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Influencers de finanças entram ‘na mira’ de Anbima, CVM e Apimec

Com o crescimento dos conselheiros digitais de investimentos há o desafio de criar normas para a atividade, mas sem ferir a liberdade de expressão

Por Camila Barros, Juliana Machado Atualizado em 2 set 2024, 13h44 - Publicado em 30 ago 2024, 06h00
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  • CVM: a autarquia faz consulta pública para regulamentar a atividade de influencer
    CVM: a autarquia faz consulta pública para regulamentar a atividade de influencer (CVM/Divulgação)

    Nos últimos anos, as redes sociais passaram a desempenhar papel essencial na propagação da educação financeira. Com linguagem simples e acessível, os influenciadores de finanças — ou influencers — ganharam milhões de seguidores ao palpitar sobre investimentos, organização das finanças pessoais e assuntos de economia em geral. Há, claro, muita gente séria nesse universo, mas os picaretas também têm voz. Atentos a esses movimentos, os reguladores vêm fechando o cerco contra os maus influenciadores. O objetivo é evidente: colocar ordem na casa e mostrar que a divulgação de informações financeiras precisa seguir normas e ser responsável.

    Segundo o relatório mais recente da entidade reguladora Anbima, o Brasil tem atualmente 534 influencers ativos nas redes sociais. Juntos, eles acumulam 208 milhões de seguidores. Em relação ao primeiro levantamento sobre o tema, realizado em 2021, o número de influenciadores dobrou e o total de seguidores avançou 181%. Com isso, entidades como a própria Anbima, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a Apimec, reguladora dos analistas de investimentos, se mobilizam para conferir mais profissionalismo à atividade de influenciador, estimulando a busca por certificações e, em alguns casos, exigindo-as — como ocorre com o CNPI, título da Apimec obrigatório para quem recomenda ativos e produtos financeiros.

    A atuação dos conselheiros digitais de finanças preocupa até mesmo profissionais que produzem conteúdo sobre o tema. “De 2017 em diante, eu vi uma explosão de vídeos de educação financeira, alguns com caráter de especulação em bolsa em formato muito atrativo, com aspecto publicitário forte, como um entretenimento financeiro”, afirma Gustavo Cerbasi, sócio da plataforma de cursos SuperRico Saúde Financeira e ele mesmo um influenciador, autor de dezesseis livros sobre finanças. “Tenho 25 anos de carreira e tomo o cuidado sempre de não fazer recomendações a qualquer momento.”

    Regular, ressalve-se, não é tarefa fácil. O problema começa na “zona cinza”: o regulador não pode impedir as pessoas de falarem sobre seus próprios investimentos, cerceando a liberdade de expressão. Para caber nesse entendimento, muitos influenciadores alegam que seus conteúdos “não são recomendações”, e sim produções de caráter informativo e educacional. Mas isso basta? Segundo resolução da CVM de 2021, a análise ocorre quando alguém, de forma recorrente e remunerada, elabora estudos ou pareceres sobre ativos específicos, seja em texto, seja em vídeo. “Quando essa atividade gera uma remuneração, mesmo que indireta, ela deixa de ser uma simples questão de liberdade de expressão e passa a ser uma atividade profissional”, diz Bruno Fernandes, superintendente de autorregulação da Apimec.

    arte influencers

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    Não é o que pensam muitos influenciadores. Bruno Perini, dono do Você MAIS Rico, um dos canais de finanças mais influentes do Brasil, afirma ser contra a proposta de regulação. Na visão dele, essa é uma tentativa de complicar o ingresso de novos influenciadores no mercado. “Em um país com um número tão pequeno de investidores, não sei se uma regulação faria bem para o mercado”, diz. Perini não tem nenhuma certificação e não é amparado por uma casa de análise com ao menos 80% de profissionais com CNPI — uma das exigências da Apimec para que seja permitido dar recomendação de investimentos.

    A maioria dos influenciadores, de fato, argumenta que não faz recomendações porque não cita claramente a compra ou venda de um produto financeiro. No entanto, em um de seus vídeos mais recentes, Perini faz uma análise completa das ações do Bradesco, citando resultados do banco e aspectos como lucro e inadimplência, além de comparar seu desempenho com o de outras instituições financeiras. “Eu só estou comprado em Bradesco esperando que, quando ele fechar métricas de rentabilidade mais próximas de seus concorrentes, poderemos ver uma recuperação nos preços a ponto de compensar a posição”, afirma. O vídeo tem 50 000 visualizações na plataforma YouTube.

    arte influencers

    Consultada pela reportagem, a Anbima diz que está atenta ao trabalho dos influenciadores. “Em nossas conversas com eles, percebemos que muitos não sabiam exatamente o que podiam ou não fazer, porque o limite realmente não é claro”, afirma Luiz Henrique Carvalho, gerente executivo de distribuição da Anbima. Ainda assim, no entendimento da entidade, o primeiro sinal de recomendação é a menção a um produto específico em vez de uma classe de ativos ou cenário geral de investimentos. Outro indicativo é o uso excessivo de adjetivos, o que retira o caráter educativo e pode induzir o público.

    Bruno Perini
    Bruno Perini, do canal Você Mais Rico (@bruno_perini/Instagram)

    Veterana entre os influenciadores de educação financeira no país, Nathalia Arcuri, fundadora da plataforma Me Poupe!, está entre aqueles profissionais que não possuem certificações específicas, mas procura separar bem os papéis. “Eu não tenho certificação para indicar produtos, mas busco analistas para fazer os conteúdos de recomendação”, afirma Arcuri. É um caminho semelhante ao adotado pelo influencer Luan Onofre, do canal Tubarão da Bolsa, que convida especialistas para discutir desde o cenário econômico até ativos específicos. “Quando falamos de ações, procuro trazer analistas certificados”, diz ele. Ao contrário dos demais, porém, Onofre enxerga valor em ter uma certificação e se prepara para obter o CEA, um selo de especialista de investimento conferido pela Anbima.

    Atualmente, a CVM está em fase de consulta pública para uma possível regulamentação da atividade de influenciador digital. A ideia não é criar regras específicas para a categoria, mas incluí-la nas normas que regem a atividade de analistas e assessores de investimento. O foco também está na publicidade — ou seja, garantir que os vínculos contratuais sejam divulgados sempre que um conteúdo for patrocinado. Procurada, a CVM não quis comentar o tema. Em um estudo publicado em 2023, a autarquia afirma que os esforços regulatórios no Brasil estão em linha com o que é praticado em mercados maduros, como os Estados Unidos. Mesmo lá, porém, há o desafio de entender o limiar entre opinião e recomendação. Um caso ilustra bem a situação: em seu canal no YouTube e em um fórum na rede social Reddit, o investidor Keith Gill argumentava que a loja de videogames americana Game­Stop era promissora. O comentário gerou um movimento especulativo que, entre o fim de 2020 e o início de 2021, inflou o preço dos papéis da GameStop em mais de 1 000% e levou à falência do fundo Melvin, que apostava contra a empresa. Gill sempre defendeu que agiu com base em opiniões pessoais, não em manipulação intencional. Ele foi investigado pela SEC, a “CVM americana”, mas não foi acusado formalmente.

    GameStop: um influenciador turbinou o preço das ações da loja de videogames
    GameStop: um influenciador turbinou o preço das ações da loja de videogames (Michael Nagle/Bloomberg/Getty Images)

    Quem busca informações sobre investimento nas redes sociais esbarra em uma quantidade infindável de conteúdos. Para separar o joio do trigo, muitos optam por testar os métodos do influenciador e buscam aqueles que são certificados. Foi o que ocorreu com o empresário Rítalo Junior Neto Resende. Com uma empresa em decadência em 2018, ele começou a pesquisar temas sobre organização financeira nas redes sociais, até ser levado, pelos algoritmos, ao perfil de Gustavo Cerbasi, de quem adquiriu um curso. “Em cinco meses, eu já tinha recuperado o valor do curso, por organizar as finanças e aplicar recursos de forma adequada”, diz Resende. Há muitos exemplos positivos, mas, a despeito da evolução do mercado de capitais, a verdade é que os reguladores ainda têm muito trabalho pela frente.

    Publicado em VEJA, agosto de 2024, edição VEJA Negócios nº 5

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