Ex-ministro Geddel Vieira Lima é preso pela PF na Bahia
Peemedebista é investigado na Operação Cui Bono ?, que apura um esquema de corrupção na Caixa Econômica Federal
O ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), que ocupou a Secretaria de Governo do presidente Michel Temer (PMDB), foi preso pela Polícia Federal nesta segunda-feira em Salvador (BA), em ação decorrente da Operação Cui Bono?, que investiga um esquema de corrupção na Caixa Econômica Federal. Geddel foi vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa entre 2011 e 2013, período investigado pela operação. A prisão decretada pelo juiz Vallisney de Souza Oliveira, da Justiça Federal de Brasília, é preventiva, ou seja, sem prazo para terminar.
O juiz deu razão ao pedido da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, que citam as apurações contra o ex-ministro no âmbito da Caixa, reiteradas por depoimentos do empresário Joesley Batista e do operador financeiro Lúcio Bolonha Funaro, e afirmam que Geddel tenta obstruir a Justiça.
Segundo Joesley, o Grupo J&F pagou cerca de 100 milhões de reais em propina a Funaro que, por sua vez, disse ter repassado a Geddel Vieira Lima 20 milhões de reais em dinheiro vivo. Lúcio Funaro está preso há um ano em Brasília.
“Solto, Geddel Vieira poderá escamotear/esconder esse dinheiro recebido em espécie ainda não localizado, pelas suas apontadas condutas indevidas, fazendo-se necessária também aqui a prisão cautelar para que a decisão não possa ‘cair no vazio’ da ineficácia quanto à reparação de dano e devolução dos valores”, escreveu o juiz federal.
Além das provas da participação de Geddel no esquema de corrupção, Vallisney Oliveira também considerou a tentativa de obstrução de Justiça pelo ex-ministro. A defesa de Lúcio Funaro mostrou à Polícia Federal, por meio de registros de ligação, que o Geddel Vieira Lima fez doze telefonemas ao celular de Raquel Albejante Pitta, mulher de Funaro, a partir do dia 17 de maio, quando se revelou que executivos da JBS haviam fechado delação premiada e que Joesley gravara um diálogo secreto com o presidente Michel Temer. O ex-ministro é nomeado como “Carainho” nos registros das ligações.
Para o magistrado, a pressão do peemedebista sobre a família do operador financeiro é um “fato gravíssimo” e sua conduta poderia “acarretar prejuízo irreparável para as investigações em curso decorrentes da Operação Cui Bono”. “Em liberdade, Geddel, pelas atitudes que vem tomando recentemente, pode dar continuidade a tentativas de influenciar testemunhas que irão depor na fase de inquérito da Operação Cui Bono”, afirmou o juiz, que determinou a apreensão de celulares de Geddel Vieira Lima.
Depois de ser alvo da Cui Bono? e de virem à tona as delações premiadas dos executivos do Grupo J&F, Geddel, com receio de ser preso, ofereceu ao STF seus sigilos fiscal e bancário e a entrega de seu passaporte.
“Malgrado esteja absolutamente convicto de inexistir lastro probatório que sustente qualquer investigação contra si, muito menos fundamento para a decretação de medidas cautelares, apenas por excesso de zelo, coloca à disposição dessa Suprema Corte o seu passaporte, que entregará se previamente intimado para tanto”, dizia o documento apresentado pela defesa de Geddel.
Na conversa gravada entre Joesley Batista e o presidente Michel Temer, em março, no Palácio do Jaburu, o delator disse ao peemedebista que costumava tratar dos assuntos de interesse da empresa no governo por meio de Geddel Vieira Lima. Como o ex-ministro passou a ser investigado, contudo, Joesley explicou que não poderia mais procurá-lo. Foi nesse contexto que Temer indicou a ele, como homem de sua “mais estrita confiança”, o ex-assessor presidencial e ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures, flagrado um mês depois pela Polícia Federal após receber uma mala com 500.000 reais de um executivo da JBS. Rocha Loures foi preso no início de junho e deixou a cadeia no último sábado, por decisão do STF.
Operação Cui Bono?
Quando da deflagração da Operação Cui Bono? (“a quem interessa?”, em latim), o Ministério Público Federal apontou que Geddel Vieira Lima, o ex-deputado federal Eduardo Cunha e Lúcio Bolonha Funaro desviaram “de forma reiterada recursos públicos a fim de beneficiarem a si mesmos, por meio do recebimento de vantagens ilícitas, e a empresas e empresários brasileiros, por meio da liberação de créditos e/ou investimentos autorizados pela Caixa Econômica Federal em favor desses particulares”.
A Operação Cui Bono?, que cumpriu mandados de busca e apreensão na casa de Geddel em Salvador, foi deflagrada a partir da Operação Catilinárias, de dezembro de 2015, que teve Cunha como alvo principal. Entre os documentos encontrados pela PF, aos quais VEJA teve acesso à época, estavam papéis com uma relação de empresas que pleiteavam empréstimos e financiamentos na Caixa, além de informações detalhadas sobre taxas de juros, prazos das transações e os valores de cada operação.
Uma folha, destacada com o título “Pipe Line Geddel” (o equivalente a “Duto Geddel”), faz referências a companhias como Eldorado, Flora, Vigor, Bertin e J&F, todas do Grupo J&F, que fechou uma explosiva delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. Há ainda outro material, chamado de “Pendência Geddel”, que lista uma série de operações de crédito envolvendo a J&F, a Hypermarcas e a Gol.
Mensagens trocadas entre Eduardo Cunha e Geddel Vieira Lima reforçam os indícios de que os dois peemedebistas se aliaram para manipular empréstimos e investimentos liberados pela Caixa. Em 30 julho de 2012, por exemplo, Cunha e Geddel trataram da liberação de um financiamento da Marfrig. “Voto sai hj”, informa Geddel a Cunha. Um mês depois, a Marfrig, quando estava com a corda no pescoço e prestes a se desfazer de alguns negócios para quitar a sua dívida, fechou um empréstimo de 350 milhões de reais com a Caixa. Em outro caso, envolvendo a empresa de eletrônicos Digibras, o ex-ministro escreve para o ex-presidente da Câmara: “Já estou entrando no circuito”.
Derrubado por colega
Um dos homens fortes do presidente Michel Temer, Geddel Vieira Lima deixou a Secretaria de Governo, responsável pela articulação política do Planalto, em novembro de 2016. Ele não resistiu à crise provocada pelas revelações do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, que revelou ter sido pressionado por Geddel e por Temer, além do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, a liberar a construção de um edifício residencial em uma área tombada pelo patrimônio histórico em Salvador. O peemedebista é dono de um apartamento no empreendimento e seria prejudicado pelo embargo da obra. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que proibiu a obra, estava subordinado a Calero.
Depois de acusar a cúpula do governo de tentar pressioná-lo a liberar uma obra de interesse pessoal de Geddel Vieira Lima, Marcelo Calero entregou à Polícia Federal gravações das conversas que teve com Temer, Geddel e Padilha, além de dois auxiliares próximos do presidente.
Na carta de demissão entregue ao presidente, o ex-ministro afirmou que o sofrimento de seus familiares foi determinante para a decisão. “Avolumaram-se as críticas sobre mim. Em Salvador, vejo o sofrimento de meus familiares. Quem me conhece sabe ser esse o limite da dor que suporto. É hora de sair”, escreveu.