Após duas semanas de jogos, e sob um constante pano de fundo político, a Olimpíada de Inverno de Pequim teve seu encerramento neste domingo, 20, em mais um teste para a projeção da China na arena internacional. Sob estrito controle sanitário, para evitar infecções pela Covid-19, o evento foi marcado por boicotes internacionais ao governo chinês e por um novo caso de doping envolvendo a Rússia, mas houve espaço para a glória e o fracasso de alguns dos maiores nomes dos esportes de inverno, e um esforço renovado por otimismo e união na cerimônia de despedida.
No estádio Ninho do Pássaro, construído para a Olimpíada de Pequim em 2008, o presidente da China, Xi Jinping, e o presidente do Comitê Olímpíco Internacional, Thomas Bach, ficaram lado a lado no evento para a passagem oficial do evento à organização de Milão-Cortina, que vão sediar os jogos de 2026. Bach classificou o evento como “extraordinário” e estendeu a mão ao governo chinês e parabenizou a organização “tão excelente e tão segura”.
Os jogos foram dominados pela saga da patinadora russa Kamila Valieva, de apenas 15 anos, que chegou a Pequim na condição de favorita na patinação artística. Seu time havia ganhado o ouro na disputa por equipes quando, no mesmo dia, um exame de doping identificou uma substância usada no tratamento de cardíacos e proibida na competição. O comitê de arbitragem a liberou para competir em provas individuais, mas ela não receberia medalhas até que a investigação do caso fosse concluída. A história terminou em anticlímax: mesmo favorita, ela terminou em quarto lugar após cair diversas vezes ao longo da prova.
Para os americanos, também houve marcas melancólicas. Lenda do snowboard, Shaun White terminou sua última Olimpíada de Inverno com um quarto lugar, a um ponto da medalha. Quatro anos atrás, na Coreia do Sul, um salto de 1.440 graus lhe rendeu sua terceira medalha olímpica de ouro. Aos 35 anos, porém, seu corpo não alcançou sua melhor performance e ele foi superado pelo japonês Ayumu Hirano. “Não estou triste”, resumiu White em sua despedida.
Um grande trunfo chinês veio com as vitórias de Eileen Gu, esquiadora nascida nos Estados Unidos que decidiu competir pela China, país natal de sua mãe. Suas três medalhas — dois ouros, uma prata — estabeleceram um novo recorde individual para o esqui, e Gu foi alçada à condição de celebridade na China.
A Olimpíada de Inverno em Pequim foi alvo de controvérsia desde o momento em que o Comitê Olímpico Internacional anunciou a capital chinesa como sede. A cidade de Almaty, o Cazaquistão, foi sua única concorrente na seleção — quatro cidades retiraram propostas por falta de apoio de moradores e capacidade de investimento.
A contagem de medalhas foi liderada pela Noruega, com 16 ouros. Na sequência, Alemanha, China e Estados Unidos seguiram no ranking pelo primeiro lugar do pódio.
A geopolítica atravessou diversos aspectos da realização dos jogos. Diversos países boicotaram o evento em protesto a violações de direitos humanos — especialmente a repressão contra uigures, minoria muçulmana que se concentra na província de Xinjiang, no noroeste da China. O presidente americano Joe Biden foi um dos líderes do boicote. O receio de uma invasão russa na Ucrânia só aumentou ao longo das semanas, com diplomatas americanos alertando que o governo de Vladimir Putin poderia lançar uma ofensiva militar mesmo antes do encerramento dos jogos.
Pequim, ao longo de duas semanas de evento, na prática foi dividida em duas cidades separadas. Atletas, delegações, funcionários e jornalistas ficaram isolados, sem permissão para circular fora dos locais dos jogos e hospedagem, uma espécie de “bolha olímpica” feita para evitar infecções pela Covid-19. Mas a mensagem que a propaganda oficial do governo chinês se esforçou para passar mirava a união: fogos de artifício mostraram, em inglês, a frase “um mundo” e diversas placas na cidade mostram o slogan olímpico “juntos por um futuro compartilhado”, em meio à pandemia global, que manteve a China praticamente fechada para visitantes, e ao crescimento das tensões com o Ocidente.