Ex-advogado chama Trump de ‘racista’, ‘vigarista’ e uma ‘farsa’
Michael Cohen dirá que presenciou conversas do presidente americano discutindo o vazamento de dados de Hillary Clinton durante a campanha de 2016
Michael Cohen, o ex-advogado do presidente Donald Trump, divulgou à imprensa a íntegra do testemunho que dará à Câmara dos Deputados dos Estados Unidos nesta quarta-feira, 27. No documento, ele acusa o líder americano de ser “racista”, “vigarista” e uma “farsa”. Cohen também afirmará que Trump sabia com antecedência das conversas de um dos seus conselheiros com o WikiLeaks durante a corrida eleitoral de 2016. À época, o site vazou dados da candidata democrata Hillary Clinton.
“Em julho de 2016, dias antes da convenção democrata, eu estava no escritório do sr. Trump quando a secretária anunciou que Roger Stone estava ao telefone. Trump colocou o Sr. Stone no viva-voz”, detalhará Cohen, “Stone disse a ele que havia acabado de conversar com Julian Assange e que Assange contou que, dentro de alguns dias, haveria a publicação de vários emails prejudiciais à campanha de Hillary Clinton.” A divulgação dos dados gerou um escândalo que minou a candidatura da democrata e foi explorado pela campanha de Trump.
As declarações de Cohen também incluem a acusação mais contundente até o momento de uma coligação entre a campanha do republicano e os interesses da Rússia. No discurso, o ex-advogado volta a sugerir que o presidente o instruiu a mentir para o Congresso sobre o possível acordo com Moscou para a construção de uma Trump Tower na cidade. “De sua forma, ele estava me orientando a mentir. Ele não me disse diretamente para fazer isso, mas só porque não é assim que ele opera”, explicará.
Em um primeiro momento, o antigo funcionário do presidente alegou que as negociações sobre o arranha-céu foram interrompidas em janeiro de 2016 mas, na verdade, elas se prolongaram até junho daquele ano. “Em conversas durante a campanha, ao mesmo tempo em que eu negociava ativamente com a Rússia para ele, Trump olhava em meus olhos e me dizia que não haviam negócios com os russos e depois mentia para o povo americano repetindo a mesma coisa”, afirma Cohen no depoimento.
Durante viagem a Hanoi, no Vietnã, onde se encontrará com o ditador norte-coreano Kim Jong-un, o presidente americano respondeu às falas de seu antigo aliado.
“Michael Cohen foi um dos muitos advogados que me representou (infelizmente). Ele também tinha outros clientes”, escreveu Trump em sua conta no Twitter, “sua licença para advogar foi revogada pela Suprema Corte por mentiras e fraude. Ele fez coisas ruins não relacionadas a Trump. Ele está mentindo em uma tentativa de reduzir seu tempo de prisão”, concluiu o presidente.
Se forem comprovadas, as acusações de que Trump também participou das negociações do arranha-céu durante sua campanha envolverão o presidente em um caso de provável conflito de interesses. O republicano já negou diversas vezes qualquer envolvimento com Moscou.
Cohen dará seu testemunho ao Congresso um dia depois de ser interrogado pelo Comitê de Inteligência do Senado, na primeira de suas três aparições no Legislativo programadas para esta semana. O ex-advogado, que em ocasiões anteriores disse que “tomaria um tiro” por Trump, agora investe em declarações contra o antigo chefe.
Ele ainda criticará os posicionamentos sociais de Trump, que está investido na construção do muro na fronteira com o México, dizendo ao comitê da Câmara que o presidente é um “racista”. “O país tem visto o sr. Trump agradar supremacistas brancos e intolerantes. Vocês o ouviram falar que os países mais pobres são ‘espeluncas’. Em particular, ele é ainda pior.”
Ao testemunhar sob o risco de cometer perjúrio, Cohen deve ser recepcionado de maneira cética pelos republicanos, que relembrarão o histórico de desonestidade do ex-funcionário do presidente. A porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, já publicou uma nota às vésperas do discurso, relembrando que o ex-advogado “irá para a prisão por mentir para o Congresso e fazer outras alegações falsas.”
Sanders ainda disse que é “hilário como alguém pode acreditar nas palavras de um mentiroso condenado e ainda dar outra oportunidade para que ele espalhe suas inverdades.” Cohen foi sentenciado a 36 meses de prisão em dezembro do ano passado por crimes que incluem as mentiras para o Congresso sobre os negócios de Trump e o intermédio de pagamentos ilegais a supostas amantes do presidente. Ele deve se apresentar no próximo dia 6 de maio para começar a cumprir a pena, segundo a ordem de um juiz federal.
Além das declarações sobre a campanha presidencial, o ex-advogado mencionou detalhes ocultos da vida pessoal de Trump. O político teria fraudado um laudo médico para escapar do serviço militar obrigatório e ainda se gabou da manobra em conversa com o funcionário. Segundo Cohen, o republicano afirmou que “não era burro” e que “jamais iria para o Vietnã”, se referindo à guerra com o país asiático.
Além disso, o presidente também esconderia outras informações de sua juventude e ameaçou as escolas e faculdades em que estudou para que elas nunca publicassem seu histórico escolar. Em sua confissão de culpa, Cohen afirmou que fez “essas afirmações incorretas para manter-se fiel às mensagens políticas do ‘Indivíduo 1’ e por lealdade a ele.” Indivíduo 1 é um codinome do presidente americano.
A semana de acareações com Cohen acontece ao mesmo tempo em que a maioria democrata da Câmara lança diversas investigações sobre os laços entre Trump e a Rússia. O Senado também conduz um inquérito paralelo.