Shark Tank: investidores apontam maiores erros de empreendedores
No Brasil em sua terceira temporada, o programa exibido pelo Canal Sony já recebeu mais de 4.500 interessados em conseguir um investidor
Falta de produto, de paixão, de preparo, de humildade para saber ouvir, além de supervalorização do próprio negócio. Segundo cinco investidores, os chamados tubarões do reality show Shark Tank, esses são os principais erros cometidos pelos empreendedores que buscam recursos para lançar ou ampliar suas empresas. No Brasil em sua terceira temporada, o programa exibido pelo Canal Sony já recebeu mais de 4.500 interessados em conseguir um investidor para sua empresa. Além do Brasil e dos Estados Unidos, país onde o programa está na décima temporada, Colômbia e México transmitem suas versões locais. O original, Dragons’ Den, criado pela Nippon TV no Japão e distribuído Sony Pictures Television, já foi adaptado em 38 países.
No dia selecionado, alguns escolhidos dentre os inscritos têm entre 40 minutos e uma hora para apresentar o que seria o projeto de suas vidas. Os investidores não fazem a menor ideia do que vem pela frente, pois eles não recebem uma prévia das apresentações: precisam ser convencidos na hora. O telespectador em casa tem acesso a cerca de sete minutos desses pitchs (discurso de venda). Ao todo, foram ao ar 149 pitchs nos 29 episódios da primeira e da segunda temporadas. Na terceira, estão previstas 79 apresentações divididas em 16 episódios. Os empreendedores deste ano foram escolhidos a partir de uma base de 1.375 inscritos.
Na segunda temporada, os cinco tubarões investiram 10 milhões de reais ao longo de 13 episódios, sendo que, dos 69 empreendedores, 22 saíram com negócio fechado. O maior deles foi de 2,750 milhões de reais, feito por João Appolinário, fundador da Polishop, para a empresa de food trucks de pães artesanais Sagrado Boulangerie, que chegou ao programa em busca de franquia. “Investi porque a empresa já tinha um bom faturamento, plano de negócios e de expansão. Hoje, estamos reestruturando a empresa. Usamos o meu network para mudar fornecedor, formar franquias”, explica ele. Appolinário não divulga quanto suas empresas faturam por ano, mas no Shark Tank ele já investiu em 11 empresas nas duas primeiras temporadas. “Fechei com 23, mas em algumas havia problemas”, diz. Isso porque, de acordo com o regulamento do programa, os investidores têm seis meses para averiguar se a situação da empresa é a mesma da divulgada ou se há problemas de sociedade, inexistência, entre outros. Para ele, é um erro quando a pessoa vai vender algo que não existe ou que é embrionário. “Ter uma ideia, todo mundo tem. Na Polishop, testo 120 produtos por ano para lançar dez. Tenho visão? Não, a gente tem um espaço para testar.”
A investidora-anjo Camila Farani vê com maus olhos quando o empreendedor não se importa em ouvir o que os mentores têm a dizer. “Quando não tem humildade em ouvir ou em aprender, não fecho. Se eu entendo que não posso contribuir com aquela pessoa, por que vou investir nela? A capacidade de ouvir é o melhor benefício de um empreendedor”, diz ela, que possui em sua rede 35 startups, principalmente voltadas para tecnologia. Se a pessoa passou no quesito humildade, ela analisa se tem como plugar o negócio apresentado com os que ela já possui e faz a oferta. Nas duas primeiras temporadas, Camila fechou negócio com dez empresas, totalizando quase 2 milhões de reais.
Acostumada com mentoria, Cristiana Arcangeli, empresária do segmento de moda e beleza, é a pessoa que mais faz contas quando o empreendedor chega para falar do seu negócio. No seu caderno, ela anota todos os números que saltam dos participantes a fim de ver se é viável. Mas é daí também que ela aponta o erro mais grave, em sua opinião: o despreparo. “Quanto você iria estudar para estar no pitch? Se eu tivesse essa oportunidade no início da minha carreira, incluindo publicidade na televisão, ia estar com tudo pronto. Mas a pessoa chega despreparada e não conhece o negócio. É até ruim para quem está em casa e vê que ele não sabe quanto vale o próprio negócio”, dispara. Cris sente-se natural ao fazer mentorias para novos empreendedores, pois é algo que já faz na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), com o Comitê Acelera Startup. Ela se lembra de um garotinho de Maceió (AL), Davi Braga, que apareceu na segunda temporada. O menino, que tinha 15 anos na época, apresentava eloquência ao mostrar o seu produto, destreza, esperteza, além de paixão. Seu produto, o List It, loja on-line de materiais escolares, no entanto, ainda não era suficientemente bom para receber o investimento. O que ele precisava era de orientação, de mentoria. E esse foi o prêmio dele. “Um dos melhores pitchs que eu já vi no Shark Tank. A gente via que o produto dele tinha falhas, mas ele argumentava. Ele fez um livro, foi estudar nos Estados Unidos. Aconteceu muita coisa para ele depois [da apresentação do programa]”, conta ela.
Quando um empreendedor pensa em franquear o seu negócio, mira sua apresentação para Robson Shiba, fundador e presidente da China in Box e do Gendai, empresas que faturaram em 2017 mais de 410 milhões de reais. Nas duas primeiras temporadas, ele fechou com dez empresas e investiu 1,678 milhão de reais. O maior erro dos novos empreendedores, em sua opinião, é colocar o valuation alto, ou seja, o quanto vale a empresa. “A gente não pode mudar o equity, porque está na regra do programa”, diz Shiba. A explicação é simples: quando vai apresentar a proposta, o empreendedor diz vender, por exemplo, 15% de seu negócio por 100 mil reais. Esse valor não pode ser mudado para baixo, mas a participação, sim. Ou seja, é possível propor os mesmos 100 mil reais por 30% de participação. Assim, tem-se uma fatia maior, pelo mesmo preço. Para Shiba, porém, o investidor precisa ter o percentual pequeno para o empreendedor seguir motivado. “O máximo deveria ser de 30%”, aponta.
O shark mais recente a ocupar uma cadeira no tanque de tubarões é Caito Maia, dono da marca Chili Beans. Ele chegou na temporada passada, no lugar do cantor Sorocaba, e investiu 615 mil reais em seis empresas. Para ele, “empreendedor tem que ter verdade, paixão”. “Há 20 anos, quando comecei o meu negócio, não sabia nada de número. Não conseguiria vender nada pra ninguém aqui”, afirma o dono da empresa que vai faturar 700 milhões de reais neste ano, 9% a mais em relação ao ano passado. “Para mim, o que peca é quando a pessoa vem falar só de negócio. A falta de paixão é um erro”, diz.
Evolução
Durante as gravações de episódios da terceira temporada, os sharks conversaram com VEJA e dizer ver evolução nas apresentações dos empreendedores desde o primeiro ano. “As pessoas que vêm na terceira temporada já assistiram a algum capítulo anterior e isso mostra que elas estão mais preparadas”, diz Appolinário. Entretanto, mesmo estando na terceira temporada, eles ainda veem desafios grandes. Não basta saber o que significa payback (tempo de retorno), break-even (ponto de equilíbrio), termos usados pelos empresários no dia a dia, mas, sim, conhecer os números reais do negócio. “A pessoa se esquece de colocar outros custos e impostos. É importante analisar o produto, se é escalável e se o empreendedor é capaz de tocar o negócio. Também levo em conta sobre o que a pessoa está falando e como ela está falando”, avalia Appolinário.
Quando entra como sócio em uma empresa, ele coloca mais do que dinheiro. “O que tem menos importância é o dinheiro. Dou suporte, inteligência fiscal, contábil, trabalhista, jurídica.” Ele explica que criou um fundo para investir em negócios independentemente do ramo de atividade. Na Sagrado Boulangerie, por exemplo, ele viu oportunidade de bom negócio, com inovação específica e bons empreendedores. Fábio Freitas, sócio-proprietário da empresa, explica que, quando foi ao programa, já tinha planejamento de expansão da empresa, mas precisava de um investidor. O programa foi gravado em maio de 2017 e neste período estão avaliando o modelo de franquia. “Temos 270 pedidos de franquia, desde que aparecemos na televisão”, conta. Além da loja de fábrica e dos food trucks, a empresa vai inaugurar uma unidade fixa em Alphaville (Grande São Paulo).
Shiba afirma que procura brilho nos olhos. “Se o empreendedor se emocionar, tem muito comprometimento. E, obviamente, invisto naquelas empresas em que consigo ver escalabilidade, ou seja, quando consigo escalar em franquias”, conta ele que chegou a se interessar pelo food truck de pães, mas não fez uma proposta, porque achou o valor muito elevado. Em compensação, investiu no negócio de um casal sírio, que queria abrir um restaurante de comida árabe. “Sugeri que eles começassem com food truck para entenderem como funcionava o Brasil. Agora eles inauguraram a loja física, na Bela Vista”, comemora ele, sobre o Banarabi Culinária Árabe. A sócia Bouteina Sakhi foi ao Shark Tank na primeira temporada. “O programa mudou toda a nossa vida. Aqui no Brasil não conseguiria juntar 100 mil reais em um ano. E a visão do Shiba estava correta. Estou trabalhando bastante, mas estou feliz, me sinto acolhida pelos brasileiros”, conta ela.
Com melhores negócios aparecendo e empresas mais bem preparadas, Shiba vê as disputas entre os tubarões aumentando nesta temporada. “O negócio vem mais preparado e mais pessoas querem investir”, destaca. O primeiro episódio, aliás, já mostra isso. Mas é preciso esperar para ver. A terceira temporada estreia no dia 17 deste mês, às 22h, no canal Sony.
B2B (business to business): transações comerciais entre empresas
B2C (business to consumer): comércio entre a empresa e seu consumidor final
Brand equity: valor adicional que a marca agrega ao produto ou serviço e que está diretamente relacionado ao comportamento do consumidor em relação à marca
Break-even: quando o total de ganhos é igual ao total de gastos. Também conhecido como ponto de equilíbrio
Business plan: documento que especifica o que é o negócio ou o que será futuramente. Concilia estratégia e realidade da empresa e deve ser sempre atualizado
CMV (custo de mercadorias vendidas): considera as despesas com produção, transporte e armazenamento de mercadorias
Core business: a principal atividade da empresa, seu ponto mais forte e estratégico de atuação no mercado
Mark up: diferença entre o custo do produto e o seu preço de venda
Payback: tempo de retorno do investimento inicial
Smart money: quando o investimento não é só financeiro, mas também intelectual. Quando consultado, o investidor pode contribuir com insights importantes para o negócio
Ticket médio: média entre o total de vendas e o número de pedidos realizados dentro de um período
Valuation: quanto vale a empresa, que pode ser estimado
Fonte: Shark Tank Brasil