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Entenda a ‘solução de dois Estados’ para Israel e Palestina

Proposta foi feita pela primeira vez em 1937, mas nunca se transformou em realidade. Conflito entre Hamas e Israel pode complicar ainda mais as coisas

Por Paula Freitas
18 out 2023, 08h00
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  • Entre idas e vindas de conflitos no Oriente Médio, a questão palestina ora vem à superfície, ora é jogada para baixo do tapete. Pelo menos desde 2014 até o dia 6 de outubro deste ano, o assunto foi relegado ao status de nota de rodapé na geopolítica global. Com a eclosão da guerra entre Israel e o grupo terrorista palestino Hamas, iniciada em 7 de outubro, porém, a causa por um Estado da Palestina voltou à tona – mas sua concretização parece ainda mais distante após 11 dias de combates.

    A famosa “solução de dois Estados”, que propõe dividir o território ocupado por judeus e palestinos no Oriente Médio em dois, vem de longe. O ano era 1937, durante o Mandato Britânico da Palestina, quando a chamada “Comissão Peel” realizou cem entrevistas com membros de ambos os grupos, e chegou à conclusão de que estava diante de um “conflito intransponível”.

    Segundo a comissão, conceitos vitais, como suas identidades e desejos para o futuro da nação, apresentavam tão profundas diferenças que o convívio em sociedade seria impraticável – e, portanto, seria preciso separá-los.

    Sem avanços na questão, uma década depois, foi a vez da Assembleia Geral das Nações Unidas reforçar a proposta. Inicialmente, o plano previa a definição de fronteiras entre Israel e Palestina. Além disso, estabelecia uma divisão não só entre o Estado judeu e o Estado árabe, mas também criava um enclave árabe na área ocupada por judeus (cidade de Jaffa) e em Jerusalém, que seria comandada por um conselho internacional das Nações Unidas. A proposta não foi aprovada nem por árabes palestinos, nem pelos governos árabes do Oriente Médio.

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    Um ano depois, a guerra de 1948, que resultou na criação de Israel, também tolheu o avanço da proposta. Mais de 700 mil palestinos foram forçados a deixar suas casas, em um fenômeno chamado regionalmente de “Nakba” (traduzido como “catástrofe”, em português).

    O intenso êxodo rendeu a inclusão dos árabes no Estatuto de Refugiados das Nações Unidas, definindo-os como pessoas “cujo local de residência normal era a Palestina durante o período de 1 de Junho de 1946 a 15 de Maio de 1948, e que perderam a casa e os meios de subsistência.”

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    Após a “catástrofe” e, dezenove anos mais tarde, da Guerra dos Seis Dias de 1967 – conflito que envolveu Israel e os países árabes Síria, Egito, Jordânia e Iraque, apoiados pelo Kuwait, Arábia Saudita, Argélia e Sudão –, surgiram dois paradigmas entre os palestinos. O primeiro prega que os limites das fronteiras de Israel deveriam respeitar o mapa antes da Guerra dos Seis Dias, que teve como resultado a ocupação de Tel Aviv em Jerusalém Oriental, Cisjordânia e Gaza.

    Como consequência, cerca de 600 mil  israelenses passaram a habitar os dois primeiros territórios – uma ocupação ilegal segundo as normas do Direito Internacional. Cerca de 5,9 milhões de palestinos desejam retornar ao que consideram como sua terra natal, retirando os residentes judeus, número que demandaria ainda a realocação de parte deles para o território israelense.

    Já o segundo paradigma, de 1948, ao qual o Hamas adere – embora tenha afirmado em uma carta de 2017 que aceitaria um Estado da Palestina com base nas fronteiras de 1967 –, apresenta Israel, sob qualquer forma, como uma entidade criminosa que não deveria existir, e deveria ser substituída por um Estado islamista palestiniano. A radicalização pode minar a solução de dois Estados, porque cada um deseja exterminar o outro.

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    Ambos os lados, além disso, reivindicam Jerusalém, cidade considerada sagrada no judaísmo, islamismo e cristianismo. Nos últimos anos, foram registrados embates violentos entre a polícia israelense e os fiéis palestinos.

    O governo ultradireitista do premiê israelense, Benjamin Netanyahu, afirma que Jerusalém é a sua “capital indivisa”, sendo sede do parlamento israelense, o Knesset. A posição oficial, contudo, é que Israel apoia uma solução de dois Estados caso isso inclua a desmilitarização da Palestina, sob a compreensão de que o Hamas e outras organizações radicais representariam uma ameaça existencial.

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    O Movimento de Libertação Nacional Palestino (Fatah) e a Autoridade Palestiniana, que governa a Cisjordânia, apoiam a solução – mas desde que sejam permitidas a manter seus exércitos.

    Apesar das negociações, que incluíram a assinatura dos Acordos de Oslo, em 1993, os constantes embates políticos e religiosos na área impossibilitaram novos avanços. Uma uma pesquisa conduzida pelo instituto Pew Research neste ano apontou que apenas 35% dos israelenses pensam que a coexistência pacífica é possível – uma queda de 15 pontos percentuais em relação a uma década atrás.

    O ceticismo é compartilhado pelos palestinos: 67% deles se opõem à solução de dois Estados, citando a expansão dos assentamentos judeus na Cisjordânia como uma das principais razões.

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    Embora as Nações Unidas e a comunidade internacional tenham condenado a expansão israelense na Cisjordânia, nenhuma forma de dissuasão foi implementada contra Israel – os Estados Unidos, por exemplo, apoiam Netanyahu. Não há nenhuma iniciativa de paz entre judeus e palestinos desde 2014, quando o então secretário de Estado americano, John Kerry, abandonou a mesa de negociações.

    A comunidade internacional limitou seu envolvimento no assunto ao expressar apoio nominal a uma solução de dois Estados, sem qualquer plano para implementá-la. Os mais recentes esforços geopolíticos no Oriente Médio concentraram-se quase somente nos Acordos de Abraão, pactos sobre a normalização das relações árabe-israelenses entre Israel e os Emirados Árabes e Bahrein. Avanços bem-vindos, mas que produziram uma miragem de que a paz na região é possível sem chegar a um acordo com os palestinos.

    Esse mito agora foi destruído com a nova guerra entre Israel e Hamas.

    A história do Oriente Médio ensina que, em crises desta magnitude, avanços políticos não são impossíveis. A Guerra de Outubro de 1973, por exemplo, levou à paz entre o Egito e Israel. A primeira intifada, seguida pela primeira Guerra do Golfo, levou à Conferência de Paz de Madri.

    No entanto, com um governo israelense radical que não tem interesse em meios termos de um lado, e uma liderança palestina ineficaz que foi ainda mais enfraquecida pelos ataques do outro, as estrelas não estão alinhadas para uma iniciativa política de paz. A guerra que já deixou mais de 4 mil mortos em ambos os lados torna-se mais um obstáculo, e dos grandes, para a almejada solução de dois Estados e a resolução da questão palestina.

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