Os shopping centers, normalmente espaços fervilhantes de gente se equilibrando em meio a sacolas, foram forçados a tomar uma decisão sem precedentes neste tão distinto 2020 — fecharam as portas sem saber quando voltariam a abrir, e o comércio de rua limitou-se ao essencial, entre farmácia e mercado. Eram medidas necessárias para frear a contaminação pelo novo coronavírus. E assim a humanidade caminhou por alguns meses, privada da experiência física, em que os cinco sentidos entram em plena ação ao simples toque naquele desejado smartphone. Quer dizer que ninguém foi às compras nesses tempos diferentes? Nada disso. As pessoas evidentemente acharam o seu jeito, canalizando seu afã consumista para a internet, onde o comércio on-line e o delivery explodiram. Uma frase muito ventilada no mundo empresarial é de que este ano valeu por cinco quando se trata da evolução dos negócios digitais. Enquanto o varejo entre quatro paredes naturalmente emagrecia, o e-commerce avançou 47%, em contraste com o primeiro semestre de 2019, a maior alta registrada em duas décadas, alcançando no Brasil o patamar de 38,8 bilhões de reais, segundo a consultoria Ebit|Nielsen.
Ficou claro que a desconfiança em relação à compra a distância — o produto vai chegar?, será o mesmo da foto? — foi se dissipando entre os brasileiros, amparados na melhoria a jato dos serviços de entrega em casa. “Quem nunca tinha ido às compras na internet passou a fazê-lo. Quem já comprava começou a comprar ainda mais”, diz Eduardo Terra, presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo. E desse jeito a paisagem das cidades foi mudando, com entregadores a bordo de motos, bicicletas e até patinetes cruzando ruas esvaziadas. Mesmo quando a flexibilização fez o comércio reabrir sob novas regras, os aplicativos seguiram a toda, como parte já indissociável dos hábitos das pessoas — iFood, Rappi etc. ajudaram a suavizar a sangria no caixa dos restaurantes. Os gigantes do varejo aproveitaram a onda, ampliando a oferta de produtos e adquirindo, eles próprios, startups especializadas em delivery, caso de grupos como Magazine Luiza e Pão de Açúcar. Não é de se espantar que Jeff Bezos, o todo-poderoso dono da Amazon, a gigante do comércio on-line, tenha virado o ano como o bilionário número 1 do planeta.
Publicado em VEJA de 30 de dezembro de 2020, edição nº 2719