O relatório anual sobre machismo e sexismo na França, feito pela High Authority on Equality (HCE), um órgão consultivo, alertou nesta segunda-feira, 23, que a misoginia no país chegou a níveis “alarmantes” e a situação atual tem piorado e prejudicado, principalmente, mulheres mais jovens.
De acordo com o estudo, atualmente, as mulheres são alvos de novas formas de assédios, incluindo abusos pela internet, agressões verbais e pornografia com conteúdo “bárbaro”.
“Uma situação que se agrava com novos fenômenos: a violência online, o aumento da virulência nas redes sociais, a barbárie em muitas produções da indústria pornográfica e a afirmação de uma indústria pornográfica antifeminista”, declarou o estudo.
Após consultar 2.500 pessoas, a pesquisa descobriu que o comportamento machista tem aumentado em “todas as esferas” e que diversos homens acreditam que o comportamento violento e discriminatório é “aceitável” dentro da sociedade.
Segundo o relatório, na maioria das vezes, são homens mais velhos que perpetuam atitudes conservadoras em relação aos papéis de gêneros na sociedade. Entre os jovens, é menos comum ver comportamentos machistas e agressivos.
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O relatório também detectou uma “reação” masculina em toda a sociedade francesa ao movimento #MeToo, que recebe ataques machistas nas redes sociais com objetivo de “reduzir as mulheres ao silêncio ou desacreditá-las”.
O movimento começou a se espalhar em 2017, quando a atriz americana Alyssa Milano publicou, no Twitter, uma mensagem que incentivava as mulheres que sofreram assédio sexual a utilizar a hashtag e compartilhar seu relato. Desde então, a causa se alastrou para diversos países e colocou à tona estupros e abusos sexuais dentro de Hollywood. Entre eles, o mais notório é o do produtor de cinema Harvey Weinstein, que foi acusado de agressão sexual por diversas mulheres.
Apesar da maioria das pessoas estarem cientes da importância do #MeToo para combater a violência e discriminação, o estudo diz que os “preconceitos e estereótipos de gênero, clichês sexistas e sexismo cotidiano ainda são comuns”.
“As pessoas reconhecem e deploram a existência do sexismo, mas não conseguem rejeitá-lo na prática, fenômeno particularmente difundido entre os homens questionados. Essa lacuna entre percepção e prática tem consequências tangíveis em termos de violência simbólica, física, sexual e econômica”, afirma o relatório
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A pesquisa entrevistou mulheres de diferentes faixas etárias. Entre as jovens de 18 a 24 anos, 22% disseram ter sofrido agressão sexual ou estupro. Ainda na mesma faixa etária, 22% das mulheres afirmaram ter sofrido “controle psicológico ou ciúme excessivo” por parte do companheiro e 15% declararam que foram agredidas pelo companheiro ou ex-parceiro. A estática aumentou em 20% entre as mulheres de 50 a 64 anos.
Além disso, mais um terço das mulheres francesas entrevistadas (37%), foram sujeitas a sexo não consensual: 33% fizeram sexo quando não queriam mas o companheiro insistiu e 12% fizeram sexo desprotegido por insistência do parceiro, um número que sobre para 18% entre as mulheres de 25 a 34 anos.
“Desde o sexismo cotidiano, chamado ‘comum’, até suas manifestações mais violentas, há um continuum de violência”, diz a pesquisa.
As entrevistadas também abordaram a falta de confiança nas medidas oficiais de combate ao sexismo
“Há sinais claros de que os direitos fundamentais das mulheres, especialmente os direitos sexuais e reprodutivos, estão sendo corroídos no mundo”, afirma a pesquisa.
Além disso, 93% das pessoas afirmaram que homens e mulheres são tratados de forma diferente em pelo menos um dos aspectos de sua vida: trabalho, espaço público, escola ou família. Entre as mulheres entrevistadas, 80% afirmaram que foram, ou sentiram que foram, menos bem tratadas por causa do seu gênero, enquanto apenas 37% dos homens disseram o mesmo.
A presidente do HCE, Sylvie Pierre-Brossolette, destacou que esta foi a primeira vez que um levantamento desse tipo foi feito na França.
“Queríamos fazer pelo sexismo o que foi feito pelo racismo”, disse Pierre-Brosolette ao jornal britânico The Guardian. “Não basta proteger as mulheres e punir os homens. Se não abordarmos as raízes do machismo cotidiano e mudarmos a mentalidade, nunca iremos avançar”, acrescentou.