Buenos Aires: Um grito contra a violência
Em rara manifestação de união nacional, a Praça de Maio foi tomada por uma multidão chocada com atentado à vice-presidente Cristina Kirchner
Em rara manifestação de união nacional, a Praça de Maio, em Buenos Aires, foi tomada por uma multidão que gritava e portava cartazes contra “o ódio e a violência”, chocada com a inacreditável cena gravada em vídeo e divulgada em toda parte: um homem postou-se em frente à vice-presidente Cristina Kirchner, 69 anos, apontou uma pistola para seu rosto e puxou o gatilho. A arma falhou. A polícia prendeu Fernando Sabag Montiel, 35 anos, motorista de aplicativo nascido no Brasil e criado na Argentina — um “lobo solitário” cuja motivação é investigada. “Esse atentado merece o mais enérgico repúdio de toda a sociedade argentina”, disse o presidente Alberto Fernández, que decretou feriado e visitou Kirchner. Foi atendido: até Mauricio Macri, o principal rival do governo, e Javier Milei, o “Bolsonaro argentino”, se solidarizaram com a vice. O ataque ocorreu em um momento crítico da eterna crise do país. Fernández e Kirchner, em pé de guerra, não se falavam havia meses. No vazio de poder, a inflação deve chegar a 90% e a miséria se aprofunda. Enrolada em processos por corrupção e outros crimes, Kirchner é alvo do Ministério Público, que acaba de pedir doze anos de prisão por seus atos — foi aproveitando a presença diária de apoiadores em volta de seu prédio, em reação ao MP, que o atirador se aproximou dela. Em um gesto de maturidade cívica, os argentinos puseram os problemas de lado e foram às ruas colocar a paz e a democracia em seu merecido lugar, pelo menos por uma tarde.
Publicado em VEJA de 14 de setembro de 2022, edição nº 2806