Arábia Saudita anula penas de morte pelo assassinato de Jamal Khashoggi
Réus não identificados receberam de sete a 20 anos de prisão pela morte do jornalista; julgamento é criticado por grupos de direitos humanos e ONU
Um tribunal da Arábia Saudita anulou nesta segunda-feira, 7, cinco sentenças de morte pelo assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, crítico ao governo. Ao invés disso, cinco dos réus, não identificados, foram condenados a 20 anos de prisão, enquanto outros três receberam penas de sete a dez anos, segundo a mídia estatal.
O julgamento foi amplamente criticado por grupos de direitos humanos e por uma investigadora independente das Nações Unidas, Agnes Callamard, que enfatizou que nenhum funcionário de alto escalão ou suspeito de ordenar o assassinato foi considerado culpado. Além de questionar a independência do tribunal, ela chamou as sentenças de “paródia de justiça”.
#JamalKhashoggi: 1.The Saudi Prosecutor performed one more act today in this parody of justice. But these verdicts carry no legal or moral legitimacy. They came at the end of a process which was neither fair, nor just, or transparent. https://t.co/nt4n2CqS21
— Agnes Callamard (@AgnesCallamard) September 7, 2020
O novo veredito do tribunal na Arábia Saudita veio depois que o reino julgou 11 pessoas em dezembro, sentenciando cinco à morte e outras três a longas penas de prisão por encobrimento do crime.
O processo, contudo, concluiu que o assassinato não foi premeditado. Isso abriu caminho para Salah Khashoggi, um dos filhos do jornalista, anunciar em março que a família havia perdoado os envolvidos, o que permite a anulação da sentença de morte, de acordo com a lei islâmica.
Khashoggi desapareceu em outubro de 2018, durante uma visita ao consulado saudita em Istambul, na Turquia. Autoridades locais revelaram que ele foi assassinado dentro do consulado por uma equipe saudita, que teria esquartejado o jornalista para retirá-lo do local. O corpo nunca foi encontrado.
O jornalista, que escrevia artigos críticos ao governo saudita para o jornal americano The Washington Post, ficou exilado nos Estados Unidos por cerca de um ano. Ele deixou a Arábia Saudita quando o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman, conhecido pela sigla MBS, iniciou ataques a ativistas de direitos humanos, escritores e críticos da guerra do reino no Iêmen.
O envolvimento do príncipe Mohammed na ordem do assassinato permanece indefinido. Diversas agências de inteligência ocidentais indicaram que ele tinha conhecimento da operação e Callamard, a investigadora das Nações Unidas, encontrou “evidências críveis” de que o príncipe e outros altos funcionários eram os mandantes do assassinato. MBS nega qualquer envolvimento com a operação.
No Twitter, a noiva de Khashoggi, Hatice Cengiz, afirmou que a decisão do tribunal foi “um completo escárnio da justiça”.
Segundo a emissora de televisão árabe Al Jazeera, por deixar de investigar quem ordenou o crime, o julgamento foi contra os padrões de justiça, sendo reprovado pela comunidade internacional.
O assassinato de Khashoggi provocou uma reação mundial contra a Arábia Saudita e os laços com a Turquia se deterioraram, já que o jornalista era conhecido do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan.
Em março, promotores turcos acusaram 20 cidadãos sauditas pelo crime, incluindo dois ex-assessores do príncipe. De acordo com a acusação, o ex-vice-chefe de inteligência saudita, Ahmed al-Assiri, formou a equipe e planejou o assassinato.
Outros suspeitos são principalmente militares sauditas e autoridades de inteligência. Além disso, um médico forense foi indiciado por ter sido responsável por cortar o corpo em pedaços com uma serra de ossos.