Os constantes massacres nos Estados Unidos têm levado os americanos a tentar resolver o problema da violência armada no país. Desde o último grande massacre em uma escola –a Marjory Stoneman Douglas High School, em Parkland, na Flórida, em 14 de fevereiro– estudantes de todas idades têm se manifestado e exigido legislação mais rigorosa para o acesso a armas. Dificultando a tarefa de pelo menos prevenir novos incidentes desse tipo está o fato de não haver um perfil único e específico dos agressores que cometem esse tipo de ato. Há, contudo, uma característica prevalente entre os assassinos em massa: em sua grande maioria eles são homens.
Dos 95 tiroteios cometidos nos Estados Unidos entre 1982 e 2017, 92 foram executados por criminosos do sexo masculino, segundo levantamento da imprensa americana. Entre os três casos orquestrados por mulheres, está um em que marido e mulher agiram em conjunto, no ataque de San Bernardino, em dezembro de 2015.
Ao contrário do que muitos acreditam, não há conexões diretas comprovadas entre pessoas com transtornos mentais diagnosticados e crimes violentos, de acordo com especialistas. Na verdade, 23% das mulheres americanas possuem algum tipo de transtorno, em comparação com apenas 16,8% dos homens.
“Os homens são responsáveis por muito mais crimes violentos do que as mulheres. Isso é verdade em todo o mundo e ao longo da história”, afirma o professor de criminologia e estatística da Universidade da Pensilvânia, Richard Berk. Porém, segundo o psicólogo e sociólogo, ainda é difícil explicar essa maior predisposição masculina à violência.
Há quem diga que a tendência está relacionada às diferenças hormonais, principalmente com a quantidade de testosterona, que pode influenciar comportamentos agressivos quando em excesso. “Outros especialistas se concentraram no desenvolvimento mais lento do lobo frontal masculino, o que torna os jovens mais impulsivos”, diz Berk.
Porém, muitos estudiosos acreditam que o comportamento criminoso não pode ser explicado apenas biologicamente, mas como resultado de uma combinação entre a natureza e a forma como um indivíduo é criado, assim como suas experiências de vida.
Nos Estados Unidos, a maioria dos homens que cometeram assassinatos em massa o fizeram como reação a um evento trágico ou marcante em suas vidas, como o fim de um relacionamento ou a perda de um emprego. Em alguns casos, inclusive, orquestraram seus crimes como forma de provar algo à sociedade ou se vingar.
São homens que não sabiam lidar com perdas ou com sua própria falta de autoestima. “Os homens têm sua personalidade mais ligada a estruturas como trabalho e casamento e, por isso, quando essas coisas acabam, possuem menos recursos psicológicos para superar”, diz David Wilson, professor de criminologia da Birmingham City University.
É o caso de Elliot Rodger, que em 2014 matou seis pessoas na Universidade da Califórnia, em Santa Barbara, antes de se suicidar – tudo porque se sentia rejeitado pelas mulheres. O atirador explicou claramente seus motivos em um vídeo feito antes do crime: “Vocês garotas nunca me acharam atraente (…) eu não sei o que vocês não veem em mim, eu sou o cara perfeito e vocês se atiram para todos esses caras desagradáveis em vez de mim, o cavalheiro supremo. Eu vou punir todos vocês por isso”, afirmou.
Nas décadas de 70 a 90, casos de tiroteios em massa em agências de correio dominavam o noticiário americano. Na maioria dos cenários, os ataques foram executados por ex-funcionários ou empregados homens que estavam insatisfeitos com sua atual situação ou guardavam rancor de colegas. Muitos outros massacres em ambientes de trabalho se seguiram e ainda são comuns nos Estados Unidos atualmente.
Comportamento violento com parceiras e antecedentes de violência doméstica também são comumente observados em assassinos em massa. Segundo uma pesquisa do grupo de controle às armas Everytown for Gun Safety, 57% dos tiroteios entre 2009 e 2015 tinham pelo menos uma esposa, ex-esposa ou algum outro membro da família do atirador entre as vítimas.
Nikolas Cruz, o atirador de 19 anos que invadiu a escola em Parkland, na Flórida, e matou dezessete pessoas pode se encaixar nesse perfil. Segundo as primeiras informações que surgiram da investigação sobre o caso, o adolescente foi expulso do colégio depois de brigar com o novo companheiro de sua ex-namorado. Colegas relataram que Cruz era bastante abusivo com a menina, a ameaçava e perseguia depois das aulas.
O adolescente comprou uma metralhadora AR-15 (versão civil do fuzil M16) legalmente, em uma loja na cidade de Coral Springs. O rifle foi usado para disparar centenas de vezes contra seus colegas. A escolha de uma arma de fogo como instrumento do massacre também não é coincidência. Homens tendem a ter mais acesso a armas e a treinamentos para usá-las corretamente do que mulheres. São incentivados a admirar personagens do cinema com armamentos.
Para David Wilson, isso é um fenômeno cultural, porém não exclusivo dos americanos. A grande diferença é que, em partes dos Estados Unidos – como a Flórida, onde com apenas 18 anos um jovem já pode adquirir um rifle de cano longo– é tão fácil comprar uma arma que o artefato já está disponível até mesmo on-line.