O prodígio da vez na NBA nem sequer estreou na liga
O francês Victor Wembanyama, de 19 anos, é um caso raro no basquete. Jogador tem 2,25 metros de altura e espaço para crescer mais
Uma brincadeira entre os dirigentes da NBA, a liga profissional do basquete americano, diz que só existem dois fatos infalíveis na vida: a morte e a certeza de que um jogador extraordinário surgirá a cada dez anos. Poucas modalidades renovam tanto seu estoque de talentos — e cada novo craque, ao seu modo, parece igualar ou superar o anterior. Basta dar uma espiada nos nomes que brilharam nas quadras desde a criação da NBA, em 1946, para comprovar a teoria. Nos anos 50 e 60, Bill Russell e Wilt Chamberlain abriram caminho para a NBA se tornar o mito que é hoje. Eles foram sucedidos pelo lendário Kareem Abdul-Jabbar, que mais tarde passaria o bastão para colossos como Magic Johnson e Larry Bird. Depois, Michael Jordan, o maior prodígio da história, parecia colocar um ponto-final na saga dos gênios, mas isso nem de longe ocorreu. No século XXI, LeBron James e Kobe Bryant mostraram que a roda dos notáveis continuaria a girar, sempre e cada vez mais veloz. Agora, a fábrica de talentos (leia o quadro) está prestes a produzir um jogador único, em nada parecido com os fenômenos que o antecederam.
O francês Victor Wembanyama, de 19 anos, é um caso raro no basquete. Não é todo dia que se vê um jogador com 2,25 metros de altura e espaço para crescer mais. Estudos indicam que possa chegar aos 2,31 metros, o que o tornaria o jogador mais alto da história da liga, ao lado do romeno Gheorghe Muresan. Isso já seria suficiente para torná-lo um candidato ao estrelato, mas Wembanyama não para por aí. Alguém como ele não deveria ser tão habilidoso, pois atletas muitos grandes não têm bom controle de bola. O francês, contudo, a domina como se fosse um armador baixinho. Ele arremessa bem de longe, tem drible, velocidade e um estilo de jogo fluido. Em suma, faz de tudo em quadra, e isso é inédito e assustador.
Exagero? Não para quem conhece do riscado. “Ele é um alien”, definiu LeBron James, inventando um apelido que já pegou nos Estados Unidos. “O cara lembra um jogador que você cria no videogame, parece algum tipo de trapaça”, afirmou Stephen Curry, o arremessador de 3 pontos mais preciso de todos os tempos. “Acho que em 2045 todos os jogadores serão como ele”, disse Giannis Antetokounmpo, eleito por duas vezes o melhor jogador da NBA, reforçando a teoria de que, no futuro, os atletas serão ainda mais altos e ágeis. Se as declarações acima não forem suficientes para convencer os incrédulos, recomenda-se digitar “Victor Wembanyama highlights” no YouTube. É de cair o queixo.
Talentos assim não surgem por acaso. Wembanyama é filho de um saltador em distância da República Democrática do Congo e de uma jogadora de basquete da França. Ele foi preparado desde os 5 anos para brilhar nas quadras, e há quem diga que possa ter tomado hormônios de crescimento. Aos 15 anos, foi descoberto por olheiros da NBA. Os americanos forneceram nutricionista, preparador físico e agentes, que passaram a controlar a sua rotina com mão de ferro, gerenciando horas de sono e tempo gasto nas redes sociais. Apesar do assédio, ele quis permanecer na França até ter idade suficiente para jogar na NBA. Em maio, ocorre o sorteio do draft, o mecanismo que seleciona novatos para a liga profissional. Pelas regras americanas, os times de pior desempenho na temporada anterior têm prioridade na escolha dos talentos da nova geração — suspeita-se que algumas equipes perderam de propósito para ficarem mais próximas do craque. Faz sentido: estima-se que Wembanyama poderá adicionar 500 milhões de dólares em valor de mercado para a franquia que contratá-lo. Não há dúvida: o alien está pronto para fazer coisas de outro mundo nas quadras da NBA.
Publicado em VEJA de 3 de maio de 2023, edição nº 2839