Maduro dá ultimato ao Brasil e a países que contestam seu novo mandato
Líder venezuelano desafia Grupo de Lima e assume nesta quinta-feira seu segundo mandato como presidente
Na véspera de assumir seu segundo mandato como presidente da Venezuela, Nicolás Maduro ameaçou nesta quarta-feira, 9, com a adoção medidas diplomáticas “urgentes e cruas” os países integrantes do Grupo de Lima, entre os quais o Brasil. Maduro referiu-se ao grupo como um “cartel” e lhe deu 48 horas para mudar sua posição em relação à Venezuela.
Formado por catorze países das Américas, o Grupo de Lima declarou na última sexta-feira 4 que seus governos não reconhecerão o governo da Venezuela se presidente tomar posse nesta quinta-feira, 10, para seu segundo mandato de seis anos no cargo. No texto, o grupo pede a Maduro que transfira o poder para a maioria parlamentar da oposição da Assembleia Nacional enquanto “as eleições democráticas são realizadas”.
O Grupo de Lima abriu também a possibilidade de seus membros romperem relações diplomáticas com Caracas e adotarem sanções contra autoridades e empresas venezuelanas. Apenas o México esquivou-se de assinar a declaração. O texto foi formulado durante conferência de chanceleres do grupo ocorrida em Lima, Peru, no dia 4.
“Hoje entregamos a todos os governos do Grupo de Lima esta nota de protesto diplomático, onde exigimos uma retificação das suas posições sobre a Venezuela em 48 horas. Ou o governo da Venezuela tomará as mais urgentes e cruas medidas diplomáticas para a defesa da integridade de nossa soberania”, disse Maduro, em entrevista à imprensa internacional.
Para Maduro, as medidas anunciadas pelo Grupo de Lima violam princípios do direito internacional. Ele disse ainda que não aceitará “chantagem” e que tomará posse com o apoio do povo, dos militares e de vários países da comunidade internacional, como Turquia, Nicarágua, Cuba e Bolívia. Além da Rússia e da China, de fato esses são os principais aliados de Caracas.
As notas diplomáticas de protesto foram enviadas pelo chanceler da Venezuela, Jorge Arreaza, a treze dos catorze países que integram o Grupo de Lima. O Itamaraty não confirmou o recebimento do texto.
Maduro venceu as eleições presidenciais em maio de 2018, consideradas ilegítimas pelos países do Grupo de Lima, pelos Estados Unidos e pela União Europeia. A oposição não esteve representada no pleito, como forma de protesto por antever fraudes. A Justiça venezuelana, controlada pelo Poder Executivo, impediu a candidatura das principais lideranças adversárias a Maduro.
O presidente venezuelano rejeitou em particular a crítica do bloco à recente invasão das águas territoriais da Guiana por um navio da Venezuela. O Grupo de Lima pedira que Maduro desistisse de “ações que violam os direitos soberanos de seus vizinhos”. Maduro acusou o Grupo de Lima de seguir ordens de Washington e de ter tomado partido da Guiana em uma disputa com a Venezuela.
Desde sua sucessão a Hugo Chávez, morto em 2013, a Venezuela vive um período turbulento sob o governo de Nicolás Maduro. A crise econômica e o governo evidentemente autoritário desencadearam a maior crise humanitária da América do Sul, com mais de 3 milhões de refugiados desde 2015. No país, a população sobrevive há anos apesar do desabastecimento de alimentos e remédios, da crise do setor médico e do desemprego massivo.
Veja a seguir os principais momentos da gestão de Maduro:
O herdeiro
O líder socialista Hugo Chávez, presidente desde 1999 e fundador da “revolução bolivariana”, morre em decorrência de um câncer em 5 de março de 2013. Ungido por Chávez como seu substituto, Maduro vence as eleições presidenciais de 14 de abril com 50,62% dos votos, apenas 1,5 ponto a mais do que o candidato da oposição, Henrique Capriles. Como meio de afirmação, dizia ter conversado com Chávez, que lhe aparecera na forma de um passarinho.
Petróleo em queda
Em 2014, liderada por Leopoldo López, a oposição realiza manifestações nas ruas de Caracas para exigir a saída de Maduro. A reação da Guarda Nacional Bolivariana e das milícias pró-Maduro contra os manifestantes resulta em centenas de prisões e 43 mortes.
López é preso em fevereiro e condenado em 2015 a quase catorze anos de prisão, acusado de incitar a violência dos manifestantes. Desde agosto de 2017 está em prisão domiciliar.
Os preços do petróleo, produto gerador de 96% das divisas do país, caem a menos da metade, agravando a escassez de alimentos e de remédios e o endividamento do país.
Primeira derrota
Em fevereiro de 2015, o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, é preso sob a acusação de conspirar contra Maduro. Pouco depois de passar à prisão domiciliar, em 2017, ele foge para a Espanha.
Em março, os Estados Unidos impõem as primeira sanções contra autoridades venezuelanas, às quais acusa de violar os direitos humanos e de cometer crimes comuns.
Em dezembro, em meio ao agravamento da crise político-econômica, a coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), de oposição, conquista a maioria das cadeiras da Assembleia Nacional. Trata-se da maior derrota eleitoral do chavismo desde 1998, quando Chávez foi eleito presidente.
Golpe no Legislativo
Assim que a oposição assume o controle do Legislativo, em janeiro de 2016, a Assembleia Nacional é declarada em desacato pelo Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), que anula suas decisões.
Durante quase todo o ano de 2016, a oposição tenta revogar o mandato de Maduro por meio de um referendo e organiza manifestações. Mas o Poder Eleitoral e a Justiça, nas mãos do Executivo, alegam fraude no recolhimento das assinaturas para solicitar o referendo.
Constituinte
O TSJ toma para si as atribuições do Parlamento. Em 1º de abril, explodem protestos que deixam 125 mortos em quatro meses. A procuradora-geral, Luisa Ortega, antes governista, denuncia a ruptura da ordem constitucional. Meses depois, foge do país denunciando uma “perseguição”.
Em 30 de julho, os venezuelanos voltam às urnas para eleger uma nova Assembleia Constituinte, com poder absoluto e totalmente governista. Na prática, substitui na prática a Assembleia Nacional. Os protestos, desgastados, cessam.
Washington aprova sanções financeiras contra a Venezuela. A petroleira estatal PDVSA é declarada em moratória parcial.
O chavismo tem ótimo resultado nas eleições de governadores de outubro e nas municipais de dezembro. A oposição, que novamente não participaram do pleito, denuncia fraudes.
Reeleição
Diante de uma oposição rachada, a Constituinte decide adiantar as eleições presidenciais, de forma a favorecer a candidatura de Maduro. A nova tentativa de diálogo entre oposição e o governo sobre garantias eleitorais fracassa, e as autoridades fixam as eleições para 20 de maio.
A MUD decide boicotá-las por serem uma “fraude”. O candidato de oposição Henri Falcón, dissidente do chavismo, se afasta da MUD e lança a sua candidatura.
Os Estados Unidos, o Grupo de Lima e a União Europeia desconhecem as eleições. Maduro, porém, é reeleito com 68% dos votos. A eleição registra a maior abstenção, de 52%, da história democrática venezuelana.
Enquanto isso, a produção petroleira cai aos níveis mais baixos em três décadas (1,4 milhão de barris por dia).
Em 4 de agosto, o presidente denuncia ter sofrido um atentado com dois drones carregados com explosivos, que explodiram perto de onde ele presidia uma parada militar. Maduro culpa o deputado opositor Julio Borges, o então presidente colombiano Juan Manuel Santos e os Estados Unidos. Vinte e cinco pessoas são detidas, entre elas o legislador Juan Requesens e dois generais.
Escassez
(Com EFE e AFP)