Em 2011, quando foi aprovada no Brasil a lei que instituiu a figura do Microempreendedor Individual, o clima era de comemoração. Tanto o governo quanto os parlamentares que participaram da tramitação tratavam o MEI como o emprego do futuro. Oito anos depois, o emprego do futuro é a realidade e também a saída para muitos brasileiros. Se nem todo mundo é MEI, apesar da formalização por essa categoria ter crescido de forma acelerada, esse é um forte sinal do crescimento do empreendedorismo. Até a terceira semana de dezembro, 11,2 milhões de CNJPs estavam registrados neste regime, segundo a Receita Federal. O número é 20% maior que o mesmo período do ano passado, quando eram 9,4 milhões de MEIs. Apenas no período de março até a última sexta-feira, 19, o salto foi de 1,3 milhão de novos CNPJs no país.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, gosta de dizer que trabalho e emprego são os melhores programas sociais que podem existir. Com trabalho, a pessoa passa a ter renda e a consumir, movimentando a roda da economia e é basicamente essa engrenagem que faz um país crescer. Em 2020, o choque causado pela pandemia do novo coronavírus afetou diversas áreas da economia. Tanto que o governo federal tomou medidas para tentar proteger o emprego, como o programa que permitia a suspensão ou redução de contratos e o auxílio emergencial, que tinha como objetivo recompor a renda do trabalho formal.
Mesmo com as medidas consideradas exitosas, o desemprego cresceu. A taxa de desocupação medida pelo IBGE chegou à marca de 14,4% em outubro e tende a ser ainda maior. Em contrapartida, o número de empreendedores cresceu. A explicação para a multiplicação dos pequenos empresários não se dá apenas pela oportunidade e o planejamento de empreender, mas sim pela necessidade. “Esse aumento da formalização muito foi forçado pela situação que vivemos, mas é uma forma de retomada”, afirma Carlos Melles, presidente do Sebrae.
É o reforço dessa mão de obra – ora empregada, agora empreendedora – que mobiliza o país. Hoje, o setor de serviços, que representa 70% do PIB do país e é de onde se espera a retomada sólida da economia, representa a maior capacidade para nascimento e crescimento de negócios próprios. A categoria de Salão de Beleza, por exemplo, tem o maior número de CNPJs cadastrados no MEI: 824.289, 7,4% do total. O comércio varejista de roupas e acessórios tem 7,3% dos registros enquanto os profissionais de Obras de alvenaria representam 4,4% dos registos totais do MEI.
De acordo com Alexandre de Carvalho, contador e fundador do portal EasyMei, o número de novos empreendedores é expressivo, mas ainda há muitos na informalidade. “Seja pela falta de informação ou pelo negócio em estágio inicial, há muitos empreendedores que não estão formalizados e há proteções importantes para eles, além do recolhimento de impostos para o governo”. Tanto Melles quanto Cardoso citam a inclusão de MEIs como beneficiários do auxílio emergencial neste ano um dos motivos que pode ter acelerado a formalização.
Há pouco mais de seis meses como empreendedora, a artesã Karen Finati, 30 anos, ainda não abriu um CNPJ. Porém, esse é um dos maiores planos dela para 2021. Isso porque ela aposta que seu negócio de peças feitas por impressora 3D tenda a crescer e não seja apenas uma ocupação passageira. Em maio, após ser demitida da agência, ela juntou parte da rescisão, um dinheiro que tinha guardado e o reembolso de uma viagem frustrada pela pandemia para adquirir uma impressora 3D. Karen passou a produzir peças personalizadas ligadas á cultura nerd. Os pedidos são todos feitos via redes sociais. A impressora faz o trabalho de fabricação da peça, enquanto ela personaliza a pintura de forma artesanal. Desde então, Karen já tem outras três impressoras trabalhando a todo o vapor. “Acredito que essa é minha profissão agora. Eu gosto de criar coisas que eu gostaria de ter, que tem importância para as pessoas”, afirma. A experiência anterior em agência, na qual fazia controle de caixa e administração de redes sociais a ajuda, mas ela admite que lidar diariamente com o fluxo de pedidos, atendimento e administração do caixa é um desafio. “Se não fosse a pandemia, talvez eu não tivesse saído da estabilidade que tinha para me lançar em um negócio próprio”, diz.
No caso do empreendedor é preciso construir, além do trabalho, uma autogestão que envolva planejamento e organização para lidar com épocas boas e ruins, ressalta Melles, do Sebrae. E, para o país, a capacidade de formalizar pequenos empreendedores para que eles girem dentro da roda da economia e não na clandestinidade é fundamental. A realidade laboral está num processo de mudança e a necessidade do trabalho como motor do crescimento é cada vez maior.