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Lula e o silêncio

Advogados do petista prometeram à Polícia Federal que agremiações e simpatizantes se manteriam longe do velório e sem manifestações

Por Ana Weiss, de São Bernardo do Campo
Atualizado em 2 mar 2019, 23h00 - Publicado em 2 mar 2019, 21h27

Às oito horas deste sábado, 2, a movimentação em frente do Cemitério e Crematório Jardim da Colina era de um sábado qualquer. A pequena aglomeração dividida em subgrupos anônimos de professores de escolas públicas, sindicalistas, jornalistas e moradores do chamado ABC paulista que perderam crianças para doenças fulminantes se reuniam ali, com motivações diferentes, mas pela mesma despedida: a de Luiz Inácio Lula da Silva do neto que levava o seu nome, Arthur Lula da Silva, de 7 anos.

A presença minguada era resultado de um alinhamento do PT e de apoiadores há muito tempo não vista no país. A licença constitucional para deixar a cadeia para enterrar (nessa caso, cremar) um descendente teve uma máxima extra a ser honrada pelo presidiário Luiz Inácio Da Silva: o silêncio das massas.

Foi a cartada final dos advogados do petista para a Polícia Federal, responsável pela prisão de Lula: o compromisso nacional do partido, agremiações e simpatizantes de se manterem longe, e, em silêncio.

Até uma hora antes do início da cerimônia de cremação, excluindo algumas manifestações pontuais, o pacto foi mantido. A cancela do cemitério foi sendo liberada por comissões improvisadas com anuência dos funcionários da empresa funerária. “Você quer entrar por quê? Conhece quem? Não está com equipamento de gravação, né?”, perguntava um porteiro, até a intervenção de uma professora da região: “pode deixar, é pessoa simples, eleitor da vizinhança, vai respeitar o luto sem manifestação nenhuma.”

Fernando Haddad, o quase herdeiro político de Lula, foi o primeiro a chegar, perto das oito da manhã. Discretamente, em carros com janelas escuras, vieram José Genoino, Arlindo Chinaglia e a ex-presidente Dilma Roussef.

Só às 11h, quando os helicópteros da Globo e da Polícia Federal anunciaram a chegada do ex-presidente, a reunião difusa de pessoas tomou forma de multidão. Os gritos de “Lula livre” e “Moro, a sua vez vai chegar”, apertaram, o número de pessoas impedindo a passagem de carros triplicou e reforços policiais começaram a entrar marchando pela porta do Jardim da Colina e os civis não puderam entrar mais. Lula estava em terra.

O ex-líder sindicalista de São Bernardo entrou pela porta dos fundos do crematório, o mesmo onde se despediu de sua mulher, a ex-primeira dama, Marisa Letícia da Silva, quase um ano antes de ser preso em Curitiba. À sua espera, ao menos dez camburões da PF e uma barreira policial que não permitia ninguém usar o acesso alternativo. Até a noite anterior, assessores do Instituto Lula, do PT nacional e funcionários do cemitério respondiam com as mesmas palavras ao pedido de confirmação: não há informação nem da vinda de Lula, nem que seu neto seja velado e cremado no local.

A floricultura que atende o cemitério são-bernardense recebeu um número imenso de encomendas desde a tarde do dia anterior. Segundo a proprietária, que vende coroas e placas para figuras do reduto petista há trinta anos – e pediu sigilo do nome para não atrapalhar os negócios -, assim que a morte de Arthur foi anunciada, perto do meio dia de sexta-feira, 2, ela começou a receber as encomendas para a cerimônia de cremação no Jardim Colina. Muitas caprichadas, como é costume de quem não vai aparecer para a circunstância. Não se tratavam, nesse caso, de agendas ocupadas. Era parte do cumprimento da promissória dada aos advogados que conseguiram a única saída de Lula desde a sua prisão em 2018: quanto menos, melhor.

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O ex-senador Eduardo Suplicy, hoje vereador paulistano, foi o único petista histórico a deixar o cemitério a pé. Emocionado falou a VEJA do choro de Lula ao encontrar a família e, não menos emocionado, ao agradecer a presença dos desconhecidos no reduto de cremação – até a sala ritualística ficar relativamente cheia, se permitiu a entrada de apoiadores sem relação com a família Lula da Silva.

O ex-presidente cumpriu o rito de despedida do neto e deixou a cerimônia em silêncio. Visivelmente abatido e muito envelhecido desde a sua última aparição, em junho do ano passado, Lula saiu do ritual de cremação tão cercado que era difícil de enxergar sua cabeça quase branca entre os uniformes militares. Mas ergueu os olhos e ergueu a mão. A militância veio abaixo.

O ex-presidente já havia deixado São Bernardo há mais de uma hora e sua plateia, liberada do tratado de seus advogados, berrava “Olê, olê, olê, olé. Lula, Lula”, pelas praças do cemitério e Crematório Jardim da Colina.

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