Mais rápido que nunca, geleiras da Suíça atingem recorde de derretimento
De outubro de 2021 ao final de setembro de 2022, houve uma perda de 6% do volume restante este ano, segundo dados publicados nesta terça-feira
As geleiras nos Alpes da Suíça registraram a pior taxa de derretimento, em comparação com registros que começaram há mais de um século, segundo dados divulgados nesta terça-feira, 27, pela Glacier Monitoring in Switzerland (GLAMOS).
De outubro de 2021 a setembro de 2022 houve uma perda de 6% do volume restante este ano, quase o dobro do recorde anterior de 2003 — conhecido como o verão mais extremo, antes deste de 2022. Segundo o Departamento Federal de Meteorologia e Climatologia da Suíça, MeteoSwiss, os Alpes Suíços registraram no fim de julho, pela primeira vez na história, uma temperatura de 0°C a 5.184 metros de altura, o que é preocupante dado que o nível de congelamento é normalmente inferior a 5 000 metros.
Em reportagem de VEJA, Andreas Linsbauer, pesquisador da GLAMOS, que documenta e monitora sistematicamente as mudanças de longo prazo das geleiras nos Alpes Suíços, já havia revelado que as geleiras estão derretendo mais rápido do que nunca. O glaciologista ainda afirmou, antes da divulgação oficial da pesquisa nesta semana, que este ano já havia perdido cerca de três vezes mais neve, em comparação ao ano anterior.
“A velocidade do degelo nos Alpes é difícil de aceitar: em apenas dois meses, uma passagem de montanha em Les Diablerets
@Glacier_3000, a Suíça Ocidental, coberta de gelo por vários milhares de anos, tornou-se livre de gelo. O verão de 2022 mudou as realidades das #geleiras alpinas…”, afirmou Mathias Huss, chefe do grupo GLAMOS, no Twitter.
The speed of deglaciation in the Alps is hard to accept: within just two months, a mountain pass at Les Diablerets @Glacier_3000, Western Switzerland, ice-covered for several thousand years, became ice-free.
The summer of 2022 has shifted the realities for Alpine #glaciers… pic.twitter.com/MaBdor567P— Matthias Huss (@matthias_huss) September 6, 2022
Cientistas que estudam os Alpes foram obrigados a fazer reparos de emergência em dezenas de locais na região, pois o derretimento do gelo criou um risco de danificar postes de medição e destruir os dados armazenados. A pesquisa em certos lugares também teve que ser suspensa, pois quase não havia mais neve para análise.
Em publicação no Twitter o pesquisador principal da GLAMOS se despediu de dois pontos de pesquisa.
“OK, é isso. Em apenas quatro dias, eu disse adeus a dois dos meus locais de monitoramento de balanço de massa de geleiras. Embora Schwarzbachfirn, na Suíça Central, sempre tenha sido pequena, o verão de 2022 deu o golpe final. Um pouco de gelo morto e MUITOS detritos são deixados”, escreveu.
Ok, that's it.
Within just four days I said farewell to two of my previous #glacier mass balance monitoring sites.
Although Schwarzbachfirn, Central Switzerland, was always small, the summer of 2022 has given it the final blow. A bit of dead ice, and MUCH debris is left. pic.twitter.com/zXHwns6vQt— Matthias Huss (@matthias_huss) September 13, 2022
O derretimento foi tão extremo este ano que rochas nuas que permaneceram enterradas por milênios ressurgiram em um local, enquanto corpos e até mesmo um avião perdido em outros lugares nos Alpes décadas atrás foram recuperados. Outras pequenas geleiras praticamente desapareceram, o que chegou a alterar a fronteira entre e a Suíça e a Itália.
Segundo Huss, do grupo de monitoramento GLAMOS, as alterações no nível de gelo também podem prejudicar a segurança de atividades nas montanhas.
Two views from #Wildstrubel summit exactly 1 year apart. Check out how the extreme summer of 2022 changed the crevasse situation!
While it was an enjoyable walk over the #glacier in 2021, there's a labyrinth of crevasses now – the #ClimateCrisis also alters mountaineering hazards pic.twitter.com/LCAqanedL7— Matthias Huss (@matthias_huss) September 26, 2022
Em agosto, dois grandes atletas morreram ao escalar o Mont Blanc – montanha mais alta dos Alpes e da União Europeia. Um dos esportistas, um ultramaratonista brasileiro cuja identidade não foi divulgada, morreu na parte francesa provavelmente ao cair de um buraco ou ribanceira, enquanto Adèle Milloz, campeã mundial de esqui de 26 anos, morreu enquanto treinava para ser guia de montanhismo.
Mais da metade das geleiras dos Alpes estão na Suíça, onde as temperaturas estão subindo cerca de duas vezes a média global. As grandes perdas deste ano, que totalizaram cerca de 3 km cúbicos de gelo, têm acontecido por uma série de eventos. Primeiramente, no final do inverno do hemisfério norte, as massas de neve nas geleiras e em todos os Alpes já estavam fortemente abaixo da média. Isto é preocupante, a neve é a nutrição principal para as geleiras, pois o gelo é construído a partir dela, e é a melhor proteção contra o derretimento – devido a cor branca que consegue melhor refletir o calor do sol.
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Na primavera, o vento e o clima trouxeram muita poeira do Saara para os Alpes; o que causou uma mudança na cor da neve para um marrom amarelado, acelerando o derretimento. Este fenômeno é causado por grandes rajadas de vento que levantam as pequenas partículas de areia do ar frio no solo do deserto para o ar mais quente nos céus, que é então transportado pelo Mediterrâneo – este não é um novo acontecimento, no entanto, com o aquecimento global o padrão climático está mudando, algumas condições climáticas como esta permanecem por mais tempo. Além disso, em maio, a primeira onda de calor, derreteu muita neve e gelo, e de junho em diante muito sol e dias secos têm sido responsáveis pelas altas taxas de fusão.
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Se as emissões de gases de efeito estufa continuarem a aumentar, espera-se que as geleiras dos Alpes percam mais de 80% de sua massa atual até 2100. Muitos desaparecerão independentemente de qualquer ação de emissões que seja tomada agora, graças ao aquecimento global causado pelas emissões passadas, de acordo com o relatório de 2019 do Painel Intergovernamental das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.