Jair Bolsonaro tem uma relação peculiar com o patrimônio público. Em mais de 30 anos de mandatos eletivos, ele sempre se gabou de nunca ter se envolvido em esquemas de corrupção, como o mensalão e o petrolão. Ao mesmo tempo, foi acusado de pagar serviços domésticos com verba do gabinete parlamentar, disse ter usado auxilio-moradia da Câmara para “comer gente” e teve seus familiares investigados em casos de rachadinha, que é a apropriação ilegal de parte dos salários dos servidores.
Nada disso, no entanto, tem a dimensão da nova suspeita sobre o capitão: ser o beneficiário de uma “organização criminosa” que surrupiou joias do acervo da Presidência República, tirou-as clandestinamente do Brasil em voos oficiais da Força Aérea Brasileira (FAB) e vendeu as peças valiosas nos Estados Unidos, revertendo os ganhos financeiros para o patrimônio pessoal do ex-presidente.
Investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o caso trincou o discurso de vestal de Bolsonaro, agravou a sua situação jurídica, silenciou seus estridentes apoiadores e ainda manchou a imagem do país com uma bandalha típica de uma república bananeira.
Pesquisa Atlas divulgada na quarta-feira, 16, mostrou que 54% dos entrevistados acham que o ex-presidente está envolvido no caso das joias, 49% consideram que ele cometeu crime e o mesmo percentual afirma que Bolsonaro não é vítima de perseguição, como ele sempre alega ao ser confrontado com uma acusação. Já uma sondagem da Quaest revelou que 66% de mais de 2000 mil entrevistados tomaram conhecimento do caso. Do total de pessoas consultadas, 41% acham que o capitão deve ser preso, ante 43% que não concordam com a iniciativa.
No debate público, Bolsonaro está emparedado. Seus apoiadores, sempre aguerridos nas redes sociais e no Congresso, reagiram com um silêncio ensurdecedor. Bolsonarista de quatro costados, o deputado Bibo Nunes (PL-RS) até tentou responder, dizendo que só acreditava na recompra do Rolex se o recibo aparecesse. Apareceu, e o silêncio continuou.
Na seara jurídica, a situação é ainda menos confortável. O ministro Alexandre de Moraes, além de autorizar ações contra pessoas da confiança do ex-presidente, determinou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de Bolsonaro e da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro. O biombo de proteção do capitão e sua imagem de homem simples e honesto, que ele tanto tenta cultivar, estão cada vez mais fragilizados.