“Minha vida e meu trabalho criativo estão justificados e foram completados com Blade Runner.” Assim finaliza Philip K. Dick a carta enviada a Jeff Walker, da produtora Ladd Company, responsável pelo filme de Ridley Scott, lançado nos cinemas em 1982. Dick viu uma prévia do longa, mas nunca chegou a assistir ao filme no cinema — ele morreu três meses antes da estreia oficial, aos 53 anos.
A frase entusiasta poderia ser ainda mais extasiante se o autor americano soubesse que, depois da adaptação do romance Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?, diversos outros escritos assinados por ele chegariam ao cinema e à TV, entre elas uma série no canal de streaming Amazon, atualmente em exibição.
Relembre abaixo as principais adaptações:
O Vingador do Futuro
As vinte e poucas páginas do conto Podemos Recordar para Você, por um Preço Razoável (We Can Remember It for You Wholesale) ganharam duas versões para o cinema: em 1990, depois em 2012. Arnold Schwarzenegger e Colin Farrell, respectivamente, interpretaram Doug Quaid, um operário que sonhava com a vida de um agente secreto em Marte. A empresa Rekall Inc. promete dar a Doug o que ele deseja implantando memórias falsas da aventura. O procedimento, no entanto, não sai como o planejado, e Doug precisa lidar agora viver entre o que achava ser verdade, e o que realmente é. Publicado originalmente na revista The Magazine of Fantasy & Science Fiction, o enredo não sofreu grandes mudanças do papel para a tela, além da transposição de metade do cenário para Marte, que rendeu à produção original um Oscar de Efeitos Especiais. O remake de 2012, por sua vez, não obteve o mesmo sucesso do primeiro, e foi bastante criticado por se afastar da essência da obra de Philip K. Dick.
Minority Report – A Nova Lei
Um sistema conectado a três pessoas com capacidade premonitória antevê crimes e reduziu a zero a criminalidade no distópico ano de 2054. A trama lançada nos cinemas em 2002 por Steven Spielberg se inspirou no conto Minority Report – A Nova Lei, de 1956. Tom Cruise interpreta o policial “incorruptível” John Anderton que, para a surpresa de todos, é indiciado como autor de um futuro crime. Tanto Cruise, quanto Spielberg concordaram em aceitar como salário uma porcentagem da bilheteria, assim boa parte do orçamento do filme foi direcionado para a “construção” da Washington de 2054 – que no livro era Nova York. A trama também inspirou uma série homônima, lançada pela Fox em 2015. Ambas as produções são ambientadas numa época em que os crimes são previstos, mas na televisão o protagonista é um dos jovens que vê o futuro.
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O Pagamento
Em outro futuro não-tão-distante, operários passam por uma “lavagem cerebral” ao serem demitidos. O intuito é que eles não se lembrem de informações confidenciais da empresa e vazem algo para a concorrência. No filme de 2003, um jovem Ben Affleck acorda sem memória depois de passar pelo processo, e precisa desvendar um misterioso envelope deixado ao seu lado para sobreviver. A trama foi publicada na revista Imagination, em 1953. No Brasil, o conto faz parte da antologia Realidades Adaptadas (Aleph, 304 páginas, 44 reais).
O Homem Duplo
Quando chegou aos cinemas, O Homem Duplo chamou atenção pelo belíssimo trabalho em rotoscopia — animação feita em cima das filmagens com atores, “pintados” quadro a quadro por computador —, para além da adaptação fiel à história de 1977. Dirigido por Richard Linklater, o longa contou com a consultoria das duas filhas de K. Dick, Isa e Laurel, e produção de Steven Soderbergh e George Clooney. Num futuro distante, mas bastante similar à realidade dos anos 2000, Keanu Reeves interpreta o policial Bob Arctor, que, em missão pelo submundo do tráfico de drogas, se perde entre personagem que precisa interpretar, um dependente químico, e sua missão como policial. O Homem Duplo (Livros do Brasil, 288 páginas, 20,80 reais) foi o segundo livro completo de K. Dick a ganhar uma versão nos cinemas, 26 anos após a estreia de Blade Runner.
O Vidente
Adaptação do conto O Homem Dourado, de 1953, o filme de 2007 traz Nicolas Cage como o protagonista Cris, um homem que possui a habilidade de prever o futuro próximo, cerca de minutos antes do que vai acontecer. Ele entra na mira do FBI quando uma agente, interpretada por Julianne Moore, quer impedir um grande ataque terrorista. O filme de orçamento milionário em pouco lembra a obra escrita, em que K. Dick fala sobre uma caça a mutantes. Uma das principais mudanças é a aparência de Cris, que no livro apresenta uma pele dourada. O conto foi lançado no Brasil no livro Realidades Adaptadas (Aleph).
Agentes do Destino
A produção de 2011 conta com Matt Damon na pele do candidato ao senado David Norris, que após perder a eleição, vive uma noite de luxúria com a bailarina Elise Sellas, vivida por Emilly Blunt. Em um mundo sem livre-arbítrio, o casal enfrenta mercenários, que querem apagar o romance da memória de ambos, já que o envolvimento não estava previsto pelo “plano superior”. O conto foi originalmente publicado na revista Orbit Science Fiction em 1954 e publicado no Brasil no livro Realidades Adaptadas (Aleph).
Eletric Dreams
A série adaptou para a televisão dez contos de Philip K. Dick, em episódios distintos, no estilo de Black Mirror. A produção estreou no Reino Unido em 17 de setembro deste ano e, até o momento, exibiu as adaptações de The Hood Matter (A Questão do Capuz, em tradução livre), um conto situado numa ditadura que usa seres telepatas para extinguir qualquer oposição; e The Comuter (O Viajante), que acompanha um grupo de pessoas que viajam diariamente entre casa e trabalho e, no caminho, descobrem uma cidade não localizada no mapa. Até o momento, a série conquistou 63% da aprovação do público, segundo o site especializado em crítica Rotten Tomatoes.