Marcas do passado: uma transformação simbólica na Ucrânia
Na terça-feira 1º de agosto, soldados ucranianos removeram o emblema da foice e do martelo comunistas do monumento à Mãe Pátria, em Kiev
Nas guerras, é o que ensinam os livros de história, os simbolismos podem ferir mais do que tiros e bombas. Eles movem os humores da sociedade e, de algum modo, influenciam as movimentações nos campos de batalha. Não por acaso, na terça-feira 1º de agosto, soldados ucranianos removeram o emblema da foice e do martelo comunistas do monumento à Mãe Pátria, em Kiev, uma construção brutalista, feia mesmo, de 102 metros de altura e 450 toneladas. O treco representa uma figura feminina com uma espada e escudo, à margem do Rio Dniepre, que corta a capital. Sai a marca celebrada pela extinta União Soviética — aquela que Vladimir Putin tenta mimetizar, mas sem ideologia — e entra o brasão de armas usado pelo Exército do país de Zelensky, um tridente. Mudará o nome também, é claro — e vem aí a Mãe Ucrânia. O novo totem, reformado a um custo de 700 000 euros, financiado por doadores privados, será inaugurado até 24 de agosto, dia da independência ucraniana. Eliminam-se as referências soviéticas e russas em espaços públicos desde o início da agressão de Putin, em fevereiro do ano passado, e lá se vão dezoito meses de um conflito que era anunciado como curto, dada a discrepância de forças entre o invasor e o invadido. Mas não, e na semana passada Moscou voltou a ser atingida por drones. O Kremlin chamou os ataques de “gesto desesperado” e retaliou atacando a cidade natal de Zelensky, Kryvyi Rih. Tão cedo o conflito não cessará — e muitas outras marcas do passado indesejável sumirão do horizonte.
Publicado em VEJA de 9 de agosto de 2023, edição nº 2853