A Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) realizam operação nesta terça-feira para investigar um esquema de compra de votos para a escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Batizada de “Unfair Play“, a operação visa um esquema de pagamento de propina em troca da contratação de empresas terceirizadas pelo governo do Rio de Janeiro.
Estão sendo cumpridos dois mandados de prisão preventiva e onze de busca e apreensão, nas cidades do Rio de Janeiro, Nova Iguaçu (RJ) e em Paris, na França. A operação envolve uma cooperação internacional com a França e com os Estados Unidos. Um dos alvos de busca e apreensão é o presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Carlos Arthur Nuzman, investigado por suposto pagamento de propina de 1,5 milhão de dólares.
Segundo nota divulgada pela PF, as investigações começaram há nove meses e o pagamento das propinas era feito por meio de entrega de dinheiro em espécie, celebração de contratos fictícios, pagamento de despesas pessoais e transferências de contas de doleiros. Os presos serão investigados por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa.
Entenda o caso
A operação “Unfair Play” é resultado de investigações do Ministério Público Financeiro de Paris, na França, e do Ministério Público Federal (MPF), do Brasil, que encontraram vínculos entre contratos firmados pelo governo do Rio com uma empresa terceirizada e o pagamento de 2 milhões de dólares (6,2 milhões de reais) em propina a membros do Comitê Olímpico Internacional (COI).
A investigação teve início em Paris sobre suspeitas de corrupção no processo de seleção das sede dos Jogos Olímpicos de 2016 e de 2020 – as cidades escolhidas foram o Rio de Janeiro e Tóquio, a partir de processos de votação realizados por dirigentes esportivos de todo o mundo.
A apuração realizada pelo MP francês encontrou no final do ano passado traços da movimentação financeira em favor de dois nomes: Lamine Diack, então presidente da Associação Internacional das Federações de Atletismo (IAAF, na sigla em inglês) e membro do COI, e seu filho, Papa Massata Diack.
Pelas investigações, que também contaram com a ajuda da Justiça nos Estados Unidos, foram localizados traços de pelo menos duas transferências realizadas em favor de Papa Diack, no valor de 1,5 milhão de dólares (4,7 milhões de reais) e 500.000 dólares (1,5 milhão de reais), às vésperas da definição da sede dos Jogos de 2016.
A principal dessas transações foi feita em 29 de setembro de 2009 entre a Matlock Capital Group, empresa com sede em Miami, nos Estados Unidos, e a Pamodzi Consulting, empresa de Papa Massata Diack. Três dias depois, o Rio foi escolhido como sede dos Jogos de 2016.
As investigações apontaram que a Matlock Capital Group pertencia na realidade ao empresário brasileiro Arthur Soares, conhecido como “Rei Arthur”. Ele era um dos pivôs da apuração, porque sua principal empresa no Brasil, o Grupo Facility, chegou a ser a maior prestadora de serviços privados do Estado do Rio, com contratos de até 3 bilhões de reais.
À época o governador do Rio era Sergio Cabral, preso pela Polícia Federal, em meio à Operação Lava Jato, em 17 de novembro e réu por corrupção, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro e pelo desvio de 224 milhões de reais em recursos públicos.
A suspeita dos procuradores franceses era de que Arthur Soares havia realizado o pagamento de propina aos dirigentes do COI em favor do voto pela candidatura do Rio como sede dos Jogos de 2016. Em troca, o empresário seria privilegiado por contratos firmado com o governo do Estado na gestão de Cabral.
Essa suspeita foi levada de Paris a Brasília, quando um grupo de procuradores do MPF brasileiro e do MP Financeiro da França passaram a trabalhar juntos para encontrar os vínculos entre os pagamentos realizados por Arthur Soares e o recebimento de vantagens do governo do Estado.
Envolvimento de Nuzman
Por isso, a Operação Unfair Play atinge em cheio Carlos Arthur Nuzman, o todo-poderoso presidente do COB, que esteve na linha de frente do candidatura do país para sediar a Olimpíada. Ao longo da campanha, o dirigente encontrava-se com membros do COI, em especial de comitês africanos (que votam em bloco), para tentar convencê-los a votar no Rio.
O que os procuradores franceses e brasileiros pretendem agora, ao realizar buscas na casa de Nuzman e de outros suspeitos, é encontrar as provas definitivas do vínculo entre o lobby brasileiro por votos em favor do Rio, os pagamentos feitos por Arthur Soares aos dirigentes do COI e os contratos obtidos a seguir pelo empresário.
Mas há outras suspeitas que vão além das operações realizadas nesta terça-feira: o eventual papel de empreiteiras como Odebrecht, beneficiadas pelas obras da Cidade Olímpica e da infraestrutura da cidade para os Jogos, e de líderes políticos, como o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na articulação do esquema de propina ao COI em favor do Rio-2016.
(com Estadão Conteúdo)