O presidente do Chile, Sebastián Piñera, reiterou nesta terça-feira, 5, que não tem intenção de renunciar ao cargo e prometeu investigar qualquer denúncia de abusos cometidos pelas forças de segurança durante os protestos contra seu governo nas últimas semanas. “É claro que chegarei ao fim do meu governo”, frisou.
Em uma entrevista à rede britânica BBC, Piñera defendeu a declaração de estado de emergência no país como uma ferramenta “democrática e constitucional, para restaurar a ordem pública e proteger os cidadãos”.
O presidente explicou que, durante as duas últimas semanas, “dois fenômenos de natureza muito diferentes” coincidiram. “Primeiro, e isso foi totalmente inesperado, houve uma enorme onda de violência. Violência que algumas pessoas praticaram de maneira muito organizada. Essa violência não pode ser tolerada, é contra a lei”, afirmou.
Por outro lado, ele também reconheceu como “legítimo” o direito dos cidadãos de “demonstrar, protestar” e exigir mudanças.
“É claro que existem muitas queixas sobre o suposto uso excessivo da força ou mesmo crimes. Se isso aconteceu, posso garantir que será investigado pela nossa promotoria e que será julgado pelo nosso sistema judicial. Não haverá impunidade”, garantiu.
Quando questionado sobre as críticas a sua condução da crise e a queda de seu nível de aprovação, o presidente se defendeu e negou que os chilenos tenham perdido a confiança em seu governo.
“Eu tenho fé, pois é minha obrigação como presidente, e jurei cumpri-la, melhorar a qualidade de vida de nossos cidadãos”, afirmou.
Piñera também disse que as medidas adotadas por seu governo para enfrentar as demandas dos manifestantes, entre elas as mudanças no governo, não são apenas ajustes estéticos.
O presidente declarou que os problemas que afetam o Chile “vêm se acumulando nos últimos 30 anos”, embora ele assuma sua parcela de responsabilidade. “O importante agora é como reagiremos como sociedade ao que as pessoas estão pedindo.”
Protestos continuam
Os protestos no Chile entraram na terceira semana na segunda-feira 4, com dezenas de milhares de manifestantes, a maioria estudantes, marchando pelas ruas de Santiago, Val Paraiso e Viña del Mar. Pelas redes sociais, os manifestantes convocaram a população a participar dos atos da “super segunda”.
Na capital, logo pela manhã taxistas já se concentravam na Praça Itália, em Santiago, para protestar contra a cobrança de pedágio dentro da cidade. Ao longo do dia, o protesto começou a ganhar corpo com a chegada de mais manifestantes, levando a um embate com a polícia.
Os confrontos começaram quando os manifestantes tentaram chegar ao Palácio Presidencial de La Moneda pela Avenida Alameda, forçando as barreiras da polícia ao longo do trajeto. Na Praça Itália, os oficiais lançaram bombas de gás lacrimogêneo e utilizaram jatos d’água para dispersar os manifestantes. Um policial ficou ferido após ter sido atingido por um coquetel molotov.
Os protestos, que já deixaram mais de 20 mortos, questionam um Estado ausente em educação, saúde e Previdência e que permite que uma minoria controle a riqueza do país. Dessa maneira, multiplicaram-se as vozes da esquerda e da direita que pedem uma mudança na Constituição, herdada da ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) e aprovada por um referendo popular após a redemocratização.
Segundo uma pesquisa realizada pelo instituto Cadem e divulgada no domingo, 87% da população apoia a mudança da atual Constituição.
O presidente Sebatian Piñera cancelou as reuniões da Apec (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico) e a COP-25, cúpula do clima da ONU, previstas para este mês no Chile, devido à crise.
No primeiro final de semana dos protestos, entre 19 e 20 de outubro, o presidente decretou estado de emergência, enviou militares às ruas e impôs um toque de recolher após supermercados serem saqueados e prédios e estruturas públicas serem incendiadas. Essas medidas não eram tomadas desde a época da ditadura de Pinochet.
(Com AFP e EFE)