Endossando críticas feitas pelo Itamaraty nas Nações Unidas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou nesta terça-feira, 31, a dificuldade de alcançar um cessar-fogo no conflito entre Israel e o grupo militante palestino Hamas. Segundo Lula, “ninguém assume a responsabilidade e nem conseguimos fazer uma carta na ONU convencendo o cessar-fogo”.
Em publicação nas redes sociais, o petista disse ficar “triste ao ver 3 mil crianças morrerem na Faixa de Gaza numa guerra que elas não reivindicaram”.
+ Vieira critica impasse do Conselho de Segurança, que não vota resolução
“E os irresponsáveis que fizeram a guerra agora estão chorando a morte dessas crianças? Sentindo o peso das coisas? Estamos vendo, pela primeira vez, uma guerra em que a maioria dos mortos são crianças”, disse.
Na segunda-feira, o representante do Brasil no Conselho de Segurança das Nações Unidas, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, fez duras críticas à demora do colegiado em aprovar uma resolução sobre o conflito. Segundo ele, alguns países usam o Conselho para atingir objetivos pessoais, e não o de proteger os civis do Oriente Médio.
“Desde o dia 7 de outubro, nos reunimos várias vezes e votamos quatro propostas de resolução. No entanto, continuamos com um impasse, devido a um desentendimento interno, particularmente entre membros permanentes e graças ao persistente uso do conselho para atingir seus próprios propósitos em vez de colocar a proteção de civis acima de tudo”, disse. “Todos estão vendo nossa incapacidade de nos unir e responder a uma crise que nos desafia”, acrescentou.
A reunião de emergência de segunda-feira terminou sem que o Conselho colocasse uma resolução em votação. As negociações continuam nos bastidores.
O Brasil presidiu o conselho neste mês de outubro e tentou costurar a aprovação de uma resolução por vários dias, ouvindo diversos países. Mas, no dia 18, ao submeter o texto à votação, ele acabou vetado pelos Estados Unidos, um dos membros permanentes.
O Conselho de Segurança da ONU tem cinco membros permanentes: China, França, Rússia, Reino Unido e os Estados Unidos. Os demais compõem o conselho rotativo. Para que uma resolução seja aprovada, é preciso o apoio de nove do total de 15 membros, sendo que nenhum dos membros permanentes pode vetar o texto. Além da proposta apresentada pelo Brasil, os Estados Unidos apresentaram sua versão de resolução, vetada pela Rússia. Os russos, por sua vez, tiveram suas duas propostas vetadas pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido.
As várias tentativas infrutíferas de apresentar um posicionamento comum deram combustível às críticas de Vieira. Ele presidia a reunião, mas, antes de ler seu discurso “seguindo as orientações do presidente Lula”, pediu licença aos colegas e falou como chanceler brasileiro.
“Desde a última vez que eu falei a este Conselho, na semana passada, a contagem de mortes de crianças aumentou em mil. Enquanto isso, o Conselho de Segurança realiza reuniões e ouve discursos, sem ser capaz de tomar uma decisão fundamental: acabar com o sofrimento humano”, disse. Segundo ele, o conselho tem falhado reunião após reunião em colocar as vidas dos civis como prioridade.
“Enquanto milhares de israelenses e palestinos choram seus entes queridos, enquanto israelenses agonizam diante do destino dos reféns, enquanto Gaza sofre diante da implacável operação militar que está matando civis, incluindo um intolerável número de crianças, nós temos meios de fazer algo e ainda, repetidamente, falhamos”.
Em discurso direto e com tom crítico, Vieira também pediu pelo fim das hostilidades e pelo acesso de atendimento médico às vítimas civis na Faixa de Gaza. Ele destacou que, em três semanas de conflito, já são contabilizados 8 mil mortos, sendo 3 mil crianças. Em certo ponto de seu discurso, o chanceler citou o Hamas como o responsável por reacender a crise na região com “ações terroristas”.
Ele acrescentou que ainda pode haver tempo para o Conselho de Segurança se posicionar do lado dos civis e contra as hostilidades na região. “Se não agora, quando? Quantas vidas mais serão perdidas até nós finalmente nos sairmos da retórica para a ação?”, finalizou.
O conselho tem testemunhado nas últimas semanas uma disputa entre Estados Unidos e Rússia por um protagonismo no discurso. Enquanto os norte-americanos, apoiados pelo Reino Unido, exigem uma resolução que garanta a Israel, aliado de ambos, o direito de responder aos ataques sofridos, a Rússia propõe um cessar-fogo, mas não cita o Hamas.
Os russos tampouco condenam o grupo islâmico pelas ações que deram início ao mais recente capítulo no conflito histórico pela região.
Como ambos têm poder de veto, sempre há o posicionamento de um contra a resolução apoiada pelo outro. Na resolução apresentada pelo Brasil, e que teve uma maior expectativa de aprovação, a Rússia apenas se absteve. Nesse caso, coube aos Estados Unidos a derrubada do texto.