O presidente Jair Bolsonaro publicou neste sábado, 30, em suas redes sociais o trecho de um discurso do atual ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes em que o magistrado defende liberdades individuais. O presidente não teceu comentários sobre as declarações de Moraes, mas a publicação ocorre após o magistrado ter decretado na quarta-feira, 27, quebra de sigilos de empresários ligados ao bolsonarismo e busca e apreensão contra aliados do governo, como o ex-deputado Roberto Jefferson e o dono das lojas Havan, Luciano Hang. Alexandre de Moraes é o relator de um inquérito sigiloso que apura quem são os responsáveis por manifestações “falsas, caluniosas, difamantes e injuriantes” contra o tribunal.
O processo gerou polêmica porque foi aberto por ordem direta do presidente do STF, Dias Toffoli, sem provocação do Ministério Público, e logo de imediato apoiou-se na Lei de Segurança Nacional, editada durante o regime militar, para justificar mandados de busca contra os primeiros alvos que usavam as redes sociais para zombar de ministros e atacar decisões judiciais. Nesta semana, foram alvo de ordens de Alexandre dentro do escopo do inquérito, entre outros, blogueiros bolsonaristas e os deputados Bia Kicis (PSL-DF), Carla Zambelli (PSL-SP), Daniel Silveira (PSL-RJ), Filipe Barros (PSL-PR), Luiz Phillipe Orleans e Bragança (PSL-SP) e Cabo Junio Amaral (PSL-MG). Todos terão de prestar depoimento e explicar postagens em redes sociais que tratam de ataques à Corte. Para o presidente e seus aliados, as críticas ao STF estariam protegidas sob o manto da liberdade de expressão.
Foi neste contexto que Bolsonaro publicou hoje trecho da sabatina a que se submeteu Alexandre de Moraes quando foi indicado ao STF em 2017. No vídeo, Moraes afirma que “desaparecendo a liberdade, desaparecerá o debate de ideias, a participação popular nos negócios políticos do Estado, quebrando-se o respeito ao princípio da soberania popular”. “Uma nação livre só se constrói com liberdade, e a liberdade só existirá onde houver um Estado democrático de direito, que, por sua vez, nunca será sólido sem a existência de um Poder Judiciário autônomo e magistrados independentes e um Supremo Tribunal Federal imparcial, para que possa exercer a sua grave função de guardião da Constituição e das leis e de garantidor da ordem na estrutura governamental republicana, com irrestrita possibilidade de debates de ideias e respeito à diversidade”, disse o ministro na sabatina.
O esgarçamento das relações entre Executivo e Judiciário tem crescido por sucessivos episódios que o governo Bolsonaro considera como interferências indevidas da Justiça. Um deles foi a decisão do próprio Moraes de barrar o nome de Alexandre Ramagem para a diretoria-geral da Polícia Federal por considerar que a indicação violava o princípio da impessoalidade. Ramagem atuou na segurança de Bolsonaro durante a campanha e passou o Réveillon ao lado de um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro. Neste domingo, bolsonaristas pretendem fazer uma manifestação em frente ao STF com o slogan “Supremo é o povo”.
Conforme revelou VEJA em julho passado, no inquérito sigiloso conduzido pelo ministro Alexandre os investigadores chegaram à conclusão de que as rotinas de ministros e de familiares deles estavam sendo monitoradas em detalhes e debatidas em fóruns na deep web. No caso mais grave, foi identificado, no início de 2019, o planejamento para vitimar um ministro do Supremo ou, como alternativa, o filho dele na saída do aeroporto de Congonhas. O plano de ataque foi discutido em um chat frequentado por Guilherme Taucci Monteiro e Luiz Henrique de Castro, que trocavam informações sobre como viabilizar ataques em massa com interlocutores interessados em ferir ministros do STF. Em março do ano passado, Monteiro e Castro protagonizaram um massacre na escola estadual Professor Raul Brasil, em Suzano, em São Paulo.