A boa vontade – e até apoio nas ruas – da esquerda brasileira a Putin
Enquanto a maioria tenta ocultar a simpatiza pelo russo com críticas à Otan e aos EUA, tem legenda que levou militantes às ruas para mostrar solidariedade
A Europa vive a sua guerra mais grave desde o fim da II Guerra Mundial, mas as notas oficiais dos partidos da esquerda brasileira deixaram clara a sua dificuldade em condenar de forma contundente a invasão da Ucrânia pelo exército russo. O presidente da Rússia, Vladimir Putin, tem sido praticamente ignorado pelas siglas e pelos políticos desse campo – por outro lado sobram críticas à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), aliança militar que reúne os países do Ocidente, apesar de ela não ter se envolvido diretamente nas agressões nem violado a legislação internacional.
Há até legendas que defendem abertamente Putin. O Partido da Causa Operária (PCO) declarou “apoio total” à invasão russa com argumentos alinhados ao que diz parte importante de figuras da esquerda. O partido classifica como “imperialismo” a ação de potências ocidentais, especialmente dos Estados Unidos, para justificar a invasão, e trata a Rússia de Putin como a “nação ameaçada”. Militantes do PCO, que foram se manifestar a favor da guerra em frente ao Consulado da Rússia no Rio de Janeiro, entraram em uma briga com integrantes do MBL contrários à invasão nesta terça-feira, 1°. O PCO é conhecido por posicionamentos pitorescos, como dizer que ter armas é “um direito democrático”, que criminalização da LGBTfobia é “uma campanha reacionária” e que a punição ao blogueiro bolsonarista Allan dos Santos, famoso por espalhar fake news, é um “ataque à liberdade de expressão”.
Outros partidos não declaram abertamente apoio a Putin, mas também evitam qualquer crítica direta. O PSOL lembrou em seu posicionamento que sua “posição programática é pelo fim da Otan”. Há anos, a organização militar tem sido o motivo usado por Putin para incursões militares que visam garantir influência e controle sobre regiões que pertenceram à antiga União Soviética. A Otan foi criada em 1949 com o objetivo explícito de frear a expansão do comunismo no mundo. No fim dos anos 1990 e na década de 2000, porém, a Otan passou por uma expansão que incluiu países do leste europeu, inclusive alguns que fazem fronteira com a Rússia.
Foi esse argumento que o ex-ministro petista Aloísio Mercadante usou para retratar o Ocidente como um dos responsáveis pelo conflito: “Forças ocidentais da Otan optaram por aprofundar uma política agressiva de expansão, passando de 12 membros originais para 30 Estados, inclusive com nações fronteiriças à Rússia, como tentam fazer agora com a Ucrânia”, escreveu em um artigo no site oficial do PT.
O deputado estadual José Américo (PT-SP), que já foi secretário de Comunicação do partido e é próximo ao ex-presidente Lula, argumenta, no Twitter, que “os EUA são a verdadeira ameaça à paz mundial” e que os americanos instigam a Ucrânia a manter a guerra com os russos.
A bancada do PT no Senado cometeu o deslize de expor esse pensamento, mas acabou se arrependendo. Em nota no Twitter, assinada pelo líder Paulo Rocha (PT-PA), disse que o “condena a política de longo prazo dos EUA de agressão à Rússia e de contínua expansão da Otan”. Pouco tempo depois, sob críticas, apagou. “A grande parcela da culpa, da responsabilidade (pela guerra), é dos EUA e da expansão da Otan”, ecoou Celso Amorim, ex-chanceler no governo Lula, e ainda influente nas questões de política externa do partido.
O posicionamento é mais complicado com as siglas de tendência comunista, que apoiam o modelo soviético. Embora apoiem a independência das repúblicas separatistas de Donetsk e Luhansk, região que vive em uma guerra de baixa intensidade com a Ucrânia desde 2014, eles veem Putin como um antissoviético e a invasão militar da Ucrânia como ruim para os trabalhadores. Nesse espectro partidário, que inclui PCB, PSTU e Unidade Popular, sobram críticas tanto ao governo ucraniano quanto ao russo.