Câmara dos Deputados dos EUA investigará corte de financiamento à OMS
Comitê de Relações Exteriores exigirá entrega de documentos pelo Departamento de Estado; valor suspenso ainda não foi informado pelo Congresso
O Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos iniciou nesta segunda-feira, 27, uma investigação sobre a suspensão do financiamento do país à Organização Mundial da Saúde (OMS). A medida foi anunciada pelo presidente americano, Donald Trump, no início de abril. O Departamento de Estado tem uma semana para fornecer informações sobre a decisão presidencial enquanto o país, que é o epicentro da pandemia da Covid-19, se aproxima de 1 milhão de casos confirmados da doença.
“Atacar a OMS, em vez do surto de Covid-19, só piorará uma situação já terrível”, escreveu o presidente do Comitê, o deputado democrata Eliot Engel, em uma carta aberta enviada nesta segunda ao secretário de Estado, Mike Pompeo.
Em todo o mundo, mais de 3 milhões de pessoas adoeceram e 210.500 morreram por causa da Covid-19, segundo a universidade americana Johns Hopkins. O jornal americano The New York Times estima que os Estados Unidos contabilizaram 977.000 casos da Covid-19 e 50.100 mortes, respondendo por cerca de 30% dos enfermos e quase 25% dos mortos.
Engel ainda acusou a justificativa do governo americano para suspender os fundos à OMS de ser “inadequada” e concluiu que “a Comissão de Relações Exteriores está determinada a entender as razões por trás dessa retirada autodestrutiva [dos Estados Unidos] da liderança global”.
O presidente do Comitê ainda pediu ao Departamento de Estado que fornecesse até o final da tarde da segunda-feira, 4, documentos relacionados à questão que tenham sido produzidos desde 1º de dezembro até esta segunda. Dentre os documentos demandados está “uma descrição completa das autoridades legais por meio das quais o governo pretende executar a suspensão de financiamento da OMS”. Também está a confirmação da data em que a medida entrará em vigor e a quantidade exata de financiamento a ser retida. Ainda não está claro nem para o Congresso americano se o corte será integral ou parcial.
Segundo a revista Forbes, com base em dados da OMS, os americanos são os que mais contribuem à OMS. Nos primeiros três meses de 2020, o governo americano investiu mais de 115 milhões de dólares (627 milhões de reais). O aporte americano responde por mais de 30% dos fundos dos dez maiores contribuintes da organização internacional nos primeiros três meses de 2020. Dentre estes está o Brasil, que deveria ter investido 14 milhões de dólares na organização.
Se o Departamento de Estado não produzir os documentos exigidos até o final da tarde de 4 de maio, Engel afirma que o Comitê considerará “todas as outras medidas à sua disposição para garantir a sua produção”, sem explicar quais seriam essas “medidas”. Como presidente de um Comitê da Câmara dos Deputados, Engel tem autoridade para emitir intimações a órgãos federais.
Com base em uma reportagem do portal de jornalismo investigativo ProPublica, Engel lembra que autoridades do próprio Departamento de Estado alertaram o governo sobre as consequências negativas da suspensão do financiamento americano à OMS.
Segundo relatório do próprio Departamento de Estado, o corte “impactará mais de 50 milhões de dólares em assistência americana” e “arrisca minar a narrativa dos Estados Unidos de ser uma liderança de longa data na área da saúde, cedendo espaço [à China]”. O Departamento de Estado não se manifestou em relação a esse relatório.
De fato, a China — que, com 57,4 milhões de dólares, foi o segundo país que mais contribuiu à OMS nos três primeiros meses de 2020 — anunciou na quinta-feira 23 que fornecerá 30 milhões de dólares adicionais à organização internacional.
‘China-centric’
Trump anunciou oficialmente a suspenção das contribuições americanas à OMS em 14 de abril, embora já ameaçasse tomar essa decisão havia uma semana. O presidente acusa a organização de ser ‘China-centric’, ou seja, centrada nos interesses do governo da China, liderado pelo presidente, Xi Jinping.
“A OMS realmente estragou tudo. Por alguma razão, financiada em grande parte pelos Estados Unidos, [a organização está] mas muito centrada na China. Vamos dar uma boa olhada nisso”, tuitou o presidente em 7 de abril.
Além disso, no mesmo dia, Trump afirmou que a organização “perdeu a oportunidade” e que “poderia ter alertado [da Covid-19] meses antes”, em referência à decisão da OMS de declarar emergência de saúde pública internacional, que é seu nível mais alto de alerta, somente em 30 de janeiro.
“Pensando em retrospectiva, acho que declaramos a emergência no momento certo e quando o mundo teve tempo suficiente para responder”, respondeu na quarta-feira 22 o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, para acrescentar que, naquela data, havia apenas 82 casos da Covid-19 fora da China e nenhuma morte. Adhanom ainda pediu ao governo americano que reconsiderasse o corte no financiamento.
(Com Reuters)