Justiça chilena condena seguidores de Pinochet pela morte de ex-presidente
Investigação do envenenamento de Eduardo Frei Montalva, presidente nos anos 1960, arrastou-se por 19 anos; caso é uma das feridas da ditadura
A Justiça do Chile condenou nesta quarta-feira, 30, seis colaboradores da ditadura militar de Augusto Pinochet pelo assassinato do ex-presidente Eduardo Frei Montalva, em janeiro de 1982. Os réus foram condenados a penas que variam de três e 10 anos de prisão por responsabilidade pelo crime.
Ao final de mais de 19 anos de investigação, o juiz Alejandro Madrid apresentou suas argumentações sobre o crime e seus responsáveis em um relatório de 810 páginas. Os condenados, entre os quais o médico Patricio Silva Garín, foram acusados por “homicídio simples por envenenamento após uma intervenção cirúrgica”.
Presidente do Chile entre 1964 e 1970, Frei fora internado na clínica Santa María, em Santiago, em 22 de janeiro de 1982, para ser submetido a uma cirurgia de hérnia de hiato. Na época, o país vivia sob a ditadura de Augusto Pinochet. Frei era um dos líderes do Partido Democracia Cristã, de direita, e fora opositor ao governo de Salvador Allende, derrubado em 1973 pelo golpe de Estado liderado por Pinochet.
Mas, desde 1980, liderava uma campanha de oposição à ratificação da nova Constituição escrita pelo regime e se consolidava como uma das vozes em favor da democracia. A ditadura militar de Pinochet matou mais de 3.200 mortos e torturou 38.000, segundo dados oficiais.
O juiz Madrid condenou o médico Patricio Silva Garín à pena efetiva de 10 anos de prisão como autor do homicídio. Ele liderou uma operação para fornecer veneno a Frei. Outro médico, Pedro Valdivia, foi condenado a cinco anos de prisão como cúmplice do homicídio.
Luis Becerra Arancibia, motorista pessoal do presidente e informante da Inteligência da ditadura, e Raúl Lillo Gutiérrez, agente civil da Central Nacional de Inteligência (CNI), pegaram sete anos de prisão na condição de coautores do crime. Os agentes forenses Helmar Rosenberg e Sergio González acobertaram o assassinato e terão de cumprir três anos de prisão.
A investigação das causas da morte foi motivada especialmente pela filha do ex-presidente, a ex-senadora Carmen Frei, segundo o jornal chileno La Tercera. “O regime decidiu que teria de eliminá-lo e pôs em marcha uma trama premeditada, na qual atuaram muitas pessoas com propósitos definidos”, afirmou ela, depois de lida a sentença. “Nada do que ocorreu em torno da morte do meu pai foi acidental ou fruto de azar.”
A condenação dos seis envolvidos no crime foi comemorada pelos principais líderes políticos chilenos. O ex-presidente Ricardo Lagos afirmou ser hoje um “dia histórico para a Justiça do Chile”.
“Pode haver divergências na política e na forma de se entender as tarefas do Chile no futuro, mas nunca o assassinato pode ser opção diante da impossibilidade de se entender”, afirmou. “Durante seis anos, não compartilhei as posições do presidente Frei. Logo, entendemos que, talvez por causa dessa divisão, o Chile caiu nessa longa noite”, completou, referindo-se à ditadura.
O atual presidente chileno, Sebastián Piñera, afirmou que fizera o processo de investigação sobre a morte de Frei caminhar em seu governo anterior (2010-2014). “No nosso país, a busca da verdade, a busca pela Justiça, é algo que não faz bem apenas à família do presidente Frei, mas à alma do nosso país”, disse Piñera.