%, chegando a 290,2 milhões de reais.
Segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, a economia gerada pelo projeto deve ser de 1 trilhão de reais em dez anos.
Idade mínima
O governo pretende fixar uma idade mínima de aposentadoria que seja igual para segurados do INSS e servidores públicos. A proposta de implantar um limite etário já estava na pauta da PEC da reforma do ex-presidente Michel Temer, que previa 65 anos para os homens e 62 para as mulheres.
O tema tem provocado ruído entre a equipe econômica e o presidente. Segundo o vice, general Hamilton Mourão, Bolsonaro é contra que as mulheres tenham a mesma idade para se aposentar que os homens, proposta que é defendida por Paulo Guedes.
“O Bolsonaro acha que as mulheres deveriam ser 60 (anos para a aposentadoria) e homens, 65″, disse o próprio Guedes ao lembrar que a palavra final sobre o assunto é do presidente.
Em entrevista no começo de janeiro, Bolsonaro chegou a citar que a idade poderia ser de 57 anos para as mulheres e 62 para os homens.
Na prática, a fixação de uma idade mínima para homens e para mulheres acaba com a aposentadoria por tempo de serviço, Nesse modelo, o atual, o trabalhador pode se aposentar mais jovem, desde que tenha contribuído por 35 anos ao INSS, no caso dos homens, e trinta anos, no caso das mulheres.
A média de salário pago pela aposentadoria por tempo de contribuição é de 1.984,35, segundo o Boletim Estatístico da Previdência Social de dezembro. No caso da aposentadoria por idade, o valor médio é de 969,08, 51% menor. Esse tipo de benefício já exige idade mínima, de 60 anos para mulheres e 65 anos para os homens, desde que eles tenham contribuído ao menos quinze anos para o INSS.
Com a nova reforma, o tempo de recolhimento obrigatório à Previdência também subiria. Segundo a minuta proposta, vazada pelo jornal O Estado de S. Paulo, seria necessário trabalhar ao menos vinte anos para conseguir se aposentar, ao invés dos quinze vigentes atualmente. Com isso, o cálculo do benefício também mudaria, sendo possível a aposentadoria integral com quarenta anos de contribuição. Hoje é possível com trinta anos.
No caso do serviço público, também já existe idade mínima. Atualmente, o servidor pode se aposentar aos 60 anos e a servidora, aos 55 anos, com 35 anos de serviço (homem) ou trinta (mulher). Na reforma, a idade limite dos servidores seria a mesma que a fixada para o INSS.
Outra mudança seria no salário do servidor público. Hoje, ao se aposentar, essa categoria recebe o mesmo valor que ganhava na ativa. A reforma pretende levar a regra do teto do INSS – atualmente em 5.839,45 reais – para os servidores públicos.
Regra de transição
Para tirar a aposentadoria por tempo de contribuição de circulação e mudar as regras de cálculo, o governo vai propor um período intermediário em que as regras vão subindo progressivamente até que tudo seja unificado.
A equipe econômica defende uma transição rápida, para que o impacto da medida chegue logo. Na proposta de Temer, o período era de 21 anos de transição até que todos os trabalhadores tivessem que se aposentar pela idade mínima. Em um dos textos analisados por Guedes, de autoria dos economistas Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, e Paulo Tafner, a transição seria de doze anos.
A ideia é que fosse fixada uma idade inicial, mais baixa, e que ela fosse subindo progressivamente até chegar no teto fixado.
A minuta da reforma vazada tem uma outra fórmula, que usa a regra 86/96 para isso. Atualmente, essa regra é uma das fórmulas de cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição em que o trabalhador consegue a aposentadoria integral se somar 86 pontos (mulheres) ou 96 (homens). Os pontos subiriam a cada ano até chegar aos 105 pontos para homens e mulheres.
Capitalização
A ideia defendida por Paulo Guedes é separar o regime atual de uma nova Previdência, que valeria apenas para brasileiros que ainda não entraram no mercado de trabalho.
Nesse novo regime, quem bancaria sua aposentadoria seria o próprio trabalhador. Seria criada uma espécie de poupança, a ser gerida por instituições autorizadas pelo governo e que o trabalhador escolhesse. Quando ele atingisse a idade limite, ele teria juntado dinheiro para sua aposentadoria. O modelo é utilizado em países como Chile, Peru, Inglaterra, Nova Zelândia, Hungria e Polônia.
Hoje, o regime da Previdência é o de repartição. O trabalhador contribui, mas o dinheiro que ele está recolhendo é usado para bancar os benefícios de quem já se aposentou. O problema, segundo a equipe econômica, é que a expectativa de vida é cada vez maior. Então, futuramente haverá mais aposentados do que pessoas recolhendo – e a conta não fecha.
Em um jantar com empresários, Guedes deu algumas pistas de como deve funcionar esse sistema. Segundo ele, o trabalhador poderá sacar parte dos recursos acumulados quando ficar desempregado ou tiver necessidades médicas. Para minimizar os riscos de, ao final da vida profissional do trabalhador ele não ter alcançado uma renda suficiente para se manter, a ideia é que a Previdência tenha um programa assistencial de renda mínima.
Na minuta da reforma, o benefício ao idoso prevê 500 reais para quem tiver 55 anos e 750 reais para quem tiver 65 anos. Esses benefícios seriam menores que o salário-mínimo, hoje em 998 reais.
Militares
Grande fonte de ruído entre os oficiais das Forças Armadas no Planalto e a área econômica, a reforma deve incluir os militares, ainda que as mudanças sejam encaminhadas em um projeto separado.
Na minuta da PEC, está prevista a criação de alíquota previdenciária para os militares, que não poderá ser menor que a do INSS (entre 8% a 11% hoje).
Porém, não há menção sobre fixação da idade mínima ou aumento do tempo de serviço, que pode ser tratado em um projeto separado. Atualmente, o militar vai para a reserva depois de trinta anos de serviço. Quem entrou no Exército aos 18 anos, por exemplo, se aposenta aos 48 anos.
Segundo o general Hamilton Mourão, o tempo de serviço deve subir para 35 anos e esse é um assunto “pacificado” entre as Forças Armadas.