Descabelado, desengonçado, levado pouco a sério, o conservador Boris Johnson meteu-se em trapalhadas assim que se tornou primeiro-ministro britânico, em julho. Perdeu votações no Parlamento, perdeu ações na Justiça e perdeu tempo tentando arrancar concessões de todas as partes. Até conseguir antecipar a eleição — e ganhá-la de lavada. O Partido Conservador entra em 2020 com uma maioria de mais de oitenta parlamentares, a mais ampla desde a época de Margaret Thatcher. Líder dos trabalhistas, o “vermelho” Jeremy Corbyn, intragável para boa parcela dos britânicos, anunciou que deixará o cargo. Boris, como todo mundo chama o loiro vencedor, fez campanha de uma nota só: concretizar o Brexit, a dolorosa saída do Reino Unido da União Europeia, que desde o plebiscito de sua aprovação, em 2016, não ata nem desata, patinando na lama das desavenças políticas internas.
A população, farta das idas e vindas do processo, das sucessivas ameaças de convocação de um novo referendo e da paralisação nacional desde que o assunto entrou em pauta, deu um recado claríssimo nas urnas: vamos acabar com a palhaçada, sair logo da UE e seguir adiante. “Nós demolimos as barreiras e pusemos um fim nas obstruções”, celebrou o primeiro-ministro, um brexiter de carteirinha. Ninguém sabe direito o que vai acontecer depois. Inúmeras empresas mudaram sua sede para outros países, a população estoca vinho, foie gras e demais artigos há meses e a burocracia da separação será monumental, sem falar nas esperadas perdas econômicas de parte a parte. Mas quem é a favor considera que, fora da UE, o Reino Unido será capaz de firmar acordos comerciais mais vantajosos e controlar sua fronteira (leia-se: conter as levas de imigrantes). Se tudo transcorrer como deve — e no caso deste divórcio nunca se sabe —, o Brexit ocorrerá no dia previsto (após três adiamentos), 31 de janeiro de 2020. “Sem talvez ou porém”, garante Boris.
Publicado em VEJA de 1º de janeiro de 2020, edição nº 2667