Austrália inicia investigação sobre os incêndios florestais de 2019
Inquérito durará seis meses e tem como objetivo melhorar a resposta do país em futuras queimadas, que virão cada vez mais potentes
A Austrália começou nesta segunda-feira, 25, as primeiras audiências sobre os incêndios florestais que mataram 33 pessoas, destruíram milhões de hectares e ceifaram a vida de incontáveis animais. Segundo o primeiro-ministro, Scott Morrison, o inquérito busca preparar o país para a nova temporada do fogo e ver se há necessidade de alteração das leis para melhorar resposta a esse tipo de situação, uma vez que os incêndios tendem a ser cada vez piores.
“A perda trágica de vidas, a destruição de casas, a perda significante da vida selvagem e os milhões de hectares da floresta que foram devastados continuam a afetar duramente a recuperação das pessoas”, disse Mark Binksin, relator do inquérito, à emissora Al Jazzera.
O inquérito terá duração de seis meses. Nas próximas duas semanas serão ouvidos especialistas sobre o risco de desastres naturais e o desafio que a mudança climática impõe ao país.
Na primeira audiência, nesta segunda, o chefe da agência meteorológica do país, Karl Braganza, disse que este não é um evento único. “Na verdade, desde os incêndios de 2003, em Caberra, todas as juridições na Austrália testemunharam incêndios significantes que desafiaram a capacidade resposta, mas (os incêndios de 2019) realmente desafiaram nossa percepção sobre como era o clima que precedia esse período”.
Brangaza disse que as projeções climáticas e meteorológicas previram com precisão a intensidade dos incêndios e que, em meados de 2019, antes da temporada das chamas começar, ele tornou os relatórios disponíveis para o governo. A causa dos incêndios, cada vez mais graves no país, está na mudança climática.
Helen Cleugh, pesquisadora sênior da Organização de Pesquisa Científica e Industrial da Commonwealth (CSIRO), afirmou que a frequência de eventos meteorológicos no oceano Pacífico, como o El Niño e La Niña, no aumento da temperatura global irão intensificar os incêndios, que não poderão ser mitigados ou previstos, como no passado. “A mudança climática significa que o passado não é mais um guia para entender os impactos e riscos de eventos futuros relacionados ao clima”, afirmou.
Cleugh defendeu os modelos criados pelo CSIRO em 1992, que se demonstraram “muito consistentes” com as mudanças climáticas que ocorreram desde então. “O meu argumento é que essas projeções climáticas são críveis e salientes, e o mais importante: elas ainda se mostram atuais em 2020.”
Apesar de o governo ter sido munido de informação que mostrava a relação entre os incêndios e a mudança climática, o primeiro-ministro fez de tudo para mitigar o papel que a indústria de carvão do país, uma das maiores do mundo, teve nos incêndios florestais.
As cinzas das florestas que ardiam se estenderam por todo o Oceano Pacífico, seja tingindo o topo de geleiras na Nova Zelândia com uma cor de cobre ou aterrissando a Argentina, país que também recebia pelos ventos os restos da maior floresta tropical do mundo.
Não foram somente as matas australianas que queimaram em 2019, mas as amazônicas também. Puxada pelo desmatamento desenfreado, pelo garimpo ilegal e pela expansão agricola, o fogo na floresta atingiu repercussão internacional e preocupação em torno da negligência do Brasil, país que possui a maior porção da Amazônia em seu território, à crise climática.
O presidente Jair Bolsonaro é um notório negacionista da mudança climática, tanto que colocou na pasta do Meio Ambiente Ricardo Salles, recentemente expulso do partido NOVO. Durante a reunião ministerial de 24 de abril, divulgada pelo Supremo Tribunal Federal, Salles disse que era hora de aproveitar a cobertura da mídia focada na pandemia de Covid-19 e “ir passando a boiada”. Referia-se à adoção de regulamentacões de atividades econômicas na região das florestas.
Enquanto a Austrália se prepara para uma nova onda de incêndios cada vez mais intensos, o desmatamento da Amazônia brasileiro voltou a disparar em abril deste ano. Segundo dados do Instituto de Pesquisa Imazon, o desmate da floresta foi o maior em dez anos, atingindo uma área equivalente à da cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Uma coisa, no entanto, une os dois países: a temporada do fogo começa a partir do segundo semestre.