Irã permite inspeção da ONU a instalações nucleares, mas nega cooperação plena
Fiscalização da AIEA foi suspensa por Teerã após bombardeios israelenses e americanos durante guerra aérea em junho

Pela primeira vez desde os ataques de Israel e dos Estados Unidos ao Irã, em junho, inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), órgão de fiscalização nuclear das Nações Unidas, retornaram ao país para supervisionar atividades nucleares. A informação foi confirmada nesta quarta-feira, 27, pela mídia estatal de Teerã, que destacou a presença da equipe na troca de combustível da usina de Bushehr — poupada dos recentes bombardeios.
Segundo a agência de notícias estatal ICANA, o ministro das Relações Exteriores, Abbas Araqchi, afirmou, no entanto, que ainda não há acordo para a retomada plena da cooperação iraniana com a agência. “Ainda não foi aprovado nenhum texto final sobre o novo quadro de cooperação com a AIEA e opiniões estão sendo trocadas”, disse o chanceler. Por ora, ele ressaltou que “a troca de combustível do reator nuclear de Bushehr deve ser feita sob a supervisão de inspetores da agência internacional”.
O diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, também se pronunciou. Em entrevista à Fox News na terça-feira 26, a autoridade declarou que “a primeira equipe de inspetores está de volta ao Irã”, mas também enfatizou que as negociações para restabelecer o monitoramento ainda estão em andamento.
Briga com a AIEA
Teerã afirmou que suspendeu a cooperação com a AIEA em protesto contra o silêncio da AIEA diante dos ataques americanos e israelenses de junho. Na ocasião, Israel lançou mísseis contra instalações nucleares iranianas sob a justificativa de que o país desenvolvia armas atômicas. O episódio desencadeou uma guerra aérea sem precedentes de 12 dias, marcada por ataques retaliatórios iranianos contra cidades israelenses. Nos últimos dias da escalada, os Estados Unidos também bombardearam três complexos nucleares iranianos.
Teerã acusou a AIEA de dar a Israel um pretexto para agir ao publicar, pouco antes da ofensiva, um relatório que apontava falhas por parte de autoridades iranianas no cumprimento das salvaguardas do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), que foi criado para impedir a disseminação de armas nucleares por meio de inspeções rigorosas de instalações nucleares.
O ataque israelense ocorreu um dia antes de uma rodada de negociações entre Washington e Teerã sobre o futuro do programa nuclear iraniano — que, por óbvio, foi cancelada. Desde então, os diálogos permanecem suspensos, sem qualquer cronograma para retomada.
Sanções à vista
O retorno dos inspetores acontece em paralelo às conversas em Genebra entre o Irã e o grupo E3 — formado por França, Reino Unido e Alemanha —, que buscam reativar os termos do acordo nuclear de 2015. O pacto, assinado entre os iranianos e nações do Conselho de Segurança das Nações Unidas (mais Alemanha), que encerrou as sanções econômicas ao país em troca de restrições ao seu programa nuclear e a permissão de que a AIEA fizesse fiscalizações regulares.
No entanto, antes da ofensiva iniciada em 13 de junho, Teerã havia acumulado uma quantidade relevante de urânio com até 60% de pureza — muito próximo dos 90% necessários para a produção de armas nucleares, embora ainda fosse necessário mais tempo para a produção de uma bomba funcional. Para as potências ocidentais, o Irã tenta encobrir um projeto com fins bélicos; o país nega, sustentando que seu programa nuclear tem apenas fins civis, para produção energética.
A relutância de Teerã em aceitar a fiscalização plena da AIEA pode levar Paris, Londres e Berlim a acionar o mecanismo de “snapback”, que permite restabelecer automaticamente as sanções internacionais interrompidas em 2015, sem risco de veto no Conselho de Segurança.