Está em cartaz no Rio de Janeiro, no Teatro Riachuelo, o espetáculo Ayrton Senna, o Musical, que conta a história do ex-piloto brasileiro de Fórmula 1 morto em 1994. A produção consumiu três anos de trabalho, entre concepção do projeto e realização, e é um dos mais originais espetáculos do gênero criados no Brasil. Na peça, Senna é representado pelo ator Hugo Bonemer.
“O maior desafio era criar um musical sobre alguém que não tinha relação com a música”, conta Aniela Jordan, sócia-diretora da Aventura Entretenimento, empresa responsável pela produção. “Outro importante detalhe era tratar de Ayrton Senna, figura carismática e ainda muito amada.”
Depois de não aprovar os caminhos propostos por alguns roteiristas, Aniela chegou ao ator e diretor Claudio Lins, que se dispôs a encarar o desafio. “Ele se reuniu com Cristiano Gualda e, dias depois, trouxeram a solução.” Era uma opção arrojada, mas, se vingasse, seria a melhor delas, pensou a produtora que, nessa que é a sua 22ª peça musical, jamais teve tantos empecilhos para resolver.
O espetáculo se passa durante os momentos que cercaram o GP de San Marino, no fatídico dia 1º de maio de 1994, que resultou na morte de Senna. Com mau presságio provocado pelo acidente de Rubens Barrichello e pela morte do austríaco Roland Ratzenberger, nos dois treinos que antecederam a prova, Ayrton Senna era um homem marcado pela angústia. E essa questão envolvendo a voz da consciência é mostrada por Victor Maia, que vive um personagem que existe apenas na cabeça do piloto.
Ao longo dos anos, convencionou-se tratar a estrutura da Fórmula 1 como um circo, por causa de seu caráter passageiro – durante uma semana, as equipes montam seus boxes num autódromo para, dias depois, desmontar e seguir para outra cidade. Coincidência ou não, são artistas circenses quem também compõem o musical, uma ideia trabalhada por Lins, Gualda e também o diretor Renato Rocha, que buscavam uma forma de reproduzir no palco a adrenalina provocada por uma corrida de F-1.
“Era preciso criar uma atração de alto risco”, justifica Rocha, que desenvolveu carreira internacional por quase 10 anos, reconhecido por unir circo e teatro. “Não tem como fazer um espetáculo sobre Senna sem muita velocidade, sons e luzes. Daí termos muitos números aéreos e pendulares.”
Assim, ao longo de toda a peça, o palco é ocupado por artistas que voam amarrados apenas por cordas, fazem acrobacias com aros gigantes, empoleiram-se em estruturas metálicas, exibindo grande agilidade e se expondo ao risco – tal qual um piloto de F-1. Contribuem para isso a coreografia de Lavínia Bizzotton, que reproduz os movimentos de quem pilota um carro de competição, e a direção de arte e cenário de Gringo Cardia, composto por símbolos típicos de uma competição automobilística, como pneus, volantes.
Até mesmo o protagonista, Hugo Bonemer, não escapa das piruetas. Com incrível semelhança física com Senna, o ator, que é primo do jornalista William Bonner, revela sua maturidade artística ao criar com precisão um homem que, naquele momento específico, está dividido entre a determinação que o marcou durante toda a carreira vitoriosa e a estranha e penosa sensação de que tudo está por um fio e vai acabar. Um delírio criativo, que faz lembrar grandes obras memorialistas como All That Jazz, derradeiro filme de um gigante dos musicais, Bob Fosse.
Para completar, a trilha sonora, também criada por Lins e Gualda, e a direção musical de Felipe Habib. As letras tanto reproduzem a intimidade de Senna (a relação familiar e com as namoradas, sem citar nenhuma) como o clima de corrida. Para isso, a melodia, por vezes, é acelerada, num tom metálico, que faz lembrar o som do grupo alemão Kraftwerk, graças principalmente ao uso de uma iluminação a laser.
E, mesmo quando não há canções, o público é “mantido” dentro de um autódromo graças a sons característicos, que ficam em segundo plano ecoando no teatro, como o do motor rangendo na reta ou o do desparafusar na rápida troca de pneus. O musical chegará a São Paulo, em março de 2018A, no Teatro Sérgio Cardoso.