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Entrada de Moro na disputa e crise do PSDB aceleram batalha pelo centro

No momento em que a terceira via começa a se afunilar, Lula e Bolsonaro afagam as bases radicais ao mesmo tempo que fazem gestos à centro-direita

Por Leonardo Lellis, João Pedroso de Campos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h17 - Publicado em 26 nov 2021, 06h00

Muito embora a política esteja abrigada no campo das humanidades, a miríade de presidenciáveis disposta a se enfrentar em busca da preferência de quem rejeita tanto Jair Bolsonaro quanto Luiz Inácio Lula da Silva (PT) esbarra em um problema quase das ciências exatas: há gente demais para ocupar uma faixa que hoje tem menos de um terço do eleitorado. Diante disso, o grande contingente de postulantes da terceira via — dez no total — começa a entrar em um funil para ver quem estará de fato na urna eletrônica em 2022. Nas últimas semanas, quem se mexeu mais nessa corrida foi o ex-ministro Sergio Moro (Podemos), que logo na saída como pré-candidato cravou 10,7% das intenções de voto, segundo o Paraná Pesquisas. Isso o coloca, por ora, como o principal rival de Lula e Bolsonaro, à frente do ex-governador Ciro Gomes (PDT), que está na pista há mais tempo.

SUSPENSE - Eduardo Leite e João Doria: o que era para marcar a entrada do PSDB na eleição virou motivo de constrangimento -
SUSPENSE - Eduardo Leite e João Doria: o que era para marcar a entrada do PSDB na eleição virou motivo de constrangimento – (Cristiano Mariz/Agência O Globo)

Ex-juiz da Lava-Jato, inimigo tanto do petismo quanto do bolsonarismo, Moro segue à risca o roteiro de campanha. Já anunciou o seu “posto Ipiranga” na economia, o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore. Fez um discurso no Senado defendendo o teto de gastos e a responsabilidade social e atacou a política econômica do governo que integrou até 2020. Também começou a peregrinação por aliados visitando o governador de Minas Gerais, Romeu Zema. Em meio a tudo isso, deu entrevistas, palpitou sobre temas variados e estocou rivais em eventos e redes sociais. Retirado do pódio da corrida ao Planalto, Ciro, que atacava Lula e Bolsonaro, sentiu o golpe e reposicionou sua artilharia em direção ao ex-juiz.

Enquanto a movimentação de Moro aumentava o sentido de urgência na terceira via, de onde mais se esperava é que não veio nada. O PSDB planejava dar um exemplo de democracia interna no domingo 21 com uma inédita prévia de onde emergiria o candidato de uma sigla que já teve um presidente da República (FHC). Deu tudo errado. Ao clima belicoso que já se verificava na sigla durante a disputa juntou-se o vexame de não conseguir completar a eleição interna por pane no aplicativo que registraria os votos de filiados. Enquanto muita gente do partido buscava achar uma solução para não prolongar o fiasco, tentando encerrar a votação de outra forma — o que até a quinta-feira 25 não havia ocorrido —, as caneladas entre os favoritos, os governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS), subiram de tom. Assim, não bastasse o sufoco para concluir a votação, o PSDB viu crescer a possibilidade de judicialização da disputa. “Quem for derrotado precisará aceitar o resultado, senão os problemas com o aplicativo se tornarão um problema político”, diz o cientista político Antonio Lavareda.

SOZINHA - Simone Tebet: única mulher entre os pré-candidatos, ela terá dificuldade para emplacar o seu nome no MDB -
SOZINHA - Simone Tebet: única mulher entre os pré-candidatos, ela terá dificuldade para emplacar o seu nome no MDB – (Ettore Chiereguini/AGIF/AFP)

Com Moro circulando e os tucanos digladiando-se em público, a ordem passou a ser mostrar coesão. Capitaneado pelo ex-ministro Gilberto Kassab, o PSD fez gestos claros nesse sentido em um encontro nacional para marcar os dez anos de fundação da sigla na quarta 24. No evento, em Brasília, aprovou-se uma carta de diretrizes para 2022 cujo primeiro item é o lançamento de um candidato próprio à Presidência. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), discursou como tal durante cerca de 25 minutos.

Em outras siglas, no entanto, o apetite por ter um nome à frente da chapa arrefeceu e há informações desencontradas. Segundo membros da cúpula do União Brasil, o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta desistiu da candidatura, o que ele nega. “Nossa preocupação é formar uma bancada forte nas eleições proporcionais”, diz o futuro comandante da sigla, Luciano Bivar. O MDB deve se definir em dezembro, mas a senadora Simone Tebet (MS) enfrenta resistência dos caciques, que também preferem priorizar a eleição de deputados.

DÚVIDA - Mandetta: cúpula do partido diz que o ex-ministro desistiu, mas ele nega -
DÚVIDA - Mandetta: cúpula do partido diz que o ex-ministro desistiu, mas ele nega – (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

No momento em que a terceira via começa a se afunilar, Lula e Bolsonaro navegam com os pés em duas canoas: afagam as bases radicais ao mesmo tempo que fazem alguns gestos à centro-direita. O petista acena a rivais históricos, como o ex-governador Geraldo Alckmin, de saída do PSDB. Já Bolsonaro anuncia pela segunda vez o casamento com o PL do mensaleiro Valdemar Costa Neto, iniciativa que deve consolidar a aliança com o Centrão. “A direita se fragmentou e isso impacta na fragmentação na terceira via”, avalia Paulo Ramirez, cientista político da ESPM.

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arte Pesquisa

Na disputa pelo voto, cada um dos candidatos da terceira via também pena para modular um discurso capaz de cativar o eleitorado e se diferenciar de seus adversários mais diretos. O denominador comum do grupo é a defesa da responsabilidade fiscal, o combate à corrupção e a redução da desigualdade social. “É positivo que haja um certo consenso sobre as urgências do país. A grande questão é saber o que vão propor, qual será o caminho”, aponta o cientista político José Álvaro Moisés, da USP.

O risco da divisão do bloco é que ela acabe por deixar todos pelo caminho. “O ideal seria que as elites políticas apresentassem uma única opção, ajudando o eleitor a ver qual é a alternativa clara”, entende Lara Mesquita, pesquisadora do Centro de Política e Economia do Setor Público (Cepesp/FGV). Enquanto os caciques não se entendem, pode sobrar para o eleitor fazer essa depuração. “O candidato que alcançar mais de 10 pontos porcentuais nas pesquisas pode começar a atrair o voto útil”, analisa o cientista político Carlos Pereira, da FGV. Tal definição tende a ocorrer apenas nos primeiros meses de 2022, mas há um risco de os postulantes de terceira via chegarem a esse momento embolados. Na eleição de 2018, quando a polarização entre petismo e bolsonarismo também deu o tom, havia sete candidatos de centro — juntos, conseguiram apenas 23% dos votos válidos. Não dá para dizer que a eleição de 2022 será igual, mas o passado está aí para servir de referência.

Publicado em VEJA de 1 de dezembro de 2021, edição nº 2766

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