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Equipe de transição da economia expõe desavenças na largada do governo

Integrantes do grupo de Lula não escondem a insatisfação de não terem sido consultados no debate sobre estouro do teto de gastos

Por Felipe Mendes Atualizado em 4 jun 2024, 11h12 - Publicado em 25 nov 2022, 06h00

Com 31 coordenadores e mais de 300 envolvidos, o grupo de transição para o terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva reflete o desafio que o novo governo tem pela frente. Em uma reunião recente no CCBB em Brasília, o ex-ministro Aloizio Mercadante, coordenador do processo, juntou os líderes de cada área de estudo em uma sala onde, além de uma grande mesa para reunir os participantes, foram instalados dois monitores de vídeo para os que estavam em outras cidades. A expectativa era que Mercadante atuasse mais como um organizador e aglutinador das contribuições de cada participante, mas o que se viu foi uma clara demonstração do estilo centralizador do ex-ministro, tentando influenciar os trabalhos e evitar propostas diferentes das defendidas no ideário petista. “A transição está um trem-fantasma. O diagnóstico que todos têm é de termos ali o Mercadante completamente solto. E isso é bem ruim”, diz a VEJA um integrante dos grupos.

Tal cenário é particularmente delicado no grupo ligado à economia, um dos pontos nevrálgicos para o sucesso do novo governo. E é justamente o território em que, segundo relato dos componentes, Mercadante tem sido particularmente ativo nas tentativas de isolar os representantes da frente ampla montada pelo governo em detrimento dos petistas — em todo o grupo de transição estima-se que, dos 300 participantes, 100 sejam ligados ao PT, muitos deles próximos do ex-ministro. Isso serviria para evitar que áreas-chave da economia sejam assumidas por pessoas sem conexão histórica com o partido. Um exemplo é o do cotado para a presidência do BNDES Gabriel Galípolo, ex-presidente do Banco Fator, apoiado pelo vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin. O economista não faz parte do time de transição da economia e foi indicado para o time de infraestrutura. “Está tendo umas cotoveladas ali, e todo mundo está vendo”, observa um membro da equipe.

DISPUTA - Sede do CCBB, em Brasília: reuniões gigantescas e divergências -
DISPUTA - Sede do CCBB, em Brasília: reuniões gigantescas e divergências – (Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

Dentro do próprio grupo de economia, a situação não é mais fácil dada a heterogeneidade dos componentes, o que alimenta divergências. Persio Arida e André Lara Resende, criadores das bases do Plano Real na parceria conhecida como Larida, hoje pensam de forma bem diferente e a sintonia fina entre ambos ficou no passado. Arida defende fortemente a responsabilidade com as contas públicas. Já Lara Resende se tornou o grande divulgador no Brasil da chamada teoria monetária moderna, segundo a qual países emissores de moeda podem gastar sem criar inflação — algo que até pode funcionar no papel, mas que o teste da vida real no pós-pandemia provou ser difícil de realizar na prática. Completam o time Nelson Barbosa, economista desenvolvimentista que foi ministro da Fazenda no governo malfadado de Dilma Rousseff, e Guilherme Mello, nome importante na ala econômica da campanha, mais à esquerda, ligado às visões da Unicamp e à Fundação Perseu Abramo, comandada por Mercadante.

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Discordâncias internas à parte, o grupo também se ressente de não ter sido ouvido para a elaboração da PEC da Transição, negociada por Alckmin e pelo ex-governador Wellington Dias (PT) com o Congresso. Trata-se de um processo de altíssima complexidade, pois a medida envolve complicados acertos políticos e precisa ser aprovada por três quintos dos congressistas até o início do recesso parlamentar, em 22 de dezembro. Além disso, será crucial na estratégia a ser adotada pelo futuro ministro da Fazenda. Mesmo sem contribuir diretamente com a montagem da PEC, alguns dos integrantes do time não se furtaram a se posicionar sobre o tema. Arida comentou em eventos públicos que o dispositivo não pode prever um estouro muito grande das contas. Já Barbosa falou que um gasto extra de 136 bilhões de reais apenas manteria a mesma relação de dispêndios em proporção ao PIB adotada por Bolsonaro em seu último ano, e assim não ampliaria o rombo brasileiro.

Rachas e divergências são comuns nas discussões internas do PT e não seria diferente em sua volta ao poder. O próprio Lula cultiva o traço de deixar candidatos a postos importantes livres para divergir e decidir por conta própria, até que, ao fim do processo, a escolha recaia sobre o que apresentou melhor desempenho e maior capacidade de articulação. Isso pode parecer tudo natural no PT, mas acaba sendo mais traumatizante para os colaboradores de fora, como os integrantes da frente ampla que ajudaram a garantir a vitória de Lula e que podem ser essenciais para a nova gestão. A ideia que fica é de desorganização, confrontos e conflitos que podem ser mais prejudiciais que positivos.

Publicado em VEJA de 30 de novembro de 2022, edição nº 2817

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