Encaixar a vida inteira em um par de malas, arrastá-las por estradas, atravessar fronteiras, fugir — são cenas comuns desde que a Rússia invadiu a Ucrânia, em fevereiro, forçando mais de 7 milhões de ucranianos ao exílio. Agora, contudo, quem corre para a diáspora são os russos. Milhares de homens com idade para o Exército, maiores de 18 anos, deixaram a Rússia depois que um resoluto Vladimir Putin anunciou, na semana passada, a mobilização de 300 000 reservistas para reforçar as linhas de frente. Estima-se que cerca de 260 000 cidadãos puseram o pé na estrada. A cada dia, 10 000 atravessam a fronteira com a Geórgia. Filas imensas de carros serpenteiam a caminho da Finlândia. Por quanto tempo Putin permitirá que as rotas de fuga permaneçam abertas, no entanto, é uma incógnita preocupante. O Kremlin despachou, na terça-feira 27, veículos blindados para as fronteiras. Enquanto isso, o autocrata procura escalar a ofensiva em outras frentes, depois de clamar vitória nos referendos em quatro regiões ucranianas ocupadas por forças russas — Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhia. As votações, consideradas ilegais pela comunidade internacional, indicavam suspeitíssimos índices de 95% de apoio à anexação do equivalente a 15% do território da Ucrânia. O ex-presidente Dmitri Medvedev resumiu a ideia, antes mesmo do anúncio oficial dos resultados: “Bem-vindos à Rússia”. Putin admite perder muitos homens e até alguma popularidade, mas a guerra, ao que tudo indica, ele quer continuar. Pior para o mundo.
Publicado em VEJA de 5 de outubro de 2022, edição nº 2809