Acabou anulado o acordo bilateral firmado em Brasília acerca do compartilhamento entre Brasil e Paraguai da energia produzida pela usina hidrelétrica de Itaipu, uma combinação na surdina que ameaça de impeachment o presidente paraguaio Mario Abdo Benítez. O estopim para a crise foi a inesperada renúncia de Pedro Ferreira, presidente da Ande, a companhia de eletricidade do Paraguai, por discordar dos termos do pacto sobre Itaipu, de onde vem 90% da energia consumida no país. Tentando apagar o incêndio, Benítez afastou quatro funcionários envolvidos na negociação, entre eles o ministro das Relações Exteriores, Luis Castiglioni, e o embaixador do Paraguai no Brasil, Hugo Saguier. Não adiantou, e o barulho só cresceu. A oposição formalizou o pedido de impeachment do presidente por “traição à pátria” ao supostamente ceder mais do que deveria no acordo.
A polêmica principal envolve os valores e o destino da chamada energia excedente. Pelos termos do tratado original de Itaipu, firmado em 1973, o Paraguai tem direito a 50% da energia ali gerada e o Brasil paga ao país pela parcela que não é consumida — uma conta absorvida, a rigor, pelos consumidores brasileiros. Uma queixa antiga do Brasil é que o vizinho não declara tudo o que consome (15% dos tais 50%) e ainda usa o excedente como insumo barato para atrair investimentos. O documento assinado pelos chanceleres dos dois lados em maio estabeleceria que o consumo declarado paraguaio aumentaria gradativamente até 2022. Diante da grita, o Senado rechaçou a combinação e Benítez, encostado na parede, preferiu anular tudo. O Brasil aceitou o desfecho, mas o enrosco vai continuar a se arrastar.
Publicado em VEJA de 7 de agosto de 2019, edição nº 2646