A Covid-19 motivou um novo dilema na gestão da crise econômica oriunda de efeito colateral da doença. Enquanto setores no governo entendem que o caminho para a geração de empregos e o fomento à atividade passa pelo investimento público, membros da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, prezam pela manutenção da responsabilidade com as contas. As pressões para rever os limites de gastos, insufladas por Walter Braga Netto, ministro da Casa Civil, e Rogério Marinho, do Ministério do Desenvolvimento Regional, enseja abrir os cofres para obras de infraestrutura, com a intenção de criar empregos e solucionar gargalos de infraestrutura com investimento público. Guedes, por sua vez, com o lápis na mão, faz contas e tenta atrair recursos por meio da iniciativa privada para os grandes projetos de reconstrução da economia brasileira.
Principal e mais importante programa para mitigar os efeitos secundários da pandemia, o auxílio emergencial se transformou numa faca de dois gumes nas mãos do presidente Jair Bolsonaro. O benefício de 600 reais impulsionou a popularidade do presidente em regiões historicamente ligadas à esquerda, como o Nordeste. Por outro lado, avisa Guedes, torná-lo permanente mostra-se impagável nos moldes atuais. Otimistas, os técnicos do Ministério da Economia fazem figa para que a vacina, como se anuncia, surja ainda neste ano. Enquanto desenha com o presidente os moldes para uma alternativa ao pacote do governo para os mais desassistidos, o Congresso Nacional, por sua vez, adianta-se. E o campo de discussões será na Comissão de Orçamento. Começando a gestar com a equipe econômica a destinação dos gastos para o ano que vem, o auxílio pago aos informais transformou-se em uma dor de cabeça para os congressistas — e como pagar.
Substituindo Mansueto Almeida em meio à pandemia, o novo secretário de Tesouro, Bruno Funchal, assumiu uma bomba. Sob a tutela de Guedes, o chefe dos cofres do país vem defendendo que, como a crise de saúde é passageira, os gastos também devem ser. Por outro lado, apesar de publicamente apoiar a agenda de Guedes com unhas e dentes, Bolsonaro vem sofrendo pressões de todos os lados para gastar. Nas mãos do Congresso, as discussões sobre os rumos dos gastos do ano que vem ganharam novos tons com a ideia da prorrogação para 2021 do Orçamento de Guerra, que desvincula os gastos com a pandemia do orçamento corrente até o final do ano, e de alongar os pagamentos do auxílio emergencial até, pelo menos, o fim do ano, enquanto não se consolida um projeto consistente de renda básica. “A prorrogação está sendo discutida, assim como os valores e novos formatos, e número de beneficiários”, diz o senador Irajá Abreu (PSD-TO), relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
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Clique e AssineEnquanto discute-se, nos bastidores, brechas na LDO para prorrogar o estado de calamidade e gastar como se não houvesse amanhã, a Câmara dos Deputados reagiu rápido. “Não há qualquer ‘brecha’ para a prorrogação do estado de calamidade pública no texto do PLN [Projeto de Lei Nacional] que trata da LDO para 2021”, vaticina a Casa, em nota. A Câmara, vale lembrar, é presidida por Rodrigo Maia (DEM-RJ), defensor ferrenho do teto de gastos e de medidas que vislumbram a responsabilidade fiscal. A equipe do ministro passou a enfrentar pressões para abrir cada vez mais os cofres em nome da contenção dos efeitos assustadores da crise sanitária. Atualmente, parlamentares e membros do governo, entre ministros e militares, defendem abertamente a flexibilização do teto de gastos em nome de medidas que se contraponham às dificuldades decorrentes da pandemia. E o próprio presidente tem se encantado com a perspectiva de colher dividendos políticos do “orçamento ilimitado”, vislumbrando até o rompimento do teto. A discussão entre gastar e não gastar pode ser sedutora. A questão é como pagar a conta.