A autoproclamada presidente interina da Bolívia, Jeanine Áñez, anunciou na noite da quinta-feira 17 sua desistência de participar da eleição presidencial marcada para o mês que vem, em uma tentativa de enfraquecer o candidato endossado pelo ex-presidente Evo Morales.
“Hoje deixo de lado minha candidatura à Presidência da Bolívia para cuidar da democracia”, disse a líder de direita em pronunciamento televisionado, no qual explicou que sua decisão foi tomada “ante o risco de que o voto democrático se divida entre vários candidatos e que, devido a isto, o MAS acabe vencendo a eleição”, em 18 de outubro. A chapa do Movimento ao Socialismo (MAS), encabeçada por Luis Arce, ex-ministro da Economia em duas ocasiões, lidera as intenções de voto por ampla margem, segundo uma pesquisa de opinião nacional divulgada na quarta-feira.
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Clique e AssineArce tem 29,2% das intenções, seguido pelo ex-presidente de centro Carlos Mesa, que tem 19%, segundo a pesquisa da fundação católica Jubileo. Em terceiro lugar, aparece o líder regional de direita Luis Fernando Camacho, com 10,4%. Áñez, por sua vez, fica em quarto lugar, com 7%. Se os números se confirmarem, Arce seria eleito já no primeiro turno, já que a Constituição boliviana declara vencedor quem conquistar 50% mais um voto ou mais de 40% com 10 pontos percentuais de vantagem sobre o segundo lugar
Rodeada por seu companheiro de chapa, o empresário Samuel Doria Medina, e por outros aliados políticos, Jeanine pediu união contra o MAS. “Se não nos unirmos, Morales volta, a democracia perde, a ditadura ganha”, afirmou. A presidente interina assumiu o cargo em novembro de 2019, após a renúncia de Morales devido a uma convulsão social e uma rebelião policial por suposta fraude eleitoral. Depois de seguir ao México, o ex-presidente está desde dezembro do ano passado na Argentina.
Apesar do apoio de governos vizinhos, como o do Brasil, Áñez se tornou alvo de críticas, inclusive de apoiadores, após não cumprir a promessa de que não participaria do pleito. Ela também vem sendo criticada pela má gestão da pandemia de Covid-19. A Bolívia soma mais de 129.000 casos, incluindo cerca de 7.500 mortes.
Aliança contra o MAS
Após o anúncio de Áñez, imediatamente surgiram versões de que a presidente interina abriu um canal de negociação com Mesa para formar uma coalizão contra o MAS nas urnas. Mesa afirmou nas redes sociais estar “sempre disposto ao diálogo”.
“A decisão de travar o MAS e abrir uma nova etapa na qual, em primeiro lugar, estão as pessoas sempre será do povo boliviano”, escreveu Mesa, que elogiou a decisão de Áñez, embora tenha criticado a presidente interina pela maneira como lidou com a pandemia e a crise econômica.
Valoro la decisión asumida por la Presidenta @jeanineanez como una contribución a la democracia. Estamos siempre dispuestos al diálogo. La decisión de cerrarle el paso al MAS y abrir una nueva etapa donde Primero este la gente siempre será del pueblo boliviano.
— Carlos D. Mesa Gisbert (@carlosdmesag) September 18, 2020
O ministro de Obras Públicas, Iván Arias, garantiu “que nada está sacramentado”, em referência a eventuais negociações políticas, mas disse que “o importante era dar este primeiro passo”.
A porta-voz do MAS, Marianela Paco, afirmou que a decisão de Áñez “tem como base o roteiro traçado pela direita boliviana, que trata de alianças baseadas no ódio, contra o único partido do povo”. Paco acrescentou que Arce, se eleito, trabalhará para resolver os problemas dos bolivianos, tanto econômicos quanto de saúde.
A desistência da presidente interina também levantou dúvidas sobre a própria validade do ato, já que o Tribunal Supremo Eleitoral já está na fase da impressão das cédulas de voto para cerca de 7,3 milhões de eleitores.
Além disso, o partido de Áñez, o Juntos, registrou candidatos a senadores e deputados nas eleições. Uma fonte do tribunal ouvida pela agência AFP disse que o que falta por enquanto é que a presidente interina formalize sua renúncia e que os magistrados do órgão eleitoral emitam uma resolução.
As eleições presidenciais e legislativas deste ano, que foram adiadas três vezes devido à pandemia, substituem as acirradas eleições de outubro de 2019, que geraram protestos que levaram à renúncia de Morales.