Depois das declarações do ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, de que facilitará a liberação de recursos da Caixa a estados cujos governadores pressionarem deputados federais a apoiarem a reforma da Previdência, o governador de Rondônia, Confúcio Moura (PMDB), afirmou que “não há como passar a faca no pescoço” dos mandatários estaduais para que tentem influenciar os votos dos parlamentares.
Governador desde 2011, o peemedebista atribui as declarações do recém-nomeado Marun ao “entusiasmo de início de cargo” e afirma que apenas alguns poucos deputados estão indecisos sobre como votarão nas mudanças nas aposentadorias. Ele calcula que em Rondônia, onde sete parlamentares são de partidos da base aliada e um é do PSDB, apenas quatro devem apoiar a reforma.
Nesta entrevista a VEJA, Confúcio Moura fala também sobre as suas pretensões eleitorais em 2018 e a disputa presidencial, avalia as mudanças no PMDB, que acaba de ser rebatizado como MDB, e elogia o legado dos governos petistas a seu estado.
Governadores ficaram incomodados com a declaração do ministro Carlos Marun de que o governo troca a liberação de recursos da Caixa aos estados por apoio à reforma da Previdência. Isso é chantagem ou “ação de governo”, como disse Marun? O ministro Marun tem um estilo muito espontâneo, mas tenho certeza que não é a opinião do presidente, que há pouco tempo convocou todos os governadores para falar de reforma da Previdência em um almoço. Ele foi extremamente cortês, não usou essas expressões. Pediu empenho dos governadores, falou da importância da reforma para os estados. Creio que Marun está movido por um entusiasmo de início de cargo, quer mostrar serviço, quer abafar, fazer estilo de truculência. Não há como passar a faca no pescoço de governador para mudar a opinião de deputados.
Três dos oito deputados federais de Rondônia, mesmo sendo de partidos da base aliada, votaram contra Temer nas denúncias da Procuradoria-Geral da República. O senhor tem procurado deputados para falar de reforma da Previdência? Os deputados federais dos estados já estão decididos se vão votar a favor da reforma ou não. Um ou outro ainda está indeciso. Lá em Rondônia, já sei quem são os que votam a favor e os que votam contra. A gente, com muito trabalho, pode segurar quatro dos oito votos.
Então diminuiu o apoio a Temer na bancada? Diminuiu. Na reforma da Previdência, à medida em que aproximam as eleições, há a impressão de que vai perder voto. Acho que ganha votos. Fui o deputado mais votado do estado depois de apoiar as reformas estruturais do Fernando Henrique. Mas há um pensamento de alguns parlamentares de que o voto na reforma vai contra o povo, principalmente os trabalhadores rurais, que são muito numerosos no Norte e no Nordeste.
“Não há como passar a faca no pescoço de governador para mudar a opinião de deputados”
Em seu blog, além de poesias, broncas em secretários e até críticas a seu próprio governo, o senhor escreveu que “governo tem hora que é uma desgraça” porque “aliena o homem”. Temer se alienou em relação à gravidade das gravações da JBS? Tenho certeza de que o presidente se arrependeu muito daquilo. Todo mundo olha pra trás e vê erros, ele não cometeria aquilo de novo, de receber aquele empresário tão influente no governo horas mortas da noite. Foi uma infelicidade muito grande. Eu falo da alienação do governo no sentido de que o governante não faz tudo o que quer, é natural.
O senhor vai disputar as eleições em 2018? Se eu tiver que disputar, disputarei o Senado. Vou decidir em fevereiro. Estou analisando dados, primeiro temos que pesquisar se o nome é viável. Ninguém é candidato por ser candidato, não sabemos como será a reação da população na eleição.
Caso dispute uma das duas vagas ao Senado, o senhor concorreria com Valdir Raupp, que buscará a reeleição também pelo PMDB. Primeiro temos que fazer uma análise em pesquisas, ver se um não engole o outro, uma autofagia interna. Ou se um equilibra o outro, se soma. A aceitação do PMDB em Rondônia ainda é boa porque a maioria dos governadores foi do PMDB, o partido ainda tem um nome consagrado.
Mas Raupp foi desgastado pela Lava Jato, é réu no STF por corrupção. Mesmo assim, o senhor cogitaria sair do PMDB para ele ser o candidato do partido? Como ele é senador, tem a preferência, é o candidato do PMDB. Eu é que tenho que analisar a conveniência de ficar no PMDB ou de sair a outro partido que me permita, se eleito, uma margem para meu pensamento de reformas, liberal, de ajuste da economia, ajuste fiscal.
Recebeu convites de outros partidos? Sim. O PTB me convidou, Solidariedade, PDT e PSB também, e alguns partidos ligados a igrejas evangélicas.
A mudança de nome do PMDB para MDB diminuirá mesmo o desgaste da legenda? O partido teve seu momento histórico importantíssimo como MDB, saudoso, querido, de um grande trabalho em busca da redemocratização do país. E teve o partido que veio se descarrilando ao longo do tempo. Esse retorno ao passado deve ser um trabalho de reencontro consigo mesmo, de reescrita da própria história, de correção de rumos.
Falta ao PMDB, mais do que mudar de nome, firmeza em casos de peemedebistas envolvidos em corrupção e até mesmo presos, como o ex-ministro Geddel Vieira Lima? Não estou saindo em defesa de Geddel, nem de ninguém, mas os casos têm que ser julgados minimamente, depois de aceitas as denúncias. Se condenado, ele automaticamente está afastado, fica inelegível, está fora da política. A maior punição é a exclusão pelo Judiciário.
Peemedebistas vinham dizendo que o partido deveria ter candidato a presidente em 2018, mas até agora não apareceu nenhum nome. O PMDB não tem hoje nomes competitivos à disputa da Presidência? Não tem. O partido sempre se confortou e ficou conformado com a força do interior, dos estados, dos municípios, ter mais vereadores, mais deputados estaduais, mais deputados federais e mais senadores. Sempre confortou o PMDB, ao longo desses últimos 30 anos, fazer maioria no Congresso, articular posições no governo, ocupar cargos de vice, ministérios. Mas não preparou o grande líder brasileiro, não temos esse nome.
O senhor vê chances de algum “outsider” ser eleito presidente do Brasil? Os países da região têm provado o contrário. A eleição de Macri [presidente da Argentina] era previsível, no Chile era previsível, na Colômbia e no Paraguai também. Não tem havido grandes mudanças, embora o mundo esteja insatisfeito com a política. O que a população brasileira quer? Qual é o perfil? O futuro presidente tem que ser de carne e osso, com erros e falhas, mas que trabalha duro. Não tem segredo, não tem milagre. É dureza, austeridade e planejamento para além de 4 anos, para, no mínimo, 10 anos.
“Sempre confortou o PMDB, ao longo desses últimos 30 anos, fazer maioria no Congresso, articular posições no governo, ocupar cargos de vice, ministérios. Mas não preparou o grande líder brasileiro, não temos esse nome”
Essa oportunidade de planejar o longo prazo foi perdida pelos governos do PT? O PT fez o que pôde fazer, dentro da linha do seu pensamento. Lula realizou seu discurso, de um governo social, de distribuição de renda, mesmo que isso tenha causado embaraços para a economia no médio prazo, deixado o Brasil como ficou. Ele levou o salário mínimo a quase 300 dólares, um salto altíssimo em relação ao governo Fernando Henrique. Com Dilma houve um descarrilamento por abusos, toda essa permissividade do BNDES, Petrobras, foi ali a eclosão do furacão. Apoiei Fernando Henrique de ponta a ponta e o Michel é do meu partido, mas, para o meu estado, o PT foi melhor. Mas não quero que ele volte [risos].
Lula conseguirá disputar a eleição? Acho que Lula vai conseguir concorrer sub judice. Se a Justiça for barrá-lo, tem que ser antes do registro da candidatura. Se chegar agosto sem uma posição, ele consegue se registrar, pode ganhar a eleição e como fica depois? O Supremo vai cassar quem foi eleito pelo povo? Tenho muito medo de governos raivosos, Lula não viria com o mesmo tempero e humildade do primeiro mandato, mas muito magoado e querendo dar o troco. Temo muito por isso, o encaminhamento do Brasil para um socialismo desvairado.
Jair Bolsonaro tem chances de vitória? Bolsonaro não tem um discurso profundo, mas a voz dele de que vai combater o crime, matar bandido, coincide com o desespero das ruas, da violência crescente na cidade. Ele pode usar esse discurso para ganhar a eleição, mas, se sentar na cadeira de presidente, vai ter que se redefinir. Quando vir a dureza do Judiciário, a influência que tem um ministro do Supremo Tribunal Federal, que monocraticamente barra um presidente, cassa medidas provisórias, desfaz uma votação do Congresso… Não é fácil.
“Se a Justiça for barrar Lula, tem que ser antes do registro da candidatura. Se chegar agosto sem uma posição, ele consegue se registrar, pode ganhar a eleição e como fica depois? O Supremo vai cassar quem foi eleito pelo povo?”
Qual sistema de votação é o ideal, na sua opinião? O modelo alemão, distrital misto. É preciso que se defina o modelo com brilhantes parlamentares eleitos pelo voto de lista, que são os melhores, e os votos distritais, dos deputados que vêm representando seus distritos, motivos e necessidades. O que fica hoje no Brasil é um parlamentarismo às avessas.
O fundo público para financiamento de campanhas é a melhor alternativa à proibição das doações de empresas? Não é a primeira vez que o financiamento empresarial foi proibido, e a proibição não deu certo no passado. O modelo de financiamento público tem que ser experimentado, mas não vai ser fácil. A divisão do bolo de recursos será feita pelos partidos, então, logicamente, não haverá um critério transparente e igualitário de distribuição, uns vão receber mais que os outros. Vai causar muita encrenca, dificuldades, denúncias.
Como governador de um estado fronteiriço, o senhor vê as fronteiras brasileiras desprotegidas? Absolutamente. Tem pontos distantes do Exército, aqui e acolá. Não há nenhum programa ostensivo de proteção de fronteiras. A grande extensão da fronteira é a rota para contrabando de armas e drogas, que gera toda a insegurança em São Paulo, Minas, Rio de Janeiro, todos os estados. Sem uma política definida de fronteira, é enxugar gelo. O crime organizado nos presídios já desenhou tudo isso, tem consciência e controla esse mercado.
Qual é o principal problema da administração penitenciária nos estados? O grande problema não é a construção de presídio, mas a gestão, o custo do sistema é muito elevado. O governo [federal] manda 40 milhões ou 30 milhões para construir um presídio. O mesmo valor é gasto em um ano em custeio. Os estados cumprem a parte mais cara, embora a maioria dos presos, por serem envolvidos com tráfico drogas, seja de competência federal. O fundo penitenciário [Nacional] tem muito dinheiro, mas que está todo contingenciado.
“A grande extensão da fronteira é a rota para contrabando de armas e drogas, que gera toda a insegurança em São Paulo, Minas, Rio de Janeiro, todos os estados. Sem uma política definida de fronteira, é enxugar gelo”
O senhor foi denunciado pela PGR em junho por um suposto caso de sonegação fiscal na gestão quando era prefeito. Como viu a decisão do STF de tirar das Assembleias Legislativas a prerrogativa de autorizar a abertura de processo contra governadores? Achei muito avançado, terminava de os governadores nunca serem processados. É muito óbvio isso, antes os governadores tinham maioria na Assembleia, e a Assembleia não autorizava. Agora não, se tem algum delito do governador, o próprio STJ vai lá e abre o processo. Sobre a denúncia, nunca fui sequer ouvido no decorrer do processo, só soube quando fui notificado.