Quando Ciro Nogueira (Progressistas-PI) foi anunciado como novo ministro-chefe da Casa Civil, as redes sociais viram bombar a hashtag “Bolsonaro traidor” e postagens que associavam o então senador ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), de quem já foi aliado. Conforme mostrou a última edição de VEJA, a escolha do parlamentar para o cargo de “primeiro ministro” representa a maior inflexão, até hoje, em método, imagem, e principalmente, estratégia eleitoral de Bolsonaro. Uma das principais lideranças do Centrão, o próprio Ciro está disposto a uma inflexão pessoal, um processo de ‘rebranding’ para repaginar a imagem, se descolar do passado vinculado à administração petista e criar novos fatos.
Em 2017, o parlamentar chamou o então deputado federal Jair Bolsonaro de “fascista” e “preconceituoso”. Em setembro de 2018, a um mês das eleições presidenciais, Ciro escreveu na sua conta pessoal no Twitter que “deixar Lula fora da disputa é tirar do eleitor um direito de escolha”. “Eu fico com Lula até o fim”, afirmou. Pois bem, o fim chegou.
“O que importa na política é mais a versão do que o fato. O governo Bolsonaro precisa terminar esse quadriênio e concorrer a outro. Precisa politicamente do Centrão, que é o suprassumo do establishment, ao qual boa parte da opinião pública associa a todos os pecados da política brasileira – corrupção, falta de ética, etc”, avalia o analista de risco político Paulo Kramer, que ajudou a formular o programa de governo de Bolsonaro em 2018.
“Bolsonaro vai ter de fazer a seguinte mágica: vai precisar do apoio do Centrão para continuar, terminar o seu governo, afastar o risco de impeachment e tentar a reeleição, e ao mesmo tempo continuar mobilizando aquela base de apoio, tradicional, aqueles 20-25%, que acreditam piamente que ele é a única figura anti-establishment”, acrescenta Kramer.
Para o cientista político Renato Perissinotto, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a chegada de Ciro Nogueira à Casa Civil força o próprio Palácio do Planalto a ajustar o discurso eleitoral. “Bolsonaro vai ter de adaptar o discurso dele de ser um paladino do anti-establishment, um representante da nova política. Há uma estratégia política que representa um fato contrário a isso tudo. Então isso pode custar a ele alguma perda na sua base eleitoral, embora eu não tenha, não consigo ver para onde essa base eleitoral podia fugir, acho que ela pode ficar desgostosa, mas tende a votar no Bolsonaro mesmo”, afirma.