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O golpe que derrubou al-Bashir, ditador sudanês por trinta anos, reflete os ares de mudança que estão levando insatisfeitos às ruas no norte da África

Por Thais Navarro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 16h32 - Publicado em 19 abr 2019, 07h00

Em frente ao quartel-general de Cartum, capital do Sudão, uma multidão não para de protestar contra os rumos que a política do país está tomando. Para quem esteve três décadas sob o comando de um mesmo ditador, os sudaneses passaram, na última semana, por uma experiência inigualável: em apenas dois dias, tiveram três líderes. Na quinta 11, o ditador Omar al­-Bashir foi deposto por meio de um golpe militar. Quem anunciou e tomou seu lugar, em um pronunciamento pela TV, foi o ministro da Defesa, Awad Ibn Auf. No dia seguinte, ele renunciou e deu lugar ao general Abdel Fattah.

Depois de quatro meses de manifestações que começaram assim que o governo triplicou o preço do pão — em um país que já se afundava em inflação —, os militares derrubaram al­-Bashir e anunciaram um período de transição de dois anos para o retorno de um governo civil. Só que os sudaneses, definitivamente, não estão satisfeitos: eles exigem esse novo governo imediatamente. “O que queremos é uma pacífica e incondicional entrega de poder do regime”, disse a VEJA Sara Abduljaleel, uma das porta-vozes da SPA (Associação dos Profissionais Sudaneses), principal grupo opositor presente no levante popular.

Além da mudança na configuração do poder, as manifestações pedem justiça para al-Bashir: ele é acusado de genocídio e crimes contra a humanidade na região de Darfur cometidos nos anos 2000, com estimados assustadores 300 000 mortos. Quase uma semana depois de deposto, o ditador foi transferido para a temida prisão de segurança máxima de Kober, conhecida por seus enforcamentos.

Na terça 16, a União Africana, bloco que reúne todos os países do continente, deu um ultimato de quinze dias para que fosse estabelecido um governo civil ou o Sudão seria expulso da organização. Mergulhado na crise política, o país ainda sente na pele os efeitos da inflação que resultou nos protestos: agora, ela está em 44% ao ano. O desemprego também atinge os dois dígitos.

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Nas ruas, ecoam palavras de ordem como “liberdade” e “revolução”. Elas lembram a Primavera Árabe, quando uma onda de protestos contra regimes autoritários varreu o Oriente Médio e o norte da África. O Sudão não está sozinho. Na Líbia, o general Khalifa Haftar continua com uma ofensiva contra o governo oficial. No Marrocos, há grandes protestos contra a condenação de ativistas. Na Argélia, o presidente Abdelaziz Bouteflika renunciou depois de vinte anos no governo, por pressão popular. O poder do povo surge, de novo, com força, ampliado pelas incontornáveis redes sociais.

Publicado em VEJA de 24 de abril de 2019, edição nº 2631

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