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Bruno Covas: os bastidores da descoberta do câncer

O tucano precisa vencer um tumor no trato digestivo e as desconfianças de que a doença vai tirá-lo da vida política

Por Adriana Dias Lopes e Edoardo Ghirotto
Atualizado em 4 jun 2024, 15h17 - Publicado em 1 nov 2019, 06h00

“E agora?” A pergunta foi feita pelo prefeito paulistano Bruno Covas, do PSDB, imediatamente depois que ele soube que estava com tumor no trato digestivo. A notícia foi dada pelos médicos do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, no dia 26, um sábado. A resposta objetiva e confortante veio do infectologista David Uip: “Temos problemas, mas vamos resolvê-los”. Covas ainda precisaria passar por outros exames para detalhar o tipo de câncer, incluindo uma biópsia, mas os profissionais já tinham uma forte suspeita da gravidade da doença: um câncer na cárdia, região de transição entre o estômago e o esôfago, com metástase no fígado e nos linfonodos.

O diagnóstico da doença foi resultado de uma grande investigação médica. Ela começou na quarta 23, às 16h30, quando Covas foi ao consultório de Uip para tratar de uma infecção na pele (erisipela) na parte inferior da perna direita. O infectologista suspeitou de trombose ao checar que a perna do prefeito estava dura e o encaminhou direto para o Sírio. No hospital, exames confirmaram que o cenário era ainda pior: ele também tinha embolia nos dois pulmões. Isso levantou a desconfiança de que o prefeito poderia ter câncer. Os tumores aumentam em sete vezes a possibilidade de trombose, e Covas não se encaixa em grupos de risco para a formação de coágulos, como pessoas que fazem uso de anticoncepcional e tabagistas.

O tumor do prefeito é de alta gravidade. Um dos principais sinais disso é que, mesmo tendo sido descoberto rapidamente, ele já tinha atingido outro órgão. O fígado costuma ser o primeiro alvo de metástase no caso desse câncer. O diagnóstico precoce, no entanto, impediu que as células malignas invadissem o peritônio, a membrana que cobre as vísceras intra-abdominais, uma região delicadíssima. Os médicos deram a Covas duas opções de tratamento: uma químio pesada, com mais efeitos colaterais, ou uma mais branda, com menos efeitos. Covas não titubeou: preferiu a mais forte. A terapia consiste em três ciclos com duração de trinta horas cada um e intervalo de duas semanas entre eles. Enjoo, cansaço e perda de pelos são os sintomas mais comuns. No caso de a terapia falhar, há outras opções de tratamento, incluindo a imunoterapia, que pode provocar efeitos mais drásticos, como anemia e doenças autoimunes.

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ESPERANÇA – O médico David Uip: “É um caso grave, mas o Bruno irá em frente” (Aloisio Mauricio/Fotoarena)

A notícia provocou um clima de consternação e solidariedade entre aliados e oposicionistas. Em conversas reservadas, vereadores de diferentes partidos dizem que vão esperar a reação de Covas à quimioterapia para discutir uma eventual sucessão. Vice de João Doria, ele assumiu o posto após o chefe deixar a prefeitura para concorrer e vencer a corrida ao governo paulista. Caso Covas tenha de se afastar, o presidente da Câmara, Eduardo Tuma (PSDB), assumirá por trinta dias o cargo e convocará uma eleição indireta para a prefeitura. Em termos eleitorais, a doença de Covas embolou ainda mais a imprevisível disputa para 2020 na principal metrópole brasileira. Aliados esperavam que ele conquistasse maior popularidade com a entrega de obras que havia programado até a eleição, sobretudo nos campos da saúde e da educação. Mas pessoas próximas ao governador admitem que, após a descoberta da doença, Doria trabalha muito fortemente com a possibilidade de Covas não estar no páreo. O governador nunca foi um entusiasta da candidatura de Covas à reeleição, mas foi orientado por tucanos a não abandoná-lo no meio do caminho para tentar melhorar sua imagem até a eleição presidencial de 2022.

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Diante do quadro clínico de Covas, é precoce arriscar se ele poderá se candidatar. Assim como é cedo para dizer quem entraria em seu lugar no PSDB. Doria tem proximidade com Joice Hasselmann (PSL), que está disposta a disputar a prefeitura, mas o ingresso da deputada no ninho tucano sofreria forte resistência. Joice só vai se lançar por seu atual partido se conseguir vencer a queda de braço que trava com o núcleo bolsonarista do PSL. A família do presidente tem predileção pelo apresentador José Luiz Datena, que precisaria se filiar a uma sigla para concorrer. Na oposição, o ex-­governador Márcio França (PSB) e o deputado Orlando Silva (PCdoB) sinalizaram que entrarão na corrida eleitoral. No PT, especula-se que o ex-­deputado Jilmar Tatto poderá formar uma chapa com a ex-prefeita Marta Suplicy como vice.

Aos 39 anos, Covas lida com sua condição de saúde de forma objetiva. Não chorou em nenhum momento depois do diagnóstico. Despachou com secretários e postou um depoimento ao lado do filho, Tomás, de 14 anos, afirmando que venceria o câncer sem deixar São Paulo. “É um caso grave, mas o Bruno irá em frente”, diz Uip. Que assim seja.

Publicado em VEJA de 6 de novembro de 2019, edição nº 2659

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