Era inevitável e necessário que, nos últimos dias, a atenção do mundo fosse atraída para o ataque do Hamas e a reação de Israel. Convém, contudo, não tirar os olhos da Rússia de Putin. Detido há mais de seis meses na Rússia, o jornalista americano Evan Gershkovich, 31 anos, correspondente do The Wall Street Journal, se apresentou a um tribunal na terça-feira 10. Ali escutou que teria sua prisão preventiva em um centro de segurança máxima de Moscou estendida até 30 de novembro. Ele foi acusado de espionagem, ao lidar com supostos segredos industriais, durante uma viagem de trabalho, em março, aos Montes Urais. Gershkovich nega tudo, com o apoio de diplomatas americanos e da direção do jornal. Se for condenado, pode ficar até vinte anos na cadeia. Trata-se de evidente abuso contra a liberdade de expressão e, naturalmente, uso de um cidadão dos Estados Unidos como refém. Para o Kremlin, a prisão pode servir como instrumento de chantagem em troca de criminosos russos capturados na América. Em dezembro do ano passado, a jogadora de basquete Brittney Griner, detida na Rússia por posse de Cannabis, voltou para casa em troca do traficante de armas Viktor Bout. Gershkovich pode ter o mesmo destino. Ainda assim, o jornalista parece não perder o ânimo e o bom humor. Segundo seus pais, que fugiram da URSS em 1979, ele envia cartas espirituosas contando piadas e descrevendo as leituras mais recentes. O olhar irônico diante das lentes dos fotógrafos ilumina o absurdo da situação de um país autocrático.
Publicado em VEJA de 13 de outubro de 2023, edição nº 2863