Rutger Bregman: Fim da pobreza? Simples!
O historiador holandês explica algumas propostas de seu livro 'Utopia para Realistas' e argumenta que nem todo problema sério exige soluções complexas
As receitas que seu livro propõe para problemas globais — a pobreza, sobretudo — não são demasiado fáceis? Acredito que pessoas com educação superior tendem ao que eu chamo de “viés da complexidade”. Pensamos que problemas sérios sempre exigem respostas complexas. Às vezes é assim, mas nem sempre. Um conjunto de evidências cientificamente atestadas, acumuladas desde os anos 1970, sugere que o modo mais simples de combater a pobreza é distribuir dinheiro aos pobres — e isso representaria uma economia em outros gastos de assistência social e saúde.
As experiências de renda universal citadas em seu livro são todas locais. Programas nacionais não seriam bem mais complicados? O Brasil tem um programa de sucesso, o Bolsa Família — não conheço os detalhes, mas sei que é barato e funciona bem, e acredito que ele deveria ser expandido. Mas você está certo, um programa de renda mínima para toda a população nunca foi feito em escala nacional. Temos de ser modestos, ir passo a passo.
Por que o senhor é cético em relação aos programas tradicionais de assistência social? Na Europa e nos Estados Unidos, parte considerável do Estado de bem-estar social tornou-se burocrática e paternalista. É um sistema que aprisiona as pessoas que deseja ajudar, que diz aos mais pobres: “Nós sabemos como melhorar a vida de vocês”. E nesse ponto eu sou de direita: acredito que as pessoas devem tomar suas decisões e correr riscos. Mas não me interprete mal: coisas como saúde pública e seguro-desemprego são marcos civilizatórios. A renda universal viria se juntar a isso. Seria a coroação tanto da social-democracia quanto do capitalismo.
Por que deveríamos acabar com as fronteiras? A desigualdade global, de um país para outro, é mais drástica que as desigualdades locais. A imigração gera prosperidade. Na média, imigrantes são mais empreendedores que a população nativa. Entendo que essa é a ideia mais doida do livro. Mas, quando os historiadores do futuro olharem para nosso tempo, talvez vejam as fronteiras como uma invenção bárbara.
Publicado em VEJA de 17 de outubro de 2018, edição nº 2604