Temporada de ofertas
Com o PIB encolhido, grandes companhias investem em aquisições e fusões, que podem beneficiar o consumidor, antes que o cenário mude e os preços disparem
O noticiário econômico anda movimentado nas últimas semanas — e não só pelo onipresente debate em torno da reforma da Previdência. Digna de nota é também a agitação que vem ganhando corpo na iniciativa privada. O motivo: a entrada das grandes empresas na, digamos assim, temporada de aquisições e fusões do mercado brasileiro.
Os exemplos se multiplicam. A Natura anunciou a compra da rival Avon; juntas, elas vão representar a quarta potência mundial do setor de cosméticos. Já a BRF divulgou estar estudando uma fusão com a Marfrig (veja o quadro ao lado). Entre janeiro e abril, foram anunciadas nada menos que 241 transações com tais características, muito acima das 199 ocorridas, em média, no mesmo período nos últimos três anos. “As transações cresceram em todos os setores”, observa Leonardo Dell’Oso, sócio da consultoria PwC, que compilou os números. “Isso indica um movimento que ganha solidez”, acredita ele.
O recente anúncio de que o PIB nacional encolheu 0,2% no primeiro trimestre do ano e o consequente desânimo geral com as perspectivas para o crescimento da economia em 2019 deveriam, em princípio, sugerir apenas cautela aos investidores. No entanto, o apetite por aquisições e fusões em negócios de extraordinário vulto revela que há outra maneira de enxergar a atual fase do mercado brasileiro. Companhias saudáveis financeiramente entendem que este é o período ideal para ir às compras. Graças ao marasmo econômico, existe uma expressiva quantidade de empresas disponíveis na praça a preços muito inferiores aos que seriam cobrados caso o Brasil estivesse esbanjando crescimento. Várias dessas companhias se tornaram eficientes depois de seguidos cortes de custos nos tempos de vacas magras. Com a aposta na aprovação de uma nova Previdência e a promessa de que, além dela, outras medidas de impacto econômico serão tomadas pelo governo, é razoável imaginar que os ventos favoráveis para quem investir agora comecem a soprar já em 2020. Diante da possibilidade de que, empurrada por esses sinais, a janela de oportunidade de bons preços se feche nos próximos meses, o melhor seria mesmo correr para concretizar negócios. “Em perspectiva, a visão é de que o pior já passou e o futuro será favorável”, diz Bruno Amaral, sócio do banco BTG Pactual.
Cada caso, claro, tem suas particularidades. A atual disputa travada pelo controle da Netshoes, por exemplo, põe frente a frente uma empresa que quer botar os pés no ramo de artigos esportivos, o Magazine Luiza (última oferta: 93 milhões de dólares), e uma incumbente que pretende se consolidar no mercado, a Centauro (lance de 109 milhões de dólares). Em setores como o de saúde e o de educação, o que move as aquisições é a consolidação de mercado. A Hapvida, que opera planos de saúde no Norte e no Nordeste, garante uma atuação nacional ao adquirir o Grupo São Francisco, concorrente que está no Sudeste, no Sul e no Centro-Oeste, por 5 bilhões de reais. No âmbito educacional, a Arco levou o Sistema Positivo de Ensino, do Grupo Positivo, por 1,65 bilhão de reais. Ao buscarem uma fusão, as alimentícias BRF (dona das marcas Sadia e Perdigão) e Marfrig têm por objetivo ganhar porte para rivalizar com a JBS, a maior do setor em todo o mundo.
Com as compras e fusões, as companhias procuram os chamados ganhos de sinergia: ao eliminarem redundâncias operacionais, reduzem custos; ao costurarem as complementaridades, faturam mais. É uma questão de competitividade — e mercados mais eficientes acabam beneficiando, no fim das contas, os consumidores.
Publicado em VEJA de 12 de junho de 2019, edição nº 2638
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