O príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, disse a um de seus assessores que “usaria uma bala” contra o jornalista saudita Jamal Khashoggi se ele não voltasse para o reino e parasse com suas críticas ao governo. Segundo informaram autoridades americanas ao jornal The New York Times, a conversa aconteceu um ano antes do assassinato de Khashoggi, executado em outubro de 2018.
Interceptado por agências de inteligência dos Estados Unidos, o diálogo é a evidência mais contundente de que o príncipe herdeiro considerava a ideia de matar Khashoggi antes mesmo que seus aliados estrangulassem e desmembrassem o jornalista dentro do consulado saudita em Istambul, Turquia. O governo de Riad sempre negou a participação do príncipe no crime, e o presidente Donald Trump, seu aliado, mostrou pouca disposição em cooperar com as investigações.
Ainda de acordo com o Times, na conversa, o príncipe disse a seu funcionário, identificado como Turki Al-dajil, que Khashoggi seria chamado a retornar a Arábia Saudita e, se recusasse, voltaria à força. Caso nenhum dos métodos funcionasse, Bin Salman assegurou que iria pessoalmente atrás do jornalista “com uma bala”.
A Agência de Segurança Nacional (NSA), dos Estados Unidos, está analisando anos de comunicação em texto e voz na tentativa de colher provas sobre o papel do príncipe herdeiro como mandante ou não do crime. Nos últimos meses, eles enviaram seus relatórios à Casa Branca, a aliados estrangeiros e a outras agências de inteligência americanas.
Semanas depois do assassinato, a CIA publicou seu primeiro laudo sobre a operação que matou Khashoggi, concluindo que ela foi ordenada por Bin Salman.
No relatório publicado pelo jornal, concluído em dezembro, a NSA alerta que as falas do príncipe não devem ser interpretadas ao pé da letra, já que ele não necessariamente quis dizer que atiraria em Khashoggi. Mas reiterou que pode ter sido uma metáfora para enfatizar sua intenção de matar o jornalista.
Dias antes da conversa com Aldakhil, de acordo com o mesmo relatório, Bin Salman queixou-se com outro assessor, Saud al-Qahtani, que Khashoggi havia se tornado influente demais. O príncipe disse que os artigos e tuítes do jornalista estavam manchando sua imagem como um reformista moderno e que as críticas eram ainda mais contundentes pois vinham de uma figura que já tinha sido favorável a sua agenda.
Quando al-Qahtani alertou que qualquer medida contra o jornalista seria arriscada e poderia criar controvérsia internacional, o príncipe disse que eles não deveriam se importar com a reação estrangeira sobre a relação do governo com seus cidadãos. Ele também afirmou que “não gostava de medidas moderadas, nunca havia gostado e não acreditava nelas.”
Em dezembro, uma matéria do Wall Street Journal mostrou que Bin Salman trocou diversas mensagens com al-Qahtani horas antes e depois do assassinato de Khashoggi. A inteligência americana identificou o assessor como líder da operação que matou o jornalista e, ainda no ano passado, ele foi incluído na lista de autoridades sauditas sancionadas pelos Estados Unidos por envolvimento com o caso.
Conselheiro da corte e um dos apoiadores mais fieis da agenda governista, ele foi demitido de seu cargo pouco depois do assassinato. A Arábia Saudita abriu um processo contra 11 pessoas envolvidas na operação contra o jornalista. Os promotores pedem a pena de morte para cinco deles, mas o nome dos réus não foi divulgado e não está claro se o ex-conselheiro está entre eles.
Repressão Insuportável
As gravações divulgadas datam de setembro de 2017, mesmo mês em que Khashoggi começou a publicar seus artigos de opinião no jornal americano The Washington Post. A primeira coluna do jornalista era intitulada: “A Arábia Saudita não foi sempre tão repressiva. Agora, é insuportável.”
Na quinta-feira 7, a relatora da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o caso, Agnes Callamard, afirmou em Genebra que Khashoggi foi vítima de “um assassinato brutal e premeditado” que foi “planejado e cometido por funcionários da Arábia Saudita”.
A NSA e a CIA não comentaram a matéria do Times. Em um comunicado, Aldakhil afirmou que “as alegações são categoricamente falsas e parecem ser a continuação dos esforços de diferentes partidos para ligar sua Alteza o príncipe herdeiro a esse crime horrível.”
A publicação da informação coincide com a visita do ministro das Relações Exteriores sauditas, Adel al-Jubeir, aos Estados Unidos, onde se reuniu com o secretário de Estado americano, Mike Pompeo. Durante a reunião, ambos destacaram a importância de continuar com a investigação sobre o assassinato do jornalista saudita de maneira “crível e transparente”.
(com Agência EFE)